06/11/2012

International Higher Education

Internacionalização da mão de obra acadêmica: considerações a respeito dos pós-doutorados

Brendan Cantwell
Cantwell é professor assistente de aprendizado no ensino superior da Universidade Estadual de Michigan, East Lansing, MI. E-mail: brendanc@msu.edu
A mobilidade no pós-doutorado ocorre quase que exclusivamente do sul para o norte e do oriente para o ocidente A internacionalização dos acadêmicos ocorreu mais lentamente do que outros aspectos da internacionalização do ensino superior. Na maioria dos países, uma substancial maioria dos acadêmicos é de nacionalidade local, e ainda há barreiras substanciais no estabelecimento de carreiras acadêmicas transnacionais. A internacionalização do pós-doutorado, no entanto, pode ser um sinal da crescente mobilidade transnacional da mão de obra acadêmica, ao menos nos primeiros estágios da carreira. Atualmente, um grande número de cientistas e estudiosos em início de carreira cruza as fronteiras para assumir posições de pós-doutoramento fora de seu país de origem ou residência permanente. Ainda assim, a mobilidade no pós-doutorado não demonstra um "achatamento" do mercado global de mão de obra acadêmica. Esse movimento ocorre quase que exclusivamente do sul para o norte e do oriente para o ocidente. Ao avaliar a internacionalização no pós-doutorado, é importante levar em consideração os fatores que estão impulsionando o fenômeno, bem como suas implicações.
 
EUA, onde os acadêmicos iniciantes não são em geral encorajados a trabalhar no exterior, continuam sendo uma exceção à regra da mobilidade crescente Definindo a internacionalização no pós-doutorado
O pós-doutorado é heterogêneo entre as disciplinas acadêmicas, países e instituições individuais. Independentemente disso, é possível fazer algumas generalizações. Os pós-doutorandos costumam se dedicar à pesquisa e podem ser vistos como estagiários avançados na fase final de preparação para a carreira acadêmica. Entretanto, é possível atribuir uma ênfase excessiva ao aspecto de treinamento do trabalho de pós-doutorado. Os pós-doutorandos são a linha de frente da mão de obra acadêmica e fazem contribuições substanciais ao empreendimento de pesquisa.
 
Um pós-doutorando internacional é um acadêmico em início de carreira trabalhando fora de seu país de origem ou de residência permanente. Os pós-doutorandos internacionais costumam precisar de um visto de trabalho como condição para a sua contratação, excluído o caso dos pós-doutorandos com mobilidade dentro da União Europeia. A crescente internacionalização dos pós-doutorandos ocorreu em muitos países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, mas talvez isso se aplique principalmente aos Estados Unidos, onde a maioria dos quase 60 mil pós-doutorandos que trabalham no país seja detentora de vistos de permanência temporária.
 
Incerteza quanto a financiamento induz à contratação de temporários como os pós-doutorandos em lugar de acadêmicos permanentes Explicando a internacionalização dos pós-doutorandos
Um dos fatores que impulsionam a internacionalização do pós-doutorado é a globalização da ciência. A comunicação científica mediada pela internet e o acesso mais amplo às publicações científicas disponíveis online levou a uma difusão mais ampla do conhecimento científico. Cada vez mais, os estudantes das universidades de pesquisa de muitos países se formam com níveis comparáveis de conhecimento básico e capacidade técnica. A rápida expansão e desenvolvimento do ensino superior em muitos países, e principalmente na China, aumentaram dramaticamente o pool de potenciais pós-doutorandos em todo o mundo. Além disso, ainda perduram assimetrias significativas nos recursos de apoio à pesquisa. Em termos simples, é maior o número de oportunidades para o trabalho de pós-doutorado na Europa Ocidental e na América do Norte, e os mais qualificados pós-graduandos de todo o mundo concorrem por tais empregos.
 
Outro fator que provavelmente contribui para a internacionalização do pós-doutorado é o crescente valor atribuído à experiência internacional nas carreiras acadêmicas. Estudar e trabalhar no exterior são atividades agora vistas como importantes componentes do desenvolvimento intelectual e profissional no trabalho acadêmico. A mobilidade internacional nos primeiros estágios da carreira pode ser muito valorizada porque o trabalho no exterior costuma ser associado à aquisição de conhecimentos e habilidades de "nível mundial". Isso é especialmente verdadeiro na Europa, onde a mobilidade é extremamente incentivada nos estágios iniciais da carreira. Os Estados Unidos, onde os acadêmicos iniciantes não são em geral encorajados a trabalhar no exterior, continuam sendo uma exceção à regra da mobilidade crescente.
 
Professores e pesquisadores de ponta também se mostram ansiosos pela concorrência em nível global. Contratar os "melhores e mais brilhantes" pós-doutorandos para um projeto de pesquisa implica agora em valer-se dos participantes de um mercado de trabalho global. Os professores dos países membros da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico recrutam com regularidade pós-doutorandos a partir dessa base de talentos global. Poucos acadêmicos em início de carreira vindos desse conjunto trabalham nos países em desenvolvimento.
 
Muitos sistemas de ensino superior em todo o mundo estão passando por uma transição contínua do apoio direto do Estado para modelos de financiamento quase análogos ao de mercado. Os exemplos incluem esquemas de financiamento que têm como base a produtividade em pesquisa, as iniciativas de excelência e também outros mecanismos competitivos de financiamento, que estão crescendo em relação ao apoio oferecido pelos recursos concedidos em bloco (às vezes em redução). O relativo horizonte de curto prazo e a incerteza desses modelos de financiamento induzem mais à contratação de funcionários temporários como os pós-doutorandos em lugar de acadêmicos permanentes. Além disso, o número mundial de acadêmicos de formação completa parece ser maior do que o número de empregos permanentes disponíveis. Muitos pesquisadores nos estágios iniciais de suas carreiras completam uma série de pós-doutorados não por assim desejarem, e sim por serem essas as únicas oportunidades encontradas no mercado de empregos acadêmicos.
 
As reformas nas políticas nacionais de imigração podem também explicar, em parte, a crescente internacionalização dos pós-doutorandos. Muitos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico mudaram o foco de suas leis de imigração para refletir a prioridade de atrair trabalhadores altamente qualificados como visitantes e imigrantes. Em alguns casos, isso significa que os obstáculos legais à contratação de funcionários acadêmicos internacionais foram diminuídos. Os países membros da União Europeia formaram um mercado unificado de mão de obra. Países como Austrália e Canadá dão prioridade aos indivíduos de qualificação mais avançada na emissão de seus vistos de trabalho. Até a política dos EUA, vista nos últimos anos como hostil aos trabalhadores imigrantes, faz uma exceção especial no caso das universidades.
 
As políticas de imigração que favorecem migrantes qualificados parecem ser um incentivo para que alguns acadêmicos em início de carreira busquem um pós-doutorado no exterior. Alguns acadêmicos iniciantes, principalmente aqueles vindos de países em desenvolvimento, enxergam o trabalho de pós-doutoramento num país membro da OCDE como um primeiro passo no sentido da migração de longo prazo. Às vezes, estudiosos europeus que trabalham como pós-doutorandos na América do Norte ou em outros países da Europa também imigram. Com frequência, tais casos costumam refletir uma migração "acidental", que ocorre como resultado do acaso e da oportunidade em vez de uma estratégia específica voltada para a emigração. Embora a interpretação da mobilidade acadêmica e da migração em termos de soma zero seja provavelmente simplista demais, está claro que os EUA são os mais beneficiados pelo fluxo internacional de talentos.
 
Muitos pesquisadores nos estágios iniciais da carreira completam uma série de pós-doutorados não porque querem, mas por ser a única oportunidade no mercado de empregos acadêmicos Oportunidades e desafios
A internacionalização do pós-doutorado representa uma importante oportunidade para o ensino superior em todo o mundo. A mobilidade transnacional dos acadêmicos iniciantes pode promover a troca de ideias, a difusão do conhecimento e o entendimento transcultural e transnacional. Tudo isso é desejável em si e pode levar indiretamente a outros resultados positivos – como a pesquisas que sejam mais relacionadas a problemas científicos e sociais que sejam considerados mais relevantes a um maior número de regiões mundiais.
 
Alguns desafios sérios estão associados à internacionalização do pós-doutorado. Embora não exista um conjunto abrangente de dados a respeito do fluxo de pós-doutorandos, é evidente que não existe paridade em tais fluxos. Os fluxos assimétricos de acadêmicos em início de carreira podem contribuir com a fuga de cérebros. Além disso, embora a mobilidade internacional para acadêmicos iniciantes possa ser positiva, é possível que o excesso de algo bom se torne negativo. Os acadêmicos que atravessam fronteiras em busca do próximo pós-doutorado correm o risco de se tornarem "eternos pós-doutorandos". Isso pode estar em conformidade com os ideais contemporâneos de uma pesquisa acadêmica que ocorra em equipes e redes flexíveis, orientadas por projetos e para a solução de determinados problemas, mas não pode ser considerado um modelo especialmente útil para o desenvolvimento de uma carreira acadêmica estável. Por fim, existe uma preocupação real associada à exploração dos pós-doutorandos internacionais. Minha pesquisa envolvendo a experiência de pós-doutorandos internacionais trabalhando em universidades americanas e britânicas identificou que tais indivíduos costumam trabalhar demais sem receber o apoio proporcional.
 
Conclusão
O pós-doutorando pode ser um dos principais indicadores de uma tendência no sentido da internacionalização dos acadêmicos. Os responsáveis pela elaboração de políticas, os líderes institucionais e os pesquisadores da área do ensino superior vão continuar a avaliar a mobilidade dos pós-doutorandos, bem como a mobilidade de outros funcionários acadêmicos. Assim, poderão certamente cuidar das virtudes do trabalho acadêmico transfronteiras. É clara a importância do ponto até o qual os padrões atuais e futuros da mobilidade acadêmica reproduzem as assimetrias globais, bem como a do resultado do trabalho individual dos pós-doutorandos internacionais.