27/05/2015

International Higher Education | 79

Ucrânia: as novas reformas e a internacionalização

Sonja Knutson e Valentyna Kushnarenko
Sonja é diretora na International Centre Memorial University of Newfoundland, Canadá. E-mail: sknutson@mun.ca. Valentyna é pesquisadora associada, Ontario Institute for Studies in Education, University of Toronto, Canadá. E-mail: val.kushnarenko@utoronto.ca
A internacionalização do ensino superior na Ucrânia continua vulnerável às tensões geopolíticas da região. Desde nossa analise anterior do contexto ucraniano da internacionalização (IHE #75, Primavera de 2014), graves hostilidades têm ocorrido com a Rússia em torno do leste da Ucrânia. Apesar da distração da Guerra, em 31 de Julho, 2014, o Presidente Ucraniano Pedro Poroshenko assinou a Lei do Ensino Superior, de grande importância, pois é a primeira lei concebida através da consulta popular. O processo de consulta com a participação de educadores, especialistas, membros da comunidade, jornalistas, estudantes, pais e organizações não governamentais não escapou de controvérsias, porem o resultado demonstrou a perseverança e visão das partes interessadas. A nova lei cria as condições do ensino superior ucraniano para agir com maior autonomia, responsabilidade e transparência, permitindo respostas mais ágeis com relação às oportunidades internacionais. Um número de novos artigos da lei é discutido.
 
Maior autonomia
No âmbito da nova legislação, as universidades podem agir com maior autonomia para maximizar seus próprios interesses, competências e potencial. As reformas promovem um processo de tomada de decisão descentralizado e um fórum para os docentes, estudantes e outras partes interessadas expressarem suas opiniões sobre a gestão universitária e desenvolvimento de currículo. O pessoal efetivo da universidade tradicionalmente transfere para o “andar de cima” os direcionamentos, refreando assim decisões importantes e evitando responsabilidades. As reformas criarão mudanças significativas no trabalho habitual, exigindo uma nova abordagem de liderança, que cobra dos administradores o envolvimento dos funcionários, processo de tomada de decisão descentralizado e responsabilidade pela reputação. Se implementadas com sucesso, as reformas têm o potencial de conduzir a uma nova era de criatividade e inovação, ambos componentes críticos da globalização no sistema do ensino superior ucraniano.
 
Garantia da qualidade
A implementação dos processos da garantia da qualidade é um avanço significativo no aumento da transparência da acreditação da universidade na Ucrânia. Os novos processos são apoiados pela criação da “Agencia Nacional para a garantia da qualidade do ensino superior.” A antiga Unidade de Verificação da Qualidade do Ministério da Educação, altamente burocratizada foi criticada por ser ineficiente e lenta. De acordo com o Ministro de Educação, Serhiy Kvit, Enfocar e resolver as questões de qualidade permitirá as universidades ucranianas se engajarem internacionalmente e procurarem uma posição em classificações mais altas nos rankings das universidades internacionais. O artigo #19 da nova lei especifica a composição do novo corpo independente: universidade e representantes profissionais, especialistas da Academia de Ciências, empregadores e representantes eleitos dos estudantes. O monitoramento publico da implementação da lei deverá melhorar a credibilidade geral, significando o inicio do fim dos esquemas de corrupção no setor acadêmico ucraniano. Uma agência independente tem sido formada para aplicar os testes nas admissões dos cursos de graduação, enquanto o artigo #41 encoraja a liderança estudantil a assumir uma postura ativa em casos de corrupção, expulsão, nomeações da administração sênior e decisões administrativas injustas em acomodações coletivas da universidade e dormitórios. A transparência dos orçamentos da universidade está legislada no artigo #80 da lei, com relatórios dos gastos da universidade disponíveis para escrutínio público. Tais medidas poderão dificultar manter despercebidas práticas contábeis, abrindo assim a porta para redução da corrupção, tornando os líderes responsáveis perante o público interessado. 
 
Conformidade com o Processo de Bolonha
A criação de condições favoráveis para mobilidade global de pessoas e conhecimento é um componente importante da internacionalização. Estudantes ucranianos devem estudar no exterior sem sofrer academicamente, e estudantes internacionais nas universidades ucranianas só se beneficiarão se a transferência de crédito acadêmico for padronizada com processos claramente definidos. Sob a Declaração de Bolonha em 2005, o então Ministro da Educação e Ciência Stanislav Nikolyaenko comprometeu a Ucrânia com sérias mudanças legais no sentido de fazer a transição do sistema de ensino superior para os três ciclos de bacharelado, mestrado e doutorado, a fim de introduzir o Sistema de Transferência de Crédito Europeu e para reduzir a cargas horárias de aulas para estudantes e docentes. Mesmo hoje, a terminologia de Bolonha é raramente usada em documentos oficiais ou no campus universitário. O artigo #1 da nova legislação define um crédito acadêmico e o número de créditos em um ano acadêmico de período integral, criando normas que facilitarão a colaboração acadêmica internacional e acentuarão a mobilidade estudantil. Além disso, a introdução de um programa de doutorado nas universidades ucranianas beneficia significativamente a mobilidade global de acadêmicos ucranianos, cujo o status internamente de “candidatos da ciência não é muito bem compreendido no exterior. A conscientização global do grau de “candidato da ciência” foi posteriormente distorcida pela falta de clareza em torno do papel da Academia de Ciências Ucraniana, que tinha o direito exclusivo de conceder esses títulos. O processo agora refletirá melhor as normas em outros países, incluindo os cursos exigidos, pesquisa e defesa de tese na presença de um comitê universitário composto de especialistas do campo de pesquisa. 
 
Intensidade da pesquisa
Os rankings globais, embora cada vez mais sob ataques por limitar excessivamente a definição de excelência do ensino superior, permanece como um importante componente da imagem pública de uma universidade. As universidades com um bom ranking e uma forte reputação atraem os melhores talentos, tanto em se tratando de docentes e funcionários como estudantes. Deste modo, a qualidade da pesquisa e número de publicações em periódicos submetidos à revisão pelos pares e reconhecidos internacionalmente é cada vez mais importante para visibilidade de uma instituição. No âmbito da nova legislação, as universidades ucranianas deverão intensificar a capacidade e produção da pesquisa. Docentes tradicionalmente sobrecarregados com mais de 900-950 horas / ano de ensino em sala de aula verão uma diminuição em suas cargas horárias para 600 horas /ano. Esta é uma mudança significativa no sentido de liberar membros docentes para outras atividades acadêmicas, o que poderá auxiliar os objetivos institucionais gerais, em particular a pesquisa e viagens relacionadas a colaborações de pesquisas internacionais. Tais transformações apresentam uma importante mudança para o status quo, e aqueles que são lentos para reagir poderão se encontrar rapidamente à margem e portanto incapazes de acessar os recursos que estão cada vez mais ligados ao engajamento internacional. 
 
Impacto da internacionalização
Universidades ao redor do mundo lutam para entender as demandas e oportunidades da globalização, portanto a necessidade de uma gestão de mudança qualificada não é de forma alguma unicamente um problema ucraniano. 
 
As universidades tendem a um estilo de auto-organização burocrático e hierárquico, sendo notoriamente resistentes às mudanças.   O sistema de ensino superior ucraniano está talvez iniciando em um ponto de partida, quando comparado a outros países onde as universidades estão mais livres para escolher o conteúdo do programa, tomar decisões financeiras, criar politicas para concessão de diplomas e transferências de crédito e a contratação de docentes através de uma concorrência transparente e aberta. Na Ucrânia, tais inovações poderiam ser prejudicadas se a oposição atrasasse as mudanças, criando incertezas e diminuindo a motivação. Por um lado positivo muito trabalho já foi feito com a relação às melhores práticas para gestão de mudança no ensino superior, o que poderia auxiliar as universidades ucranianas a passarem pelos estágios da mudança de maneira mais rápida. Quanto mais acessível o ensino superior ucraniano se fizer para o mundo através da internacionalização, mais facilmente as mudanças criarão raízes.
 
Conclusão
A aplicação bem sucedida destas reformas prepararão as universidades na Ucrânia, dando as ferramentas para que as instituições de beneficiem das oportunidades internacionais. Os efeitos das hostilidades em curso no leste do país são desafiadores e poderão produzir efeitos imprevisíveis na implementação e momento específico das reformas. Um fator crítico é o desenvolvimento de politicas consistentes e processos, no sentido de gerenciar as reformas de forma equitativa e transparente para evitar revoltas e desestabilização. Criação de capacidades por aqueles que desenvolveram conhecimento e competências em sistemas mais descentralizados — como ex-estudantes ucranianos que estudaram no exterior, ou outros especialistas internacionais precisarão ser envolvidos para participarem no desenvolvimento de novos processos—apoiar novos papeis na administração educacional e preparar um novo quadro de líderes educacionais com uma abordagem progressista da educação. As comunidades do campus precisarão ser fortes, enérgicas e manter o otimismo em alta para manter os níveis de motivação que impelem e fazem as mudanças avançar. Talvez a motivação para compromisso com a reforma da educação do ensino superior ucraniano seja melhor resumida por Mykhaylo Zhurovskyi, Reitor da Universidade Técnica Nacional de Kiev, e um dos autores da nova lei, que declarou publicamente que a Ucrânia não tem outra alternativa exceto começar a mudar sua mentalidade e trabalhar duro para construir outro país.
 
Este texto foi traduzido e revisado sob a coordenação de
Sergio Azevedo Pereira
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