28/08/2012

International Higher Education

Pesquisa, networking e ampliação da capacidade na África

Goolam Mohamedbhai
Mohamedbhai foi secretário-geral da Associação das Universidades Africanas. E-mail: g_t_mobhai@yahoo.co.uk
Para enfrentar os desafios da redução da pobreza e de um desenvolvimento humano sustentável, a África precisa ir além da formação de um número ainda maior de profissionais altamente qualificados. O dever necessário adicional exige a produção e a adaptação de conhecimento relevante para o seu desenvolvimento, principalmente nas áreas de ciência e tecnologia.
 
Mas os indicadores globais de pesquisa apontam claramente o fraco desempenho da África em comparação com outras regiões. A contribuição da África Subsaariana para o gasto mundial em pesquisa e desenvolvimento equivale a não mais do que 0,6%, dos quais uma proporção significativa decorre de um único país – a África do Sul. Da mesma maneira, a África Subsaariana apresenta o mais baixo número de pesquisadores por milhão de habitantes: 79, sendo que América Latina e Caribe, por exemplo, apresentam uma proporção de 442 pesquisadores por milhão. A região produziu também apenas 1,1% das publicações mundiais e 0,1% das patentes globais. Igualmente perturbador é o fato de os indicadores da África Subsaariana terem permanecido estáveis desde 2002, enquanto os indicadores de pesquisa de quase todas as regiões do mundo apresentaram melhora.
 
Estratégia de networking
A promoção da pesquisa deve, portanto, formar uma estratégia essencial para as instituições africanas de ensino superior. Ainda assim, essas instituições enfrentam muitas limitações e desafios – incluindo uma pesada ênfase no ensino, voltado para a massificação; a insuficiência dos programas de pós-graduação; a falta de um corpo docente forte em pesquisas; a carência de laboratórios e equipamentos; e a escassez de recursos.
 
No passado, boa parte da pesquisa nas universidades africanas era realizada mediante a colaboração com universidades de países colonizadores, que financiavam e dirigiam os trabalhos. Assim, as áreas pesquisadas nem sempre incluíam as prioridades africanas. Seus resultados raramente chegavam aos participantes africanos, e a informação raramente era compartilhada com outras universidades africanas. Agora, a maioria dos doadores e agências de financiamento favorece cada vez mais as iniciativas de pesquisa na África que envolvam a colaboração regional e o networking. Essa política produziu a vantagem adicional do compartilhamento dos escassos recursos humanos e financeiros entre os países participantes e da promoção da ampliação da capacidade.
 
Iniciativas de networking
O Consórcio Africano de Economia e Pesquisa, fundado em 1988, é uma rede composta por 27 universidades e 15 institutos e centros nacionais de pesquisa em política econômica. A organização promove a pesquisa colaborativa e o treinamento em economia no nível de pós-graduação, para superar a capacidade limitada das universidades participantes isoladamente consideradas. O consórcio oferece um programa de mestrado praticamente desde a sua fundação; e, a partir de 2002, foi lançado um programa de doutoramento colaborativo envolvendo quatro universidades africanas, com capacidade para 21 candidatos por ano.
 
O Consórcio para o Treinamento Avançado em Pesquisa na África, lançado em 2010 com financiamento da Carnegie Corporation, engloba 9 universidades e 4 institutos de pesquisa na África e parceiros selecionados ao Norte. O objetivo é a promoção do treinamento de doutorado, especialmente em áreas relacionadas à saúde e ao desenvolvimento, e o fortalecimento da infraestrutura e capacidade de pesquisa das instituições africanas, por meio de sociedades e seminários de treinamento.
 
O Fórum Regional de Universidades para a Ampliação da Capacidade em Agricultura, criado em 2004 com sede em Uganda, é um consórcio de 29 universidades do leste, sul e centro da África. O principal objetivo é fomentar a pesquisa e a inovação em resposta à demanda dos agricultores. O consórcio oferece vários programas colaborativos de mestrado e doutorado.
 
O Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico ajudou na criação de cinco Centros de Excelência em toda a África, em áreas que são de relevância direta para a sociedade africana: saúde em Gana, microfinanças no Congo, Direito na Tanzânia, justiça criminal na África do Sul, e logística na Namíbia. Todos ancorados nas principais universidades de seus respectivos países, têm como objetivo promover o estudo e a pesquisa em nível de pós-graduação e o treinamento dos futuros líderes da África. Eles formam redes entre si, incluindo também instituições alemãs relevantes.
 
A Iniciativa Regional para a Ciência e a Educação, financiada pela Carnegie Corporation, tem como objetivo promover a ampliação da capacidade nas universidades subsaarianas. A organização oferece programas de mestrado e doutorado para cientistas e engenheiros por meio de redes de pesquisa e treinamento em determinadas disciplinas alicerçadas nas universidades. A ênfase primária é dada ao preparo de novos membros do corpo docente e ao aprofundamento da qualificação dos membros existentes do corpo docente.
 
A Nova Parceria para o Desenvolvimento Africano criou o Consórcio de Centros de Excelência Hídrica, uma rede de instituições e pesquisadores de diferentes regiões para programas de pós-graduação. O Centro para o Sul da África é coordenado pela Universidade Stellenbosch, África do Sul, e o centro localizado na África Ocidental é coordenado pela Universidade Cheikh Anta Diop, no Senegal.
 
A Universidade Pan-Africana, lançada pela União Africana em dezembro de 2011, é uma nova iniciativa de grandes proporções que facilita a formação de redes no continente para a promoção do treinamento e pesquisa em nível de pós-graduação nas áreas identificadas como prioritárias na África. Vai englobar cinco institutos, um em cada uma das cinco regiões africanas, e cada um deles especializado numa área diferente. Cada instituto vai então formar redes com outras instituições de sua respectiva área. A Universidade de Ibadan, Nigéria, vai receber o Instituto de Ciências da Terra e da Vida; a Universidade de Yaoundé II, Camarões, receberá o Instituto de Governança, Ciências Humanas e Sociais; e a Universidade Jomo Kenyatta de Agricultura e Tecnologia, no Quênia, receberá o Instituto de Ciências Básicas, Tecnologia e Inovação. A Argélia vai receber um Instituto de Ciências da Água e Energia; e a África do Sul terá um Instituto de Ciência Espacial.
 
Desafios
Embora a formação de redes regionais e continentais sem dúvida proporcione muitas vantagens para a promoção da pesquisa, ou seja, para ajudar as instituições africanas a colaborar entre si, tal prática também traz consigo numerosos desafios. Primeiro, as redes devem levar em consideração a vontade “política”, tanto no nível institucional quanto no nacional. Muitas redes bem-sucedidas perderam o ímpeto quando houve mudanças na liderança das instituições participantes ou nos países envolvidos, e mudanças desse tipo são comuns na África. Segundo, as redes invariavelmente incorrem em custos adicionais envolvendo a comunicação, as viagens e os funcionários. É preciso utilizar mais as tecnologias de informação e comunicação para reduzir tais custos. Terceiro, o sucesso da rede depende da gestão eficaz não apenas na unidade de coordenação central como também no nível dos vários elos da corrente, algo que nem sempre é obtido com facilidade. Os funcionários responsáveis pela coordenação em cada elo devem ser cuidadosamente selecionados. Quarto, quase todas as redes africanas são financiadas principalmente por doadores. É vital pensar na sustentabilidade de longo prazo de uma rede, antevendo a possibilidade de os recursos de um doador se esgotarem. Assim, toda rede deve ter como prioridade, desde a sua fundação, o planejamento para a captação de recursos a partir de fontes nacionais, regionais e internacionais.
 
Por fim, a pesquisa na África só poderá florescer se houver um número suficiente de pesquisadores africanos. Os países e universidades do continente devem adotar medidas para criar um ambiente dinâmico capaz de atrair os mais brilhantes jovens africanos e levá-los a optar pela carreira de pesquisadores, constituindo a próxima geração de acadêmicos. A África não pode mais se dar o luxo de perdê-los para a promoção de pesquisas em outros continentes.