13/06/2013

International Higher Education

Tendências e estratégias das marcas universitárias

Gili S. Drori
Gili S. Drori é professora assistente de sociologia e antropologia da Universidade Hebraica de Jerusalém, Israel. E-mail: gili.drori@mail.huji.ac.il
Um clima de acirrada concorrência global pelos recursos, estudantes e professores está levando as universidades do mundo todo a lançar mão de exercícios estratégicos e iniciativas envolvendo o trabalho com suas marcas. Assim como fazem as corporações, as universidades articulam o enunciado de sua visão e missão pensando na diferenciação de suas marcas e nas campanhas de marketing. Um dos resultados disso é o fato de, seguindo a orientação de consultores de marca e marketing, universidades de todo o mundo têm substituído as versões tradicionais de seu brasão, emblema e selo por logotipos estilizados e visualmente atraentes. Esta medida é extremamente simbólica da transformação das universidades, que cada vez mais deixam de ser instituições profissionais (e muitas vezes públicas) de pesquisa e aprendizado, tornando-se participantes de um mercado.
 
Tendências nas marcas
As marcas são artefatos que identificam de maneira inequívoca a organização: espera-se que elas transmitam a personalidade de uma determinada universidade. Na complexa economia global, na qual os consumidores são bombardeados por produtos que disputam sua atenção, o trabalho com a marca, ou branding, é considerado um imperativo para o sucesso de marketing. Esta lógica penetrou o setor global das universidades: por mais que estas já fossem orgulhosas de seus emblemas, considerando-os símbolos das comunidades que as cercavam, o branding acadêmico está ligado a uma estratégia de marketing voltada para a diferenciação da universidade em meio às 14.000 (supostas) concorrentes mundiais.
 
Podemos identificar nas universidades três tendências de branding. A primeira é o redesenho que muitas universidades buscaram para seus emblemas nas últimas duas décadas, modernizando o símbolo que as representa: o emblema tradicional, carregado de elementos que remetem à profissão, foi reimaginado de acordo com a lógica do logotipo, que pode ser facilmente confundido com uma marca comercial. Isto é percebido como uma mudança na estética da insígnia da universidade: o símbolo repleto de imagens figurativas (livros, fontes de luz como tochas, representando o Iluminismo, ou ícones racionais) e invariavelmente os textos cheios de significado (nome da universidade e seu ano de fundação, por exemplo) são retrabalhados numa imagem mais próxima de um logotipo comercial, sendo apenas vagamente (se tanto) evocativo da história da universidade (seus pais fundadores), sua missão (ferramentas de laboratório ou livros abertos), ou caráter (ambiente natural, vida no campus, esportes e semelhantes). Austeros e minimamente ornamentados, os logotipos redesenhados são característicos das universidades mais novas e daquelas que passaram por uma campanha de planejamento estratégico. Portanto, a adoção do estilo dos logotipos indica que a forma de representação atualmente considerada legítima para as universidades se assemelha àquela adotada pelas corporações: uma imagem imediatamente identificada com uma organização distinta, além de facilmente apropriada pelas suas campanhas de marketing.
 
A segunda tendência pode ser observada nas universidades que acrescentam elementos de identificação visual aos seus emblemas tradicionais, em lugar de substituí-los. Nesta tendência os novos ícones atendem a propósitos diferentes: selos de universidades, por exemplo, ainda são comumente usados nos documentos oficiais emitidos pela instituição de ensino, como diplomas. Os logotipos, por sua vez, seriam usados nos cartazes e bandeiras, e marcas digitais nos sites da internet e marcas-palavra (imagens simplificadas do emblema tradicional, acompanhadas do nome da universidade) são usados nos papéis timbrados e nos cartões profissionais. Trata-se de uma expressão visual da diferenciação de identidade, de acordo com o público e a função; as universidades recorrem quase que unicamente aos seus logotipos na tentativa de atrair o público jovem dos potenciais estudantes, por exemplo, ao mesmo tempo reservando seus emblemas tradicionais para eventos formais como cerimônias de formatura.
 
A terceira e última tendência pode ser observada nas universidades que buscam proteger seus ícones e lemas ao declará-los sua propriedade intelectual - registrando-os como marcas comerciais ou de serviço. Uma vez definidas desta maneira, as insígnias universitárias tornam-se fontes de renda por meio do merchandising, sendo licenciadas para fabricantes que incluem tais ícones nos conhecidos agasalhos e camisetas que trazem o nome ou marca da instituição. Esta medida de proteção intelectual da insígnia tem como base uma proposta de valor: os ícones universitários não são mais simples distintivos de identidade da universidade enquanto comunidade acadêmica, tornando-se em vez disso commodities que se valem da reputação da instituição de ensino.
 
Implicações estratégicas
Agora que o trabalho com as marcas é considerado imperativo e as universidades lançam campanhas de branding, tais instituições passaram a buscar a orientação de profissionais. De fato, o branding universitário se converteu numa subespecialidade do setor de consultoria de branding e marketing: firmas de consultoria oferecem serviços especializados de marketing e branding para as universidades, e associações de branding criam escritórios nos campi universitários. Tal grau de profissionalização também impulsiona mudanças administrativas nas universidades, muitas vezes com a criação de uma unidade administrativa incumbida da gestão de marca ou da        mudança na orientação do porta-voz da universidade, deixando de lado a mera divulgação de informações a respeito das atividades universitárias e investindo no marketing proativo da universidade para os potenciais estudantes e seus pais, doadores e firmas parceiras.
 
Uma vez que a campanha de branding define um novo estilo para o ícone ou conjunto de ícones que representam a marca, seguem-se na universidade ajustes operacionais. Com frequência, as universidades formalizam seus guias de referência para o uso de sua marca sob a forma de regulamentos: muitas universidades produzem "manuais de marca" especificando o tamanho e a cor dos logotipos, descrevendo os diferentes logos e seus papéis funcionais, explicando as regras envolvendo o uso da marca. Além disso, desvios no formato ou infrações em relação às especificações definidas são passíveis de multa. As universidades processam outras instituições que desrespeitam a propriedade intelectual de seus logotipos, e algumas chegam a multar departamentos acadêmicos dentro da própria universidade por não seguirem os termos especificados. Tais passos administrativos são explicados formalmente como questão de consolidar uma identidade única para a universidade como um todo, mas explicações desse tipo também são pesadamente influenciados por argumentos administrativos envolvendo a coesão administrativa entre as unidades menores dentro da organização.
 
Significado cultural
O trabalho com as marcas é mais do que uma simples moda, o aprendizado de práticas de marketing por parte das universidades a partir de firmas e outras universidades bem-sucedidas; em vez disso, o branding é uma transformação importante na identidade da universidade. Os logotipos das universidades transmitem pouco da academia enquanto profissão, instituição nacional ou organização voltada para o conhecimento; e, além disso, os logotipos pouco trazem do legado e da localização da universidade. A decisão de optar por um ícone semelhante ao estilo dos logotipos é, portanto, uma opção pela metamorfose: abandonar os sinais que transmitem o significado da academia como instituição profissional semelhante a uma corporação de ofício e incorporar sinais que transmitem o reconhecimento comercial de uma marca e o seu valor. De fato, o trabalho com as marcas nasceu da universidade empreendedora e dos processos de transformação do ensino em commodity passível de marketing: inicialmente, a universidade empreendedora de engajamento social fazia o marketing de sua pesquisa por meio da solicitação de patentes, ao passo que, hoje, a universidade também faz o marketing de sua reputação por meio de sua marca.
 
O trabalho com a marca traz novos significados para categorias acadêmicas bem estabelecidas. O branding traz a lógica do marketing e da gestão comercial para a universidade, acirrando a percepção da concorrência acadêmica. Dessa maneira, a universidade foi transformada numa "universidade promocional". E a promoção e o marketing alteram o tom do trabalho acadêmico, se não o seu núcleo: a partir da perspectiva do branding, a excelência é uma estratégia de diferenciação, e não puramente um dever profissional. A ênfase na promoção também é acompanhada por uma redefinição daquilo que uma universidade faz; tal ênfase sujeita a criação de conhecimento, o ensino e o estudo às lógicas do marketing e do serviço. Especificamente, com a reputação de uma marca é construída a partir do serviço ao consumidor e do benefício oferecido por seus produtos, as universidades se tornam particularmente sensíveis à avaliação que os alunos fazem do ensino e dos benefícios salariais posteriores à graduação, e, como consequência, as decisões curriculares (como a decisão de oferecer um determinado curso ou criar um novo programa acadêmico) são tomadas em resposta à satisfação dos estudantes. Um curso pode ser oferecidos por causa de sua popularidade entre os estudantes e da alta procura, por exemplo, e não por causa de sua importância no rumo geral do desenvolvimento profissional e da aquisição de conhecimento. Por fim, o trabalho com a marca redefine a profissão acadêmica: ao permitir que consultores orientem a estratégia, os membros do corpo docente delegam a responsabilidade de conduzir a universidade a "forasteiros", entregando o destino da comunidade acadêmica e sua autonomia a gestores profissionais. Dessa maneira, a universidade é transformada de instituição semelhante a uma corporação de ofício em organização moderna. Juntas, tais características indicam a chegada da "sociedade das marcas" à academia e à sua principal instituição: a universidade.