16/10/2012

International Higher Education

Quando os rankings vão longe demais

As classificações podem ser úteis se seus usuários forem incentivados a ir além das notas, que podem mascarar excelência real em áreas específicas

Phil Baty
Editor do ranking mundial de universidades da Times Higher Education
Quando os governos tentam identificar as melhores universidades do mundo, recorrem cada vez mais às classificações globais. Na Rússia, o primeiro-ministro Dmitri Medvedev assinou recentemente uma ordem concedendo reconhecimento oficial aos diplomas oferecidos por 210 universidades de destaque distribuídas entre 25 países – decisão determinada em boa medida por sua presença no ranking mundial de universidades da Times Higher Education. Os milhares de estudantes que devem ser beneficiados com bolsas voltadas para o ensino no exterior dentro do programa russo de Ensino Global, estimado em cinco bilhões de rublos (US$ 152 milhões) também terão de frequentar universidades que ocupem as posições mais altas desse ranking.
 
A reputação de integridade dos rankings deve ser conquistada e mantida por meio de debates abertos sobre seus usos e abusos; eles só podem desempenhar papel útil se os responsáveis por sua elaboração forem honestos sobre o que não podem e jamais poderão capturar No Brasil, um projeto semelhante chamado Ciência sem Fronteiras, destinado a 101 mil estudantes, também se vale principalmente da classificação da Times Higher Education, entre outros rankings, na sua escolha das instituições de destino. E, na Índia, a Comissão de Recursos Universitários estabeleceu novas regras para garantir que somente 500 universidades classificadas pela THE ou pelo ranking acadêmico mundial de universidades de Xangai tenham permissão para operar cursos de diplomação conjunta ou cursos duplos com parceiras indianas. Tal nível de apoio oficial do alto escalão ao trabalho da THE é, sem dúvida, muito gratificante.
 
Abordagem da Times Higher Education
A revista publica sua classificação global de universidades desde 2004, mas conforme o alcance e a influência de nosso trabalho se expandiram, foi necessário trabalhar com maior afinco para produzir resultados de pesquisa que pudessem suportar melhor o peso e a responsabilidade neles depositados. Assim, em 2009, após uma rigorosa avaliação, deixamos de lado o sistema usado nos cinco anos anteriores e recomeçamos o processo. Desfizemos o modelo demasiadamente simplista que tinha prejudicado durante anos as classificações globais e mudamos nossa forma de atuar.
 
Todas as classificações são necessariamente grosseiras. Reduzem as universidades e todas as suas diferentes missões a uma única nota. Nenhum ranking universitário poderá ser realmente completo ou objetivo Primeiro, estabelecemos uma parceria com uma especialista em dados, a Thomson Reuters. Em conjunto com a Thomson Reuters – recebendo as opiniões de mais de 50 dos principais nomes de 15 países de todos os continentes e depois de 10 meses de debate aberto e consulta –, desenvolvemos um novo sistema de classificação para uma nova era de ensino superior globalizado. Felizmente, a reforma produziu o mais equilibrado e abrangente sistema de classificação disponível.
 
A classificação global da Times Higher Education é a única no mundo a examinar todas as missões centrais da universidade de pesquisa global e moderna – pesquisa, ensino, transferência de conhecimento e atividade internacional. Trata-se da única classificação a refletir totalmente a mistura subjetiva e única de cada instituição em toda a gama de índices de desempenho, e também a única a fazer uma avaliação criteriosa da excelência nas artes, ciências humanas e ciências sociais – terrivelmente negligenciadas pelos demais sistemas de classificação. É a única classificação global a incorporar uma pesquisa rigorosa envolvendo acadêmicos experientes e especialistas – necessariamente convidados, sem voluntários nem nomes indicados pelas próprias universidades, é claro.
 
De fato, nosso trabalho atraiu grandes elogios feitos por muitos setores. Fiquei particularmente satisfeito com as palavras de um cético em relação às classificações – Daniel Lincoln, pesquisador visitante do Center for International Higher Education (CIHE) do Boston College – que destacou recentemente o fato de “Baty e a THE serem conhecidos por sua integridade, bem como por sua sinceridade”.
 
Todos os rankings dão mais ênfase à pesquisa, julgada principalmente por citações de estudos publicados em revistas acadêmicas internacionais. Isso afeta instituições de pesquisa emergentes, e certamente não atende àquelas cuja missão tem como foco o ensino Ressalvas
Mas a reputação de integridade deve ser conquistada e mantida por meio de debates abertos e sinceros a respeito tanto dos usos quanto dos abusos dos rankings globais. Todas as tabelas globais de classificação de universidades são necessariamente grosseiras, pois reduzem as universidades e todas as suas diferentes missões a uma única nota composta. Quem quer que adote tais tabelas de classificação com excessiva rigidez correrá o risco de perder de vista os muitos bolsões de excelência em setores que não podem ser capturados por classificações de abrangência institucional ou áreas do desempenho universitário que simplesmente não são devidamente refletidas por nenhum tipo de classificação.
 
Todas as classificações globais dão mais ênfase à avaliação de pesquisa, por exemplo, julgada principalmente por meio do exame de citações dos estudos publicados nas principais revistas acadêmicas internacionais. Isso pode não atender bem aos interesses de instituições de pesquisa emergentes nos países em desenvolvimento, onde a publicação de pesquisas pode ser uma atividade mais nacional ou regional, e certamente não atende àquelas cuja missão tem como foco o ensino.
 
Uma das grandes qualidades do ensino superior global é a extraordinária riqueza de sua diversidade; e isso jamais poderá ser capturado por um ranking, que avalia todas as instituições de acordo com um mesmo conjunto de critérios. Nesse contexto, uma nova declaração feita por um consórcio de reitores de universidade latino-americanas precisa ser bem recebida.
 
A declaração, estabelecida durante os dois dias de conferência na Universidade Nacional Autônoma do México e intitulada “Universidades Latino-Americanas e as Classificações Internacionais: Impacto, Abrangência e Limites”, destacou com certa preocupação que “uma grande proporção dos responsáveis pelas decisões e pela opinião pública enxerga tais sistemas de classificação como se oferecessem uma medida completa e objetiva da qualidade das instituições”. Nenhum ranking universitário poderá ser realmente completo nem objetivo.
 
O encontro, que reuniu reitores e representantes do alto escalão de 65 universidades de 14 países latino-americanos, fez um chamado aos responsáveis pelas políticas de ensino para que “evitassem usar o resultado das classificações como elementos para a avaliação do desempenho de uma instituição, para o estabelecimento de suas políticas para o ensino superior, para determinar o nível de financiamento para as instituições e para a implementação de incentivos e recompensas para as instituições e para os funcionários acadêmicos”.
 
É claro que classificações elaboradas com responsabilidade e transparência podem desempenhar um papel extremamente útil no sentido de permitir que as instituições tenham uma medida do seu desempenho, ajudando-as no planejamento de sua direção estratégica. Podem informar as decisões tomadas pelos estudantes e pelo corpo docente em se tratando de sua carreira. Podem ajudar os governos a compreender melhor alguns dos desafios modernos envolvidos nas políticas de ensino superior para as massas na economia do conhecimento e a comparar o desempenho de suas melhores instituições de pesquisa em relação àquelas de países "rivais". E podem também desempenhar um papel ao ajudar os governos a selecionar potenciais parceiros para suas instituições domésticas, além de determinar em que área investir os recursos destinados às bolsas de ensino.
 
Mas os rankings só podem desempenhar um papel útil se aqueles que são responsáveis por sua elaboração forem honestos sobre o que tais sistemas não podem – e jamais poderão – capturar, bem como sobre o que podem de fato refletir. As classificações podem ser úteis se seus "usuários" forem incentivados a ir além das notas compostas, que podem mascarar uma excelência real em setores e áreas específicos de desempenho.
 
A Times Higher Education está se esforçando para expandir a gama de dados que é divulgada e também para permitir um maior grau de distinção nos resultados dos rankings, bem como uma análise mais nuançada. As classificações podem ser uma ferramenta valiosa para o ensino superior global – mas somente se forem tratadas com o devido cuidado.