25/04/2012

International Higher Education

Princípios para orientar o financiamento público do ensino superior

Arthur M. Hauptman
Consultor de políticas públicas especializado no financiamento do ensino superior. E-mail: Art.Hauptman@yahoo.com
International Higher EducationNos últimos 20 anos, analisando como os recursos públicos são usados no financiamento do ensino superior, trabalhei com representantes dos governos de mais de duas dúzias de países. Embora muitas vezes me perguntem se determinados países ou estados contam com sistemas exemplares de financiamento que possam ser seguidos por outros, não acredito que nenhum país ou estado tenha atingido a excelência em todos os aspectos do uso de recursos públicos para financiar o ensino superior. Mas há princípios que realmente ajudam a definir o melhor emprego dos recursos, pagando tanto pelo apoio às instituições quanto pela assistência financeira aos estudantes e suas famílias. Abaixo serão descritos dez desses princípios.
 
O papel de representantes eleitos
Dado que são os contribuintes que proporcionam o financiamento público do ensino superior, é importante que representantes eleitos sejam responsáveis por determinar a parcela dos recursos públicos que deve ser dedicada às atividades de ensino superior. Esse papel de decidir o volume de recursos não deve ser delegado a burocratas nem outros funcionários não eleitos, pois isso representaria uma quebra das responsabilidades do poder público.
 
O papel preponderantemente institucional
O processo de alocar recursos públicos a instituições deve ser isolado, tanto quanto possível, das influências políticas. Embora os representantes eleitos tenham a responsabilidade de determinar o volume de recursos públicos dedicados ao ensino superior, eles não devem desempenhar um papel importante no processo de determinar como será a distribuição dos recursos públicos às instituições. Essa divisão de responsabilidades leva em conta que as decisões políticas relativas à alocação de recursos costumam ter como base mais o favoritismo do que o mérito. Assim, corpos intermediários que não sejam plenamente governamentais nem totalmente institucionais proporcionam uma lógica para determinar como os recursos serão distribuídos. De maneira parecida, os sistemas das instituições tendem a distribuir os recursos com mais competência do que as agências do governo.
 
Interligando financiamento, taxas e auxílio financeiro
As políticas efetivas que determinam os três componentes do financiamento público – as instituições de financiamento, as taxas de ensino cobradas dos estudantes e o auxílio financeiro aos alunos – costumam concorrer umas com as outras. A forma de financiamento tipicamente proporcionada às instituições, por exemplo, tem o objetivo de melhorar a qualidade, ao passo que as políticas de auxílio aos estudantes tendem a promover uma maior facilidade de acesso ao ensino. As políticas de financiamento podem prejudicar os objetivos umas das outras. Boas estratégias de financiamento deveriam buscar um alinhamento nas metas desses três componentes-chave do financiamento. As políticas de auxílio financeiro, por exemplo, devem ser associadas a decisões relativas às taxas de ensino. Além disso, decisões associadas à distribuição de recursos públicos entre o apoio institucional e o auxílio aos estudantes devem ser tomadas explicitamente no início do processo de financiamento, em vez de permitir que o financiamento do auxílio aos estudantes seja resultado de uma decisão residual, como costuma ocorrer.
 
Fórmulas de financiamento
Essas fórmulas típicas incluem um componente de custo que representa um fator importante na determinação do volume de recursos que cada instituição receberá. A maioria das fórmulas de financiamento emprega o custo real por estudante, em cada instituição, ou o custo médio por estudante, em todo um setor, para calcular esse componente de custo. Mas tal abordagem tende a levar a um crescimento nos custos com o passar do tempo, conforme as instituições que gastam mais por estudante passam a receber mais recursos do governo por causa do gasto elevado. Uma fórmula que empregue custos normativos – o valor que deveria ser o custo de cada estudante em lugar do seu custo real – poderia levar a um custo mais baixo, conforme as instituições recebem mais incentivos para aumentar a eficiência no uso que fazem dos recursos recebidos.
 
Oferta e procura
As políticas administrativas relacionadas às taxas de ensino devem ser moldadas de modo a reconhecer considerações tanto de oferta quanto de procura. A opinião tradicional diz que as taxas de ensino devem ser afixadas num valor muito abaixo dos custos, para estimular a demanda e ampliar ao máximo o acesso ao ensino superior. Mas a realidade é que as taxas baixas podem restringir o acesso ao limitar o volume de recursos dedicado ao setor, reduzindo assim o número de vagas oferecidas a partir de um determinado patamar de financiamento governamental. Além disso, as taxas baixas costumam ser um fator de desigualdade, pois os alunos de renda mais alta que constituem a maior parte dos matriculados acabam sendo os principais beneficiados. Uma política melhor seria definir as taxas a partir de uma parcela da capacidade da população de arcar com essas taxas conforme medida pela renda média familiar ou pelo Produto Interno Bruto per capita. Além disso, a abordagem voltada aos estudantes limitaria os efeitos adversos de um aumento nas taxas, principalmente durante períodos de recessão.
 
Retenção das taxas de ensino pela instituição
Muita atenção é dada à questão de quem seria o responsável por definir o patamar das taxas de ensino no setor público – se seriam representantes de instituição ou funcionários do governo. É muito menor a atenção dedicada à questão da retenção de taxas pela instituição, que em certos casos é obrigada a repassar o valor ao governo para redistribuição como parte da fórmula de financiamento. Mas, sob muitos aspectos, é muito mais importante que as instituições fiquem com o montante das taxas, pois isso representaria um incentivo para a matrícula de um número cada vez maior de alunos. Caso contrário, tenderão a restringir o número de matrículas caso não recebam recursos adicionais por matricular mais estudantes.
 
Regulação governamental de matrículas em instituições públicas
Uma das respostas típicas aos cortes no financiamento público é instituições e/ou governos limitarem matrículas para garantir volume adequado de recursos por estudante. Por mais que a ideia de reduzir o número de vagas possa parecer razoável à primeira vista, ela viola importantes princípios econômicos que preconizam a expansão de matrículas até o ponto em que o custo marginal envolvido no ensino de um número maior de estudantes excede a renda adicional obtida a partir do maior número de alunos. Em vez de limitar o número de vagas, os governos deveriam usar a meta de vagas como o número mínimo de alunos que as instituições teriam de aceitar.
 
Auxílio não reembolsável
A maioria dos países oferece fontes não reembolsáveis de auxílio a uma proporção de seus alunos, como diferentes modalidades de bolsas de estudos. Tais políticas tendem a atender múltiplos propósitos, mas talvez não cumpram as metas propostas. Há também uma tendência a oferecer mais ajuda a um maior número de estudantes para estimular a lealdade política dos estudantes de classe média. Para ser mais eficaz, a ajuda não reembolsável deveria ser concentrada nos estudantes com necessidades financeiras mais expressivas e/ou naqueles que apresentam o melhor desempenho. Uma variação consistiria em definir o volume de auxílio não reembolsável a partir tanto da necessidade quanto do mérito, de modo que os estudantes mais necessitados e mais merecedores recebam a maior parte do auxílio não reembolsável.
 
Crédito estudantil de apoio
Os empréstimos estudantis se tornaram um recurso disponível em muitos países por todo o mundo. Entretanto, poucos programas de crédito funcionam bem ou se mostram eficazes no cumprimento das próprias metas, e muitos apresentam também uma proporção inaceitavelmente alta de inadimplência. Uma forma de melhorar a eficácia do crédito estudantil é restringir seu uso às taxas de ensino e outras despesas, bem como limitar ou eliminar as quantias que podem ser solicitadas para arcar com o custo da moradia. Em países que carecem de recursos ou da tradição cultural de apoio ao crédito estudantil, uma boa alternativa seria aumentar as taxas de ensino para todos e então adiar o aumento nas taxas para os estudantes que não podem arcar com elas.
 
Sólidas políticas de controle
As políticas de financiamento costumam proporcionar poderosos incentivos para os estudantes e funcionários de uma instituição, de modo a maximizar o volume de recursos recebidos. Muitas vezes, tais incentivos podem levar a atalhos em se tratando da qualidade. Sólidos processos de controle são, portanto, necessários para garantir que os recursos públicos sejam aplicados com sabedoria. Essa necessidade torna-se maior quando os governos não controlam as operações das instituições ou quando o auxílio é oferecido aos alunos com base na distribuição de cartas de crédito. Assim, para conter os abusos do mercado, os setores de ensino superior que dependem de instituições privadas costumam ser mais rigorosos no controle de qualidade. Quando as instituições públicas são as principais provedoras de ensino superior, esse controle é menos rígido.
 
Conclusão
Em resumo, sustento que, se os países e estados aderirem aos 10 princípios listados acima, seus sistemas de financiamento serão mais eficazes no cumprimento de importantes metas estabelecidas nas políticas voltadas para o ensino superior.
 
capa da edição impressa nº 5 | abril de 2012