10/04/2015

International Higher Education | 78

Idealismo e utilitarismo na internacionalização do ensino superior

Roger Y. Chao Jr
Doutorado em Estudos Internacionais e Asiáticos pela City University of Hong Kong, e atualmente atua como consultor internacional em ensino superior para UNESCO. E-mail: rylimchao@yahoo.com
A internacionalização do ensino superior torna-se cada vez mais uma política diretiva fundamental por todos os estados-nações e regiões, como resultado da crescente interdependência provocada pelos processos paralelos de globalização e regionalização. Desta feita, o ensino superior torna-se cada vez mais uma linha de produção para a competência global e capital humano capacitado, exigido pelo mercado de trabalho, com base em conhecimento global.   
 
A internacionalização do ensino superior tem se tornado um termo abrangente, significando várias (e às vezes sobrepondo-se ou em contradição) ideias e atividades—em particular, mobilidade acadêmica e estudantil, colaboração à pesquisa internacional, ensino transnacional ou a oferta de educação transfronteiras, que oferece programas em língua inglesa e usa currículo e livros didáticos internacionais. O estabelecimento do mercado de ensino superior global, os desafios financeiros das instituições de ensino superior, conceptualização do ensino superior como um bem privado, além da demanda crescente e massificação do ensino superior têm todos juntos incentivados seu utilitarismo.
 
Tais desenvolvimentos acontecem dentro de uma ordem mundial em mudança que tem reformulado o relacionamento entre os estados – nações e seus respectivos sistemas de ensino superior estabeleceram estruturas de governança supranacionais / transnacionais, e facilitou a diversidade na prestação de serviços públicos, incluindo o ensino superior. Este artigo ressalta os dois extremos, idealismo e utilitarismo da internacionalização do ensino superior dentro de uma ordem mundial em mutação, a fim de fornecer as bases para a compreensão, seus múltiplos sentidos e funções. 
 
A ordem mundial em mutação
O fim da Segunda Guerra Mundial presenciou uma rápida transformação da ordem mundial, incluindo iniciativas globais e regionais de construção da paz, bem como o estabelecimento de novos estados – nações e regiões. A maioria dos silos entre os estados – nações desapareceram, tendo sido substituídos pela interdependência crescente entre os estados – nações, o estabelecimento de regiões e suas respectivas instituições regionais. Como tal, a ordem mundial muda cada vez mais para um mundo de regiões e continuará evoluindo para uma outra forma no futuro. Esta reorientação da ordem mundial tem sido possível com o avanço da informação e tecnologia das comunicações (ICT), o advento de viagem baratas, o fim da guerra fria, a crescente interdependência econômica e política, e os desafios demográficos do mundo desenvolvido. O desenvolvimento do bônus demográfico da Ásia não apenas supri capital humano para o mundo como também serve como o principal mercado para o ensino superior internacional. 
 
Esta ordem mundial em mutação tem impactado o ensino superior, transformado o ambiente do mesmo e mudado o sentido e a natureza da internacionalização. Desse modo, o ensino superior tem agora se tornado um instrumento de política para suportar o desenvolvimento econômico sustentável. A corrida global por talento enfoca os estudantes como futuros operários, ao invés de cidadãos de estados – nações, regiões e do mundo. Tais desenvolvimentos tem levado o ensino superior a ser visto como um bem privado. Sua massificação, diminuição do financiamento do setor público, e iniciativas multilaterais têm redefinido a educação como uma mercadoria comerciável e estabelecido o mercado do ensino superior global. 
 
Mudança e múltiplos significados da internacionalização
A ordem mundial em mutação e o estabelecimento do mercado do ensino superior global têm determinado o tom para a mudança, os múltiplos significados e a natureza da internacionalização do ensino superior. O avanço da informação e tecnologia das comunicações (ICT) reduziram as barreiras comerciais, e aumentaram a abertura da mobilidade de trabalho devido aos desafios demográficos e a escassez de mão de obra competente e habilitada em estados – nações desenvolvidas e também representam um papel no sentido de promover a função utilitária da internacionalização do ensino superior.
 
A despeito da natureza internacional da universidade, a internacionalização do ensino superior é um fenômeno recente das décadas de 1980 e 1990, em que o enfoque era dado às lógicas políticas e sociais. A mudança da ordem mundial, contudo, tem impactado grandemente o significado e natureza da internacionalização do ensino superior, com os últimos 25 anos mais focados em lógicas de caráter econômico. Além da preparação de capital humano competente globalmente, ela tem se tornado uma empreitada comercial com seu potencial de ajudar a financiar instituições do ensino superior, servir como um portal de imigração e um mecanismo de filtragem para os estados-nações anfitriãs. 
 
O trabalho global e a mobilidade estudantil, contudo, tem se desviado cada vez mais da dinâmica tradicional Sul-Norte para um envolvimento Sul-Sul e, em extensão menor, (e primariamente, com relação à mobilidade do crédito) uma direção Norte – Sul, devido à cadeia de produção global, outsourcing da produção e vários outros processos, e o advento de corporação multinacional. Programas transfronteiras e transnacionais têm sido estabelecidos em parte devido aos desafios de financiamento das instituições de ensino superior no Hemisfério Norte, mas também devido à demanda crescente de ensino superior em economias emergentes, particularmente na Ásia e no Oriente Médio. 
 
A soberania dos Estados-nação sobre o ensino superior tem cada vez mais sido desafiada à medida em suas respectivas instituições de ensino superior e sistemas abraçam a internacionalização ao introduzirem “programas em língua inglesa” e currículo, empreendendo programas em conjunto e convidando instituições de ensino superior estrangeiras para seus territórios e sistemas de ensino superior nacionais. Isso aumenta a comercialização e o enfoque crescente da internacionalização do utilitarismo do ensino superior.
 
Idealismo e utilitarismo
O setor do ensino superior, contudo, não está limitado a sua função utilitária de produzir capital humano para o desenvolvimento econômico regional e nacional. Os papeis tradicionais das universidades como torres de marfim para o desenvolvimento social, produção de conhecimento, e eventualmente, moldar os cidadãos globais e os futuros líderes mundiais, simplesmente entram em conflito com esta função utilitária. Na verdade, o envolvimento cívico, a abordagem dos problemas sociais globais e objetivos do milênio devem ser incorporados nas missões centrais das universidades.
 
“A internacionalização do ensino superior possui logicas políticas, socioeconômicas, culturais e acadêmicas, e é simultaneamente um processo descendente” e "ascendente" Além disso, a internacionalização ocorre dentro e fora dos sistemas de ensino superior nacionais. Como tal, ele vai além do enfoque crescente e aparentemente institucionalizado na faculdade internacional e mobilidade estudantil, educação transfronteiras e transnacional e colaboração com a pesquisa. A internacionalização do ensino superior deveria incorporar um diálogo permanente e negociação do conhecimento global regional e nacional, habilidades e requisites de competências e necessidades regionais, nacionais e globais dentro de uma ordem mundial em mutação. 
 
Idealmente, a internacionalização do ensino superior não deveria levar em consideração apenas uma ordem mundial em mutação e sua lógica econômica, mas também as logicas politicas, culturais, e acadêmicas, que inclui a identificação da formação, melhorias sociais e o desenvolvimento de cidadãos globais. À medida em que a crescente ordem mundial interdependente necessitar, o currículo do ensino superior precisa ser internacionalizado, mas não ao ponto de reduzir o conhecimento local e a cultura em um padrão internacional homogêneo. A diversidade por regiões e estados – nação requer a internacionalização de cima e de baixo para moldar cidadãos globais que são culturalmente adeptos e competentes para contribuir para os vários e grandes desafios da ordem mundial em mutação, tais como os direitos humanos, a amenização da pobreza, proteção ambiental e desenvolvimento sustentável.
 
O idealismo e utilitarismo estão presentes na internacionalização do ensino superior em todo mundo. A internacionalização do ensino superior, seus significados e funções, na verdade representam a combinação de idealismo e utilitarismo que diferem com base no desenvolvimento político, socioeconômico, cultural e histórico de um estado – nação ou região. Apesar da pressão de cima para baixo provocada pela globalização e regionalização, as pressões de baixo para cima localizadas dentro dos estados – nações influenciam em como a internacionalização do ensino superior é definida e utilizada.
 
A internacionalização do ensino superior deveria ser vista holisticamente com suas múltiplas dimensões (incluindo as dimensões politicas, socioeconômicas, culturais, e acadêmicas), vários níveis (global, regional e nacional), e dentro de processos de globalização e regionalização. Cada bloco desta matriz ofereceria significados levemente diferentes e funções da internacionalização do ensino superior, porem cairia dentro dos dois extremos do idealismo e utilitarismo.
 
Este texto foi traduzido e revisado sob a coordenação de
Sergio Azevedo Pereira
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