03/05/2012

Acesso livre

Reino Unido pretende oferecer acesso gratuito a toda pesquisa feita com verba pública

Anúncio da iniciativa foi feito pelo ministro de Universidades e Ciência, David Willetts

O ministro de Universidades e Ciência do Reino Unido, David Willetts, anunciou, durante uma reunião da Associação de Editores do país, que pretende tornar gratuito o acesso aos resultados de todas as pesquisas realizadas com dinheiro público. O plano foi apresentado em discurso feito por Willetts durante o evento com os editores, e em artigo assinado pelo ministro, que é do Partido Conservador, publicado no jornal The Guardian.

O ministro diz reconhecer 'o valor que os editores agregam', selecionando conteúdo e viabilizando a revisão pelos pares “Meu departamento gasta cerca de 5 bilhões de libras [R$ 15,3 bilhões] ao ano no financiamento de pesquisa acadêmica”, escreveu o ministro para o diário britânico. “Dar às pessoas o direito de passear livremente pela pesquisa financiada publicamente trará uma nova era de descobertas e colaborações acadêmicas, e colocará o Reino Unido na linha de frente da pesquisa aberta.”

No discurso apresentado aos editores, o ministro chamou atenção para a produtividade da ciência britânica: com 1% da população mundial e 4% dos pesquisadores do planeta, o Reino Unido produz 6% dos artigos acadêmicos publicados no mundo, sendo 14% dos mais citados, e 30% da produção acadêmica mundial é publicada em periódicos britânicos.

“Se o restante da Grã-Bretanha tivesse um desempenho comparável ao de nossas comunidades de pesquisa e publicação, teríamos muito menos problemas econômicos a enfrentar”, disse.

O ministro afirmou, em seu discurso, reconhecer “o valor que os editores agregam”, por conta da tarefa de selecionar conteúdo e viabilizar a revisão pelos pares. “O processo de avaliar os dados e a pesquisa e então ranqueá-los é de grande valor. É preciso pagar por ele. Mas o modo pelo qual pagamos está mudando.”

Willetts pondera que é preciso pagar pelo processo de edição, 'mas o modo pelo qual pagamos está mudando' No artigo para o Guardian, Willetts citou dois modelos de financiamento para permitir o livre acesso à pesquisa submetida a revisão pelos pares: o “ouro”, no qual o mesmo agente financiador responsável pelo estudo também cobre os custos do processo editorial e de revisão; e o “verde”, que prevê um período de acesso restrito, durante o qual os editores poderiam cobrar pelo conteúdo.

Willetts declarou que o governo “está comprometido com o princípio de acesso público aos resultados de pesquisas financiadas pelo público”. “Os contribuintes que põem dinheiro na busca intelectual não podem ser impedidos de acessá-la”. Para ele, a iniciativa enfrenta dois desafios: encontrar o modelo ideal de acesso público e garantir que os dados, uma vez divulgados, sejam fáceis de encontrar.

“Passar de uma era em que artigos acadêmicos de financiamento público estão presos atrás de paywalls por boa parte de suas vidas, para um onde eles estão disponíveis gratuitamente, não será fácil”, reconheceu ele, no artigo para o jornal.

Eric Merkel-Sabotta, presidente da Associação de Editores Científicos, Técnicos e Médicos, do grupo editorial Springer, disse que não ficou claro qual modelo de negócio está sendo proposto pelo ministro: 'Estão soltando um monte de fogos, mas ninguém sabe qual é a festa' A partir do ano que vem, o governo britânico pretende ter no ar um Portal de Pesquisas (“Gateway to Research”), que permitirá aos usuários descobrir quem recebeu verbas públicas para qual pesquisa, além de links diretos para artigos e bases de dados. Jimmy Wales, fundador da Wikipedia, está trabalhando no projeto para, segundo Willetts, garantir que o portal use padrões abertos e apresente os dados de modo fácil de usar.

O anúncio do ministro britânico ocorre poucos dias depois de a Universidade Harvard, nos EUA, fazer um apelo para que seus alunos e professores optem por publicações de livre acesso para divulgar seus trabalhos, dados os preços “insustentáveis” cobrados pelas grandes editoras de periódicos científicos: segundo a nota emitida pela universidade, a assinatura anual de um único periódico pode custar dezenas de milhares de dólares. E em editorial de sua edição de 14 de abril, a revista britânica The Economist ironiza os preços praticados pelos editores de publicações científicas, dizendo que “publicar periódicos acadêmicos obscuros é (...) uma licença para imprimir dinheiro”.

Ouvido pelo Chronicle of Higher Education, o presidente da Associação de Editores Científicos, Técnicos e Médicos, Eric Merkel-Sabotta – do grupo editorial Springer – disse que não ficou claro qual modelo de negócio está sendo proposto pelo ministro. “Parece que estão soltando um monte de fogos, mas ninguém sabe qual é a festa.”

Leia também: Anarquia, mercantilismo e a síndrome do publique ou pereça
Por Philip G. Altbach e Brendan Rapple

capa da edição impressa nº 5 | abril de 2012