27/05/2015

International Higher Education | 79

O crepúsculo particular: declínio das universidades privadas no Quênia

Ishmael I. Munene
Professor associado no Departamento de Liderança Educacional, Northern Arizona University, E.U.A. E-mail: Ishmael.Munene@nau.edu
Os últimos acontecimentos apontam que nem tudo está bem no setor universitário privado do Quênia. A International University of Professional Studies (IUPS) Sigla em inglês para Universidade Internacional de Estudos Profissionais encontra-se em processo de leilão, já que o campus principal e outros ativos relacionados a uma dívida de Ksh. 280 milhões (US$3.1 milhões) estão bloqueados. Estranhamente, outra universidade privada, a Mount Kenya University se ofereceu para adquirir os ativos da IUPS, como parte de sua estratégia agressiva de expansão. Tais eventos improváveis levam a dois dilemas contraditórios no setor universitário privado do Quênia: embora o setor encontre-se em uma tendência de trajetória descendente, existe um raio de esperança em meio às nuvens escuras e tempestuosas.
 
Na década de 1990, as universidades privadas foram promovidas como o antídoto para o estado de coma do setor público universitário. Com a diminuição das subvenções do estado, as instituições rebentavam em suas estruturas: a superlotação, instalações delapidadas, bibliotecas com falta de recursos, e grave escassez de profissionais acadêmicos. Com politicas neoliberais de privatização e comercialização, esperava-se que gerasse simultaneamente receitas adicionais para o sistema, e ao mesmo tempo continuasse a atender a demanda, através do crescimento geral do sistema. A década de 1990 e inicio de 2000 representaram os anos dourados do crescimento do setor universitário privado do Quênia, considerando que inúmeras universidades privadas foram estabelecidas, para fornecer um caminho alternativo para o ensino superior. Duas décadas mais tarde, tem acontecido uma inversão naquilo que poderia se chamar de má sorte; as universidades privadas estão em maus lençóis, enquanto as públicas têm registrado um forte ressurgimento.  
 
As matriculas na universidade do Quênia alcançaram o número de 324,560 estudantes em 2014. Cerca de 244,560 (75%) estão matriculados nas instituições públicas, enquanto 80,00 (25%) nas privadas. O número total de universidades chega a 67, dos quais 31 (46%) são instituições públicas (22 autorizadas e 9 instituições afiliadas do ensino superior) enquanto que 36 (54%) são privadas (17 autorizadas, 6 instituições afiliadas do ensino superior, e 13 Autorizações Provisórias de funcionamento). O principal crescimento nas universidades públicas ocorreu em 2012, quando 22 universidades e instituições do ensino superior (71%) foram estabelecidas. Embora o número de universidades privadas suplante as públicas, em números absolutos de matriculas, se encontram em um distante segundo lugar. O enigma que afeta as universidades privadas é uma trilogia de três fatores interligados a saber, a perda de identidade própria, mudança na politica governamental no ensino superior e o ressurgimento do setor universitário público. 
 
Somos todos iguais: crise de identidade
O crescimento das universidades privadas na década de 1990 foi impulsionado pelas Igrejas Evangélicas. Essa primeira onda de crescimento da universidade privada viu todas as principais denominações cristãs estabelecerem universidades privadas, com a nomenclatura da denominação orgulhosamente declarando a afiliação religiosa das instituições — Católicos, Metodistas, Nazarenos, Presbiterianos, Pentecostais, Adventistas do Sétimo Dia e outros grupos protestantes. Estas universidades religiosas têm se promovido no mercado como fornecedoras de uma marca própria de ensino superior, aquela do o fervor religioso. Em 58 por cento, as Universidades Cristãs hoje constituem a maior parte das universidades privadas. O único principal grupo religioso que não estabeleceu uma universidade é a Comunidade Mulçumana. 
 
Em anos recentes, a distinção entre as universidades religiosas e públicas tem desvanecido. À medida que a concorrência por estudantes entre universidades tem se intensificado, as universidades religiosas reduziram a ênfase no fervor religioso de seus processos educacionais. Afiliação profunda com religião ou denominação não é mais o eixo condutor das universidades e muito menos uma razão para se ingressar nas mesmas. O conceito de universidade privada religiosa tem diminuído e considera-se que existam menos motivos ainda para se ingressar em universidades, se o enriquecimento religioso for o objetivo.
 
Uma nova esperança: política governamental
A política do estado tem contribuído para diminuir o crescimento da universidade particular. O governo é visto em termos de como promove o crescimento do setor público com efeito em cascata no setor privado. A regulamentação tardia tem sido usada para enfocar problemáticas relativas à qualidade nas universidades públicas. Em 2012, o governo queniano revogou as leis individuais que estabeleciam a universidade de cada estado e as substitui com um estatuto único que nortearia o desenvolvimento e operações de todas as universidades estaduais. Além disso, o estado tem mandatado a acreditação das universidades estaduais, assim como suas parceiras privadas. Apesar de classes grandes, o elevado número de contingente de docentes em campi de extensão representarem ameaças para qualidade, estes atos simbólicos têm demonstrado a preocupação do governo com a qualidade no setor público e reduzido a critica de negligencia. 
 
Outra politica em nível macro tem sido a expansão do sistema público. Alarmado com o baixo índice de matriculas nas universidades privadas e tendo em vista a crescente demanda, o governo tem avançado com pressa para expandir o setor público através da criação de universidades públicas para absorver a demanda, com baixas taxas de mensalidades, subsidiadas pelo estado. Em 2012 apenas, o governo estabeleceu 22 universidades públicas, através da modernização de faculdades. O estabelecimento de novas universidades públicas tem ocorrido simultaneamente com a expansão da capacidade nas já existentes,   além de aumentar a participação de mercado do setor público. 
 
As ações do governo apontam o papel preponderante do estado como financiador e elemento influenciador dos papeis do setor público. As políticas expansionistas do estado têm sido concebidas, tendo em conta o crescimento do sistema público em detrimento do setor privado.
 
O renascimento da Fênix: revitalização do setor público
O declínio privado está também ligado à revitalização do setor público através da privatização. Após a privatização das universidades públicas, distinções setoriais, com as privadas têm se tornado imprecisas. A politica do estado tem promovido à geração de receita interna por parte das universidades públicas que por sua vez têm respondido através da privatização e comercialização tanto das funções acadêmicas como das não acadêmicas no sentido de apoiar e melhorar seus resultados. 
 
Através dos programas do modulo II, as universidades públicas estão aptas para admitir estudantes financiados por fundos privados, que pagam mensalidades mais elevadas que os estudantes financiados pelo estado, porem menos que nas universidades privadas. Isso já despertou o interesse da comunidade em programas orientados pelo mercado como engenharia, tecnologia da informação, ciências médicas e farmácia. Dado ao prestígio historicamente ligado às universidades públicas, os programas do modulo II têm se tornado “a primeira segunda escolha” para aqueles que se relevam incapazes de obter a cobiçada opção de financiamento pelo estado. Nas duas das maiores universidades públicas do Quênia, a Universidade de Kenuyatta e a Universidade de Nairobi, o número de estudantes financiados pela inciativa privada ultrapassa o número de estudantes financiados pelo setor público.
 
Além disso, as universidades públicas têm se engajado em atividades comerciais em extensões inimagináveis nas instituições privadas. Estabeleceram parques industriais, constituíram joint ventures com corporações privadas, comercializaram seus serviços de moradia e catering e alugaram suas instalações a preço de mercado. As receitas geradas das taxas de mensalidade e atividades comerciais têm sido utilizadas na manutenção e reparos das instalações existentes e na construção de novas. 
 
A privatização e comercialização têm assistido o ressurgimento do feudo público, que se tornou um ímã para aqueles que buscam educação universitária a custos moderados. Este modelo de universidade pública com uma privatização robusta pode apenas coexistir com o encolhimento do setor privado. Praticamente todas as universidades privadas lutam neste momento para aumentar um numero suficiente de estudantes que permita a utilização otimizada de suas instalações existentes. 
 
O enigma da qualidade
Com o declínio da participação de mercado, a maioria das universidades privadas apresenta um índice de matriculas insuficiente, assim comprometendo o bem-estar financeiro e qualidade acadêmica. A instrução de qualidade é ameaçada pela perda de membros docentes para funções sindicalizadas e melhor remuneradas nas universidades públicas e a presença de grandes números de docentes adjuntos que também não se engajam em trabalho acadêmico para melhorar a reputação. Ademais, suas bibliotecas permanecem pequenas e com poucos recursos. Todas essas variáveis relacionadas à qualidade contribuíram ainda mais para desestruturar o setor universitário privado.
 
Este texto foi traduzido e revisado sob a coordenação de
Sergio Azevedo Pereira
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