27/05/2015

International Higher Education | 79

O que conta para a produtividade acadêmica nas universidades de pesquisa?

Philip G. Altbach
Professor pesquisador e diretor do Center for International Higher Education / Centro para o Ensino Superior Internacional no Boston College, E.UA. E-mail: altbach@bc.edu
Publicação em periódicos importantes tem se tornado o principal critério do sucesso acadêmico no ambiente competitivo do ensino superior. Aparecer em periódicos de circulação internacional especialmente em língua inglesa representa um grande prestígio. Universidades estão engajadas em uma corrida armamentista global da publicação; e os acadêmicos são as tropas de choque da batalha. Em jogo estão as classificações ou rankings globais, a alocação de orçamentos dos governos, prestígio nacional, habilidade para atrair os melhores estudantes e professores, e um lugar de destaque na hierarquia acadêmica. Também é útil manter em mente que as publicações e as corridas das classificações ou rankings estão limitadas a uma pequena parte do sistema acadêmico de qualquer país. A grande maioria das universidades são instituições de ensino e apresentam um perfil ou missão de pesquisa limitada ou até nula. Apenas cerca de mil das 18,000 universidades do mundo aparecem nos rankings internacionais. Na verdade, é preciso que se reconheça que a maioria das universidades são instituições de ensino e que a ênfase das mesmas deve ser dada ao ensino e a aprendizagem—e não à melhoria de seus perfis em pesquisa e publicações. A produtividade para qualquer sistema acadêmico deve ser a avaliação de um ensino eficaz e a compreensão cuidadosa do que os estudantes aprendem, assim como garantir que aqueles que entram no ensino superior concluam seus estudos. Desta feita, esta discussão está limitada a uma minoria, porém importante das instituições de ensino.
 
Avaliação da produtividade da pesquisa
Para as universidades com forte atividade de pesquisa e para os acadêmicos que nelas trabalham, a avaliação da produtividade acadêmica não é simples nem fácil. A função essencial da qualidade do ensino é raramente avaliada adequadamente — em parte pelo fato da avaliação da eficácia do ensino não ser fácil e por não existirem parâmetros amplamente aceitos. A métrica padrão de solicitar aos estudantes suas opiniões em cada curso é amplamente reconhecida como inadequada. Ademais, debates atuais enfatizam o aprendizado tanto quanto o ensino— que “valor agregado” o estudante obteve como resultado de seus estudos. Há pouco entendimento sobre como avaliar o ensino ou aprendizado. 
 
As universidades de pesquisa enfocam principalmente a realização da pesquisa: esta é a sua principal missão e o que é fundamental para os rankings é a concretização de um status global elevado. A produtividade da pesquisa é mais fácil de ser avaliada que outros tipos de trabalhos acadêmicos— o ensino tem sido mencionado, assim como o envolvimento com a comunidade e tais funções importantes, como as conexões universidade-indústria que são de igual modo difíceis de definir e quantificar. Desta feita, a pesquisa não é apenas o padrão de ouro, mas quase a única variável semi-confiável. 
 
Mas até mesmo avaliar a produtividade da pesquisa é problemático. Os rankings mundiais incluem os periódicos que estão indexados nos principais índices globais tais como o Science Citation Index, Web of Science, ou Scopus ou seus equivalentes para outras disciplinas. Tais índices listam apenas um pequeno número de periódicos e tendem a favorecer publicações em língua inglesa — a língua cientifica global. Os rankings e outras avaliações nacionais também incluem subvenções concedidas à pesquisa entre outras concessões. Mais uma vez, isso pode ser adequado para as ciências exatas, mas não necessariamente para as outras disciplinas. Os rankings também não levam em consideração as amplas diferenças entre os países e sistemas acadêmicos com relação aos montantes de fundos disponíveis. Nem os índices nem a maioria das universidades reconhecem uma serie de outras avaliações de produtividade bem como as mudanças significativas na distribuição do conhecimento que aconteceu em anos recentes.
 
A camisa-de-força dos índices
O Science Citation Index (SCI), sigla em inglês para índice de citação científica e índices semelhantes avaliam apenas um tipo de produtividade acadêmica — que é mais comum nas ciências naturais e biomédicas. Nestes campos, o trabalho científico é em geral relatado em artigos de revistas já avaliados, sendo posteriormente citados por outros cientistas. Por exemplo, uma universidade africana de pesquisa em ascensão, que anualmente classifica cada professor de acordo com as medidas de produtividade, inclui um artigo em um dos “principais” periódicos internacionais, por dobrar “os pontos” concedidos para um livro de sucesso. Espera-se que um professor “produza” um número especifico de pontos anualmente e artigos publicados nos principais periódicos resultam na maioria dos pontos. 
 
Muitas universidades e sistemas acadêmicos pagam aos docentes pelo reconhecimento à produtividade da pesquisa. Muitas vezes, a maior parte dos pagamentos é por artigos publicados em revistas especializadas aprovadas pelo SCI. Tais pagamentos podem ser equivalentes a um salário de um mês — o que é o caso nas principais universidades chinesas. Em alguns casos, os pagamentos são adicionados ao salário “base.” Uma conceituada universidade russa fornece bônus que podem mais que dobrar os salários base bastante baixos — os bônus concedidos por publicações em russo são menos da metade que aqueles concedidos para publicação em periódicos de reconhecimento internacional. Livros ou capítulos de livros não são qualificados para tais bônus.
 
Outras disciplinas podem reportar resultados de diferentes maneiras. Nas ciências sociais e humanas, por exemplo, os livros são importantes ferramentas para transmitir conhecimento e apresentação da pesquisa. Porém é difícil calcular facilmente os fatores de impacto ou influência intelectual dos livros e portanto, não são comumente incluídos. Excluir os livros coloca em desvantagem aqueles campos acadêmicos nos quais os mesmos permanecem como um elemento central da comunicação do conhecimento — e acadêmicos que escrevem ou editam livros. O fato é que os livros permanecem como um meio importante da comunicação do conhecimento.
 
Anarquia e revolução na comunicação
O ensino superior de massa e tecnologia da informação ambos contribuiu para anarquia e revolução nas formas em que o conhecimento acadêmico é comunicado. Há menos de meio século a maior parte dos resultados da pesquisa acadêmica do mundo e conhecimento acadêmico era transmitida por um número relativamente pequeno de revistas especializadas e editoras comerciais e acadêmicas amplamente reconhecidas pela comunidade acadêmica. A maior parte do conhecimento era produzida e consumida em um pequeno número de países e universidades na Europa e na América do Norte.
 
Embora os centros do conhecimento tradicional permaneçam dominantes, bem mais universidades e pesquisadores em diferentes partes do mundo estão agora produzindo ciência de qualidade e cultura — acadêmicos na China, Brasil, Rússia, e outros países estão engajados em uma rede de conhecimento global tanto como produtores como consumidores. Os principais periódicos estão cada vez mais seletivos e permanecem dominados pelos principais centros acadêmicos — fornecendo acesso limitado para outros. Além disso, muitos são controlados por grandes editoras multinacionais que cobram elevado preços pelo acesso.
 
Aproveitando a internet, os novos periódicos de “acesso aberto” emergiram — embora a qualidade e rigor dos mesmos sejam questionáveis. Periódicos “falsos“ que “publicarão” qualquer coisa, se uma taxa for paga tem proliferado—assim como um número crescente de editoras da vaidade que publicarão livros por uma taxa. Em resumo, há muita confusão e considerável anarquia na comunicação do conhecimento atualmente.
 
Dilemas do financiamento da pesquisa
A instituição acadêmica e sistemas — e, claro, muitos dos rankings—levam em consideração o financiamento da pesquisa quando na avaliação da produtividade acadêmica nas universidades de pesquisas. A obtenção de financiamento é uma medida válida de realização e em alguns campos científicos quase uma necessidade para se conduzir a pesquisa. Mesmo assim, em muitas, talvez na maioria das disciplinas, o financiamento é difícil de ser obtido e os recursos disponíveis são geralmente bastante limitados. Em tais campos, incluindo humanidades e maioria das ciências sociais, a boa pesquisa pode ser realizada com pouco financiamento externo. Além disso, o financiamento mesmo nas áreas das ciências e biomédicas tende a estar mais disponível aos cientistas nas melhores universidades em países com estrutura de pesquisa bem desenvolvida. Desta feita, quando o financiamento é usado como métrica para avaliar a produtividade acadêmica, cuidado considerável e sofisticação não necessários.
 
Como avaliar a produtividade da pesquisa acadêmica?
Os problemas estão claros, embora geralmente ignorados por aqueles ansiosos por “avaliar e recompensar” a produtividade da pesquisa, porém as soluções não. Um modelo único certamente não se adapta a todos os casos no que tange a avaliar a produtividade da pesquisa em particular no trabalho acadêmico, em geral. As avaliações necessariamente variam por disciplina. Algumas coisas são de mais fácil avaliação que outras — artigos publicados em revistas científicas convencionais são mais fáceis de ser avaliados que livros ou vários tipos de publicações online e de “acesso aberto.” É provável que tenhamos que fazer todo o possível para que cuidado, discrição e sofisticação sejam usados ao fazermos julgamentos que geralmente afetam os salários e futuros acadêmicos de professores em uma era de tamanha responsabilização.
 
Este texto foi traduzido e revisado sob a coordenação de
Sergio Azevedo Pereira
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