23/04/2012

Tecnologia de ensino

Uso da informática para personalizar experiências chega ao ensino superior nos EUA

Sistemas de data mining analisam histórico escolar para sugerir aos estudantes a escolha de disciplinas e até de parceiros em grupos de estudo

Universidades e consultorias americanas começam a adotar sistemas eletrônicos de tabulação e de análise de dados, semelhantes aos usados por grandes varejistas online, para oferecer aos estudantes uma experiência educacional mais personalizada.
 
Programa sugere grupos de estudo com pessoas que deram respostas divergentes a uma determinada questão para facilitar troca de pontos de vista e estimular o debate Da mesma forma que livrarias na internet, usam algoritmos para tratar o histórico de compras de cada cliente. Assim como a Amazon.com traça um perfil que permite prever por quais livros uma pessoa deverá se interessar para adquirir no futuro, sistemas em uso em universidades como Harvard analisam estatísticas como histórico escolar e média de notas para sugerir aos estudantes a escolha de cursos, disciplinas e até mesmo de parceiros em grupos de estudo.
 
Em reportagem sobre o assunto, publicada em dezembro, o jornal The Chronicle of Higher Education refere-se ao uso de "data mining" – literalmente, "mineração de dados", como é chamado o uso exploratório de uma grande massa de informações em busca de padrões úteis – por instituições de ensino superior como a "Abordagem Moneyball da Faculdade". Moneyball é o título de um livro (e de um filme) sobre o uso de dados estatísticos na formação de um time competitivo de beisebol.
 
No exemplo tirado de Harvard, o Chronicle cita o programa Learning Catalytics, criado pelo professor de Física Eric Mazur e aplicado numa turma de Cálculo. Cada estudante, ao usar um dispositivo de informática (tablet, laptop ou telefone) para entrar no sistema da aula, recebe um problema para resolver. O programa analisa as respostas dos estudantes, e sugere a formação de grupos de estudo compostos por pessoas que deram respostas divergentes à questão, de modo a facilitar a troca de pontos de vista diversos e estimular o debate. 
 
Além disso, o sistema marca para o professor onde estão sentados os alunos que deram respostas certas ou erradas, de modo que ele fica sabendo quais carteiras visitar.
 
O Learning Catalytics é apenas um exemplo do uso combinado de estatística e processamento de dados na tentativa de melhorar a experiência na sala de aula. Em setembro do ano passado, as revistas americanas The Atlantic e Washington Monthly publicaram artigos com títulos assim: "Como um match.com para estudantes pode tornar os processos seletivos obsoletos" e "O fim dos processos seletivos universitários como os conhecemos".
 
"Match.com", no caso, é um site de relacionamentos onde pessoas buscam parceiros de perfil compatível para namorar. Ambos os artigos tratavam de um serviço online chamado ConnectEDU, que se propõe a rastrear e analisar estatisticamente o desempenho de estudantes desde o ensino fundamental, fornecendo, ao final do ensino médio, uma análise já com os nomes das instituições de ensino superior em que cada jovem seria mais bem-vindo e teria maiores chances de obter sucesso acadêmico.
 
"Se você quer comprar ações, participar de um leilão de antiguidades, encontrar um emprego ou procurar o namorado certo, você provavelmente irá a um mercado movido pela troca eletrônica de informações", escreve a Washington Monthly. "Mas se você é um estudante procurando uma faculdade ou uma faculdade procurando um estudante, você se vê preso a um sistema arcaico, excessivamente complicado e mal gerenciado". O ConnectEDU é apresentado como alternativa.
 
Faculdade registra cada clique de alunos, acumulando informação sobre se acessaram bibliografia, por exemplo; algoritmos são criados a partir das correlações entre comportamentos observados e performances finais Outra experiência destacada pelo Chronicle é de uma faculdade comunitária do Arizona. "No oitavo dia de aula", escreve o jornal, "O Rio Salado College pode prever, com precisão de 70%, se um estudante terá nota 'C' ou melhor em um curso". Isso graças a um software que registra cada clique que os estudantes dão em seus computadores, acumulando dados sobre comportamentos como: este aluno acessou a bibliografia? Entregou o trabalho dentro do prazo? Abriu a página do dever de casa? Algoritmos com poder de previsão então são criados a partir das correlações entre os comportamentos observados e as performances finais.
 
A despeito das vantagens em potencial, a tendência de usar sistemas informatizados para agregar dados sobre estudantes tem seus críticos. Além de questões éticas – até que ponto é correto seguir cada passo que um estudante dá no computador? – há quem tema danos ao próprio espírito criativo que deveria animar o ensino superior.
 
Ouvido pelo Chronicle, Gardner Campbell, diretor de desenvolvimento profissional e de iniciativas inovadoras de Virginia Tech, disse temer que a preocupação com "contagens de cliques" leve a uma padronização perniciosa da educação.
 
Leia também: Chancellor, provost, proctor, registrary, Regent House - Entenda as estruturas e funções em universidades europeias e dos EUA
 
capa da edição impressa nº 5 | abril de 2012