03/08/2012

Educação com fins lucrativos

Relatório do Senado americano acusa universidades privadas de privilegiar lucro em detrimento do ensino

Instituições de ensino superior estão mais interessadas nos resultados financeiros, diz texto produzido durante dois anos por comissão

divulgação
Universidade de Phoenix é a maior com fins lucrativos dos EUA
Um relatório do Senado dos Estados Unidos sobre instituições de ensino superior com fins lucrativos mostra o setor demasiadamente preocupado com lucros e resultados financeiros e pouco atento ao desempenho acadêmico de seus alunos. O documento divulgado no dia 29 de julho pela Comissão de Saúde, Educação, Trabalho e Aposentadoria (HELP, na sigla em inglês) do Senado, depois de dois anos de estudos, se baseou em informações de 30 instituições privadas que controlam universidades, faculdades e centros universitários e concluiu pela necessidade de um maior controle do governo sobre a qualidade dessas entidades.
 
As instituições com fins lucrativos normalmente atendem estudantes adultos, que adiaram a entrada no ensino superior A comissão revela que os contribuintes norte-americanos arcaram com um repasse de verbas de US$ 32 bilhões no ano letivo 2009-2010 para financiar os estudos de alunos nessas universidades, faculdades ou centros universitários, no entanto, mais da metade dos matriculados desistiu do curso antes de obter uma graduação ou diploma. Essas faculdades normalmente atendem estudantes adultos, que adiaram a entrada no ensino superior, trabalham em tempo parcial ou integral e não dependem financeiramente de seus pais. Do total de instituições relacionadas no estudo, 15 são empresas de capital aberto (com ações negociadas em bolsa) e 15 são empresas de capital fechado. A comissão avaliou dados referentes aos anos de 2006 a 2010.
 
Dependência de empréstimos
 
Dados do Departamento de Educação dos EUA citados pelo relatório mostram que 96% dos estudantes de instituições com fins lucrativos utilizam empréstimos estudantis; em contrapartida, fazem empréstimos para custear seus estudos 13% dos alunos das "community colleges" (faculdades regionais que oferecem normalmente cursos superiores com duração de dois anos), 48% dos alunos das instituições públicas com cursos de quatro anos de duração, e 57% dos alunos das faculdades privadas sem fins lucrativos. O nível de endividamento daqueles que frequentam as faculdades com fins lucrativos também é superior ao de outros tipos de instituições: entre os alunos de bacharelado que se graduaram em faculdades que visam o lucro, 57% devem US$ 30 mil ou mais, enquanto esse percentual é de apenas 25% nas privadas sem fins lucrativos e de 12% nas faculdades públicas.
 
Regime de dedicação parcial dos professores dessas instituições prejudica a qualidade do ensino, aponta o relatório "A supervisão estadual das empresas de educação com fins lucrativos se desgastou com o tempo devido a uma série de fatores, como cortes do orçamento dos Estados e a influência da indústria de ensino superior com fins lucrativos sobre os tomadores de decisões estaduais", aponta o documento, destacando ainda o problema da falta de exigência de requisitos mínimos por parte das agências de acreditação e da manipulação de dados para o cumprimento de exigências das leis federais.
 
Dedicação docente
 
Outro problema destacado que prejudica a qualidade do ensino é o regime de dedicação parcial dos professores dessas instituições; em 2010, 80% dos docentes das instituições avaliadas tinha dedicação de tempo parcial. Em um terço das instituições avaliadas, esse percentual supera os 80% e em cinco instituições esse número chega aos 90% de professores sem dedicação integral.
 
Em 2009, as instituições avaliadas gastaram US$ 4,2 bilhões em marketing, propaganda, recrutamento e equipes de admissão, o que significa 22,7% das receitas totais. Em contrapartida, os gastos com instrução foram de apenas US$ 3,2 bilhões, ou 17,2% das receitas totais. "Isso significa que as empresas juntas se dedicaram menos aos custos com instrução (docentes e currículo) do que com marketing, recrutamento ou lucros", destaca o documento.
 
Falhas nos retornos à sociedade
 
Segundo dados da comissão, em 2010, o setor de ensino superior com fins lucrativos como um todo concedeu cerca de 450 mil certificados e 260 mil títulos de graduação de dois ou quatro anos. O estudo mostra que, "apesar de o setor de faculdades com fins lucrativos ainda apresentar potencial para ser uma força transformadora no ensino superior, o setor como se apresenta hoje frequentemente falha na oferta dos benefícios que o ensino superior tradicionalmente proporciona tanto para estudantes como para contribuintes".
 
Estão matriculados atualmente em instituições de ensino superior com fins lucrativos 2,4 milhões de alunos nos EUA Dos quase 1,1 milhão de alunos matriculados nas 30 instituições avaliadas, entre os anos de 2008 e 2009, 596 mil deixaram o curso em meados de 2010 sem obter um certificado ou diploma, apesar de continuarem com as dívidas dos empréstimos estudantis. O relatório afirma que estão matriculados atualmente em instituições de ensino superior com fins lucrativos 2,4 milhões de alunos, cerca de 10% do total de estudantes do ensino superior norte-americano. As matrículas nas faculdades que visam lucro cresceram 225% entre 1998 e 2008, enquanto o setor de ensino superior norte-americano como um todo cresceu apenas 31% no período, informa o relatório.
 
Já os empréstimos e subvenções para estudantes com recursos do Departamento de Educação passaram de cerca de US$ 5 bilhões no ano letivo 1999-2000 para US$ 32 bilhões no ano letivo 2009-2010. A legislação dos EUA determina que as instituições com fins lucrativos obtenham no máximo 90% de suas receitas de fundos federais de apoio aos estudantes.
 
Perfis variados das instituições
 
A iniciativa da comissão parlamentar foi liderada pelo senador Tom Harkin, democrata do Estado de Iowa, que preside a HELP e tem se posicionado abertamente pelo maior rigor do governo no controle das instituições de ensino superior com fins lucrativos. Entre algumas das principais instituições incluídas no estudo estão: Apollo Group, do Arizona (470 mil alunos) — dono da maior instituição de ensino superior com fins lucrativos do país, a Universidade de Phoenix —; American Public Education, da Virgínia Ocidental (77 mil alunos); Bridgepoint Education, da Califórnia (77 mil alunos); Education Management Corporation, da Pensilvânia (158 mil alunos); DeVry, de Illinois (130 mil alunos); Kaplan, de Nova York (112 mil alunos); e ITT Educational Services, de Indiana (88 mil estudantes). Essas empresas operam centenas de campi em diversos Estados do país, além de cursos de ensino a distância.