06/06/2012

Embargo

Livre acesso ameaça periódicos de Humanidades, diz relatório

Pesquisa diz que mais de 60% das bibliotecas cancelariam assinaturas de revistas da área

Thomas Guignard (cc 2.0 by-nc-sa)
Biblioteca do Trinity College

A abertura grátis do conteúdo de periódicos acadêmicos, seis meses após a publicação em papel ou num website de acesso pago, é uma das hipóteses levantadas na chamada "via verde" de livre acesso à informação científica Pesquisa realizada por uma associação internacional de editores de periódicos profissionais e acadêmicos determinou que, de mais de duzentas bibliotecas consultadas em todo o mundo, 65% cancelariam suas assinaturas de periódicos das áreas de Artes e Humanidades se o conteúdo dessas publicações vier a ser disponibilizado gratuitamente seis meses após a data da publicação. No caso de periódicos de ciências exatas e engenharia, a taxa de prováveis cancelamentos é de 44%.

O trabalho de pesquisa, realizado pelo grupo internacional Association of Learned, Professional and Society Publishers (Associação de Editoras Acadêmicas, Profissionais e de Sociedades), e pela Associação de Editoras do Reino Unido, é descrito no relatório The potential effect of making journals free after a six month embargo (“Os efeitos potenciais de tornar os periódicos gratuitos após um embargo de seis meses”), divulgado no fim de maio.

A "via ouro" preconiza a liberação imediata do conteúdo, mas os autores dos estudos devem arcar com os custos de publicação A proposta de abertura grátis do conteúdo de periódicos acadêmicos, seis meses após a publicação em papel ou num website de acesso pago, é uma das hipóteses levantadas na chamada “via verde” de livre acesso à informação científica. A rota alternativa, chamada de “via ouro”, preconiza a liberação imediata do conteúdo, mas determina que os autores dos estudos arquem com os custos de publicação.

O relatório da pesquisa junto às bibliotecas reconhece que “alguns entrevistados ligara claramente sua situação fiscal apertada aos preços das editoras”, e que “viram como injustificadas as elevações anuais de preços”. Alguns cancelamentos de assinaturas ocorreram não por questões financeiras, mas “por princípio”.

Recentemente, a biblioteca da Universidade Harvard, nos EUA, fez um apelo para que os acadêmicos da instituição optem por publicar seus trabalhos em bases de livre acesso, num protesto contra os preços praticados pelas editoras.

Entre suas conclusões, o trabalho diz que a imposição da “via verde” de livre acesso, com embargo de seis meses, causaria “impacto considerável na receita das editoras”, e portanto recomenda “fortemente” que nenhuma medida do tipo venha a ser adotada antes que editoras e bibliotecas explorem alternativas para a política de livre acesso.

Se a “via verde” de seis meses for adotada, "a maioria das editoras terá de rever seus portfólios, e um corpo substancial de periódicos, principalmente em Artes, Humanidades e Ciências Sociais, estará em perigo".

Estudo descobriu que os cientistas se mostram pouco dispostos a enviar seus trabalhos para bases de acesso gratuito, e que a maioria tem uma atitude conservadora em relação à publicação acadêmica, encarando os meios de livre acesso como complementares aos tradicionais Projeto PEER
Outro relatório divulgado no fim de maio, no entanto, sugere que a oferta de artigos científicos gratuitamente, online, não ameaça outra fonte de receita das editoras – o acesso às versões, muitas vezes pagas, disponíveis em seus websites oficiais. Este trabalho foi realizado pelo Projeto PEER (sigla de “Publishing and the Ecology of European Research”, ou “Publicação e a Ecologia da Pesquisa Europeia”).

Realizada ao longo de quatro anos – de 2008 a 2012 – a pesquisa envolveu uma colaboração entre cientistas, editoras e os responsáveis pelos repositórios onde os artigos científicos são ofertados gratuitamente.

O projeto envolveu uma comparação entre o acesso gratuito aos artigos no chamado “estágio II” – quando as modificações sugeridas pela revisão pelos pares já foram implementadas – e o acesso aos artigos na forma publicada final. Ele também conteve um estudo sobre o comportamento e a atitude dos cientistas em relação às políticas de livre acesso.

O PEER descobriu que o aumento no acesso às versões de “estágio II” refletiu-se num acréscimo, também, no acesso à versão final da editora. “No período medido, de março de 2010 a fevereiro de 2012, os downloads nas editoras cresceram mais rapidamente que os downloads nos repositórios PEER”, diz o relatório.

“Um teste randomizado controlado indica que disponibilizar uma versão prévia em repositórios PEER associa-se a mais tráfego nos sites das editoras (...) No geral, o PEER está associado, de forma modesta, mas significativa, a um aumento nos downloads nas editoras”.

Na parte sobre pesquisa comportamental, o estudo descobriu que os cientistas se mostram pouco dispostos a enviar seus trabalhos para as bases de acesso gratuito, e que a maioria tem uma atitude conservadora em relação à publicação acadêmica, encarando os meios de livre acesso como complementares aos tradicionais, e não como substitutos.

O PEER também avaliou os custos da publicação acadêmica, concluindo que a publicação de um só artigo científico sob revisão pelos pares pode custar de US$ 420 a US$ 650 (R$ 840 a R$ 1.300).

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