06/11/2012

International Higher Education

Cinco verdades a respeito da internacionalização

Jane Knight
Knight é professora adjunta do Ontario Institute for Studies in Education, Universidade de Toronto, Canadá. E-mail: jane.knight@utoronto.ca
Após décadas de intenso desenvolvimento, a internacionalização aumentou na sua abrangência, escala e valor. Planos estratégicos das universidades, declarações da política nacional para o ensino, declarações internacionais e artigos acadêmicos indicam o papel central desempenhado pela internacionalização no mundo atual do ensino superior.
 
O artigo de minha autoria publicado recentemente a respeito dos "Cinco Mitos da Internacionalização" (IHE 62, 2011) trouxe à luz alguns conceitos equivocados envolvendo a internacionalização. Os mitos questionaram a ideia da internacionalização como substituta da qualidade, o papel desempenhado pelos estudantes estrangeiros enquanto agentes da internacionalização, os acordos institucionais e a certificação internacional como indicadores do nível de internacionalização e a internacionalização enquanto estratégia para atingir posições elevadas nos rankings.
 
Aprimorando e respeitando o contexto local
A internacionalização reconhece e se vale das prioridades, políticas e práticas nacionais e regionais. A atenção dedicada agora à dimensão internacional do ensino superior não deveria se sobrepor à importância do contexto local nem erodi-la. Assim, a internacionalização tem como objetivo complementar, harmonizar e estender a dimensão local – e não dominá-la. Se essa verdade fundamental não for respeitada, existe a forte possibilidade de uma reação negativa, levando a internacionalização a ser vista como agente homogeneizante ou hegemônico. Se ignorar o contexto local, a internacionalização vai perder seu verdadeiro norte, bem como seu valor.
 
Um processo adaptável
A internacionalização é um processo que leva à integração da dimensão internacional, intercultural e global às metas, funções e implementação do ensino superior. Assim sendo, trata-se de um processo de mudança – adaptado para atender necessidades e interesses individuais de cada instituição. Consequentemente, não existe um modelo "genérico" para a internacionalização. A adoção de um conjunto de objetivos e estratégias que estejam "na moda" ou que tragam uma "marca conhecida" nega o princípio segundo o qual cada programa, instituição ou país precisa determinar sua abordagem individual para a internacionalização – com base na articulação coerente de seus próprios objetivos e dos resultados esperados.
 
Benefícios, riscos e consequências não intencionais
Embora haja múltiplos e variados benefícios na internacionalização, manter o foco somente nos benefícios significa ignorar os riscos e as consequências negativas não intencionais envolvidas. A fuga de cérebros decorrente da mobilidade acadêmica internacional é um exemplo de efeito adverso. O atual conceito de circulação de cérebros não reconhece a ameaça da mobilidade acadêmica nem a grande disputa por cérebros provenientes dos países situados no extremo inferior da cadeia intelectual. Além disso, a busca pela qualificação internacional está levando à recorrente emissão de títulos fraudulentos oferecidos por fábricas de diplomas, à multiplicidade de credenciais associadas a programas de dupla titulação e à ascensão de indústrias de certificação que aprovam operações questionáveis. Em alguns países, tem-se também uma excessiva dependência em relação à renda proveniente das taxas pagas por estudantes internacionais, algo que leva à precarização dos critérios acadêmicos e à ascensão dos "programas de ensino das fábricas de vistos".
 
A crescente comercialização dos programas de certificação e diplomação dupla entre diferentes países e seu tratamento como commodity estão ameaçando a qualidade e a relevância do ensino superior em determinadas regiões do mundo. Estudos recentes mostram que os líderes de ensino superior ainda acreditam que os benefícios da internacionalização superam os riscos. Entretanto, é imperativo manter a atenção concentrada nos diferentes impactos da internacionalização, tanto positivos quanto negativos.
 
Não se trata de uma finalidade em si
A internacionalização é um meio para se atingir um objetivo, e não uma finalidade em si mesma. Trata-se de um truísmo frequentemente mal interpretado que pode levar a um entendimento enviesado daquilo que a internacionalização pode ou não pode fazer. O sufixo "-ização" significa que a internacionalização é um processo ou um meio de aprimorar ou atingir metas. A internacionalização pode, por exemplo, ajudar no desenvolvimento do conhecimento, das habilidades e dos valores internacionais e interculturais entre os estudantes – por meio das melhorias no ensino e no aprendizado, da mobilidade internacional e de um currículo que inclua elementos comparativos, internacionais e interculturais.
 
O objetivo não é um currículo mais internacionalizado nem um aumento na mobilidade acadêmica por si mesma. Em vez disso, o objetivo é garantir que os estudantes estejam mais preparados para viver e trabalhar num mundo mais interconectado. A compreensão da internacionalização como um meio para se atingir um fim e não como um fim em si garante que a dimensão internacional seja integrada de maneira sustentável às principais funções do ensino e do aprendizado no ensino superior, da pesquisa e da produção do conhecimento, melhor servindo à comunidade e à sociedade.
 
Globalização e internacionalização são diferentes, mas estão associadas
A globalização tem seu foco no fluxo mundial de ideias, recursos, pessoas, economias, valores, culturas, conhecimento, bens, serviços e tecnologias. A internacionalização enfatiza o relacionamento entre as nações, povos, culturas, instituições e sistemas. A diferença entre o conceito de fluxo mundial e a noção dos relacionamentos entre as nações é ao mesmo tempo notável e profunda. A internacionalização do ensino superior recebeu da globalização influências positivas e negativas, e embora os dois processos sejam fundamentalmente diferentes, há entre eles um elo de grande proximidade. A pauta de competitividade e comércio, por exemplo, frequentemente associada à globalização, teve um grande impacto no desenvolvimento do ensino transfronteiras. Por sua vez, o crescimento desse ensino e sua inclusão nos acordos comerciais bilaterais e regionais fortaleceram a globalização.
 
Os princípios fundamentais que orientam a internacionalização sempre representam objetivos distintos para diferentes pessoas, instituições e países. Ainda assim, prevê-se que a internacionalização teria evoluído a partir de algo que foi tradicionalmente visto como um processo, com base em valores de cooperação, parceria, troca, benefícios mútuos e aprimoramento da capacidade. Agora, a internacionalização é cada vez mais caracterizada pela concorrência, pelo mercantilismo, pelo interesse individual e pela construção de status. É necessário dedicar mais atenção à descoberta das verdades e valores subjacentes à internacionalização do ensino superior.
 
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