18/11/2013

International Higher Education

Professores são a chave para a internacionalização

Sem a participação plena, ativa e entusiasmada dos acadêmicos, os esforços de internacionalização estão fadados ao fracasso

Gerard A. Postiglione e Philip G. Altbach
Postiglione é professor de pedagogia e diretor do Centro Wah Ching para o Ensino na China, da Universidade de Hong Kong. E-mail: gerry@hku.hk. Altbach é professor e diretor do Center for International Higher Education do Boston College. E-mail: altbach@bc.edu
Gerard Postiglione, da Universidade
de Hong Kong
As universidades continuam a posicionar seus professorados com vistas à internacionalização. Como coração da universidade, o professorado desempenha claramente um papel especial em ajudar a impulsionar as economias do conhecimento. Isso é particularmente verdadeiro nos países em desenvolvimento que aspiram a uma integração mais próxima com o sistema global. Entretanto, para muitos países, a internacionalização é uma faca de dois gumes. Sem ela, é difícil uma universidade ser considerada de nível mundial. Mas o fenômeno resulta numa aceleração da fuga de cérebros para os poucos países que têm universidades de nível mundial. Para alcançar o melhor resultado que a globalização pode oferecer, o professorado de todos os países teria que se tornar mais ativo nos esforços de internacionalização. No momento, a disposição de profissionais acadêmicos de toda parte para aprofundar seus envolvimentos internacionais parece estagnada.
 
Parece óbvio que os funcionários acadêmicos, aqueles que lecionam, são fundamentais para a estratégia de internacionalização de qualquer instituição acadêmica. Afinal, são os professores que dão aulas nas franquias universitárias, criam o currículo dos cursos das franquias, participam de colaborações de pesquisa com colegas do exterior, recebem estudantes internacionais em sala de aula, publicam artigos nas revistas internacionais e assim por diante. De fato, sem a participação plena, ativa e entusiasmada dos acadêmicos, os esforços de internacionalização estão fadados ao fracasso.
 
Para muitos países, a internacionalização é uma faca de dois gumes. Sem ela, é difícil uma universidade ser considerada de nível mundial. Mas o fenômeno resulta numa aceleração da fuga de cérebros para os poucos países que têm universidades de nível mundial Sem a participação do corpo docente, os esforços de internacionalização costumam se tornar bastante controvertidos. Exemplos incluem as universidades Yale e Duke, nos Estados Unidos, onde grandes iniciativas internacionais planejadas pelo presidente (equivalente a reitor) da universidade logo se tornaram alvo de contestação no campus. Muitos dos membros do corpo docente da Universidade de Nova York questionaram alguns dos planos globais dessa instituição. Há muitos exemplos adicionais de membros do corpo docente que se recusaram a aceitar incumbências internacionais da universidade, mostrando-se pouco simpáticos com os estudantes internacionais em suas aulas e em geral recusando-se a "comprar" a missão internacional expressada por muitas universidades. Assim, o desafio é garantir que o professorado esteja "no barco".
 
Entretanto, dados das duas maiores pesquisas internacionais no nível do professorado revelam um conjunto surpreendente de indicadores com respeito à internacionalização.
 
O que mostram os dados
Os dois estudos internacionais das atitudes e valores do professorado, um deles realizado em 1992 pela Fundação Carnegie para o Avanço do Ensino e o outro conhecido como Levantamento da Profissão Acadêmica em Transformação, de 2007, investigaram 14 e 19 sistemas acadêmicos, respectivamente.
 
Há muitos exemplos de membros do corpo docente que se recusaram a aceitar incumbências internacionais da universidade, mostrando-se pouco simpáticos com os estudantes internacionais em suas aulas Tais estudos incluíam algumas questões a respeito dos compromissos internacionais e interesses do corpo docente. Já se sabe que, nos EUA, a vida acadêmica é muito mais insular do que em outras partes do mundo. A maioria dos acadêmicos americanos obteve todos os seus diplomas em universidades do próprio país, incluindo a graduação mais elevada. Menos de um terço deles colaboram com parceiros estrangeiros nas pesquisas, ainda que boa parte seja composta por acadêmicos nascidos no exterior que trabalham em universidades americanas; e este é o grupo com maior probabilidade de fazer parte daqueles que participam das colaborações internacionais. Apenas 28% dos acadêmicos americanos têm publicações em revistas de fora dos EUA, e pouco mais de 10% publicaram artigos em idiomas diferentes do inglês.
 
Ainda assim, diferentemente das universidades do Japão ou da Coreia do Sul, as universidades americanas se mostram abertas aos professores nascidos e treinados no exterior. Na verdade, na maioria dos países, quase todos os acadêmicos são cidadãos locais, e o percentual de estrangeiros se encontra abaixo dos 10% – nos EUA eles são 9%. Essa proporção é um pouco mais alta em países como Grã-Bretanha (19%), Canadá (12%) e Austrália (12%). As únicas outras exceções são pequenos países europeus como Holanda e Noruega, onde o fluxo pelas fronteiras reflete a nova realidade da União Europeia. O sistema de Hong Kong é único e extraordinário, com 43% dos acadêmicos sendo estrangeiros, algo que sem dúvida contribui para que esta seja a cidade com a maior concentração mundial de universidades presentes nas classificações globais.
 
Outro fator que impulsiona a internacionalização é a localização dos estudos de doutoramento. Em oito países pesquisados em 2007, mais de 10% (e até 72%) dos acadêmicos tinham obtido seus doutorados num país diferente daquele onde estão empregados. Havia poucos países nessa categoria na pesquisa de 1992. Entre as exceções incluem-se Japão e EUA, onde a maioria dos acadêmicos obtém os doutorados nas universidades domésticas.
 
Não surpreende que acadêmicos de quase todas as partes afirmem enfatizar aspectos internacionais nas suas atividades de ensino e pesquisa. Um grande número deles inclui conteúdo internacional em seus cursos, mas é bem menor o número daqueles que se envolveram no estudo ou trabalho no exterior. Em muitos países, menos de 10% dos professores universitários lecionaram no exterior. Somente em lugares como Hong Kong e Austrália encontramos uma proporção significativa de acadêmicos que lecionaram em outras partes do mundo. Assim, as atitudes acadêmicas em relação à internacionalização não são um obstáculo para os esforços de um país no sentido de internacionalizar suas universidades, sendo mais importante o envolvimento real do corpo docente.
 
O número daqueles que publicam numa revista estrangeira aumentou desde 1992 em todos os países pesquisados, com exceção de Austrália, Japão e EUA. O aumento entre aqueles que publicam artigos em língua estrangeira foi maior em países como México e Brasil Os acadêmicos de países desenvolvidos costumam resistir aos esforços empreendidos por suas universidades para estabelecer um campus no exterior, e o professorado das universidades de pesquisa de alguns países em desenvolvimento muitas vezes enfrenta obstáculos para se conectar ao resto do mundo por causa do controle estatal. Surpreende que a proporção de acadêmicos envolvidos em colaborações internacionais de pesquisa tenha caído em muitos países desde o levantamento realizada em 1992. As razões disso são dignas de preocupação. Os acadêmicos novatos participam de menos colaborações internacionais do que seus colegas de mais experiência e, em toda parte, é pequena a probabilidade de os acadêmicos novatos terem lecionado no exterior. O fato é que, em termos de publicações citadas, os acadêmicos mais produtivos são aqueles envolvidos em colaborações internacionais, incluindo a coprodução de artigos e a publicação num país estrangeiro. Mais uma vez, os Estados Unidos são a exceção, com uma lacuna menor na produtividade de pesquisa entre aqueles que participam de colaborações internacionais e aqueles que não o fazem.
 
A profissão acadêmica se mostra menos inclinada para laços internacionais do que seria de se supor A pesquisa internacional revela aquele que é talvez um dos maiores obstáculos para a internacionalização do professorado – o impulso econômico do sistema universitário. Diferentemente dos sistemas impulsionados pelo Estado ou pelos professores, as economias de mercado têm uma alta proporção de acadêmicos que enxergam suas universidades como um ônus burocrático. Além disso, os acadêmicos das economias de mercado tendem a considerar que suas universidades estão nas mãos de administradores pouco competentes. Naturalmente, isso faz com que o professorado deixe de buscar um nível maior de envolvimento institucional. O resultado significa que eles se mostram menos inclinados a apoiar a visão da liderança de suas universidades para a melhor forma de internacionalização – incluindo a questão dos campi no exterior.
 
Do lado positivo, o número daqueles que publicam numa revista estrangeira aumentou desde 1992 em todos os países pesquisados, com exceção de Austrália, Japão e EUA. O aumento entre aqueles que publicam artigos em língua estrangeira (provavelmente o inglês) foi maior em países como México e Brasil. A relevância dessa pesquisa está no fato de a profissão acadêmica se mostrar menos inclinada para laços internacionais do que seria de se supor – com implicações inevitáveis para a internacionalização.