28/08/2012

International Higher Education

Ensino internacional na Austrália: altos e baixos

Simon Marginson
Marginson é professor do Ensino Superior da Universidade de Melbourne, Austrália. Seu livro mais recente é Ideas for Intercultural Education (Nova York: editora Palgrave Macmillan, 2011), publicado em parceria com Erlenawati Sawir. E-mail: s.marginson@unimelb.edu.au
O ensino internacional é um setor de grande importância na Austrália. Quase 30% de todos os alunos de ensino superior no país são estrangeiros. O valor pago por eles pelo ensino – a Austrália oferece poucas bolsas e quase todos os estudantes vindos de fora pagam as taxas integrais – representou 18% de toda a renda das universidades em 2010. A Austrália se tornou um exemplo de como ganhar dinheiro com o fluxo de estudantes internacionais. O país mostra-se menos eficaz no envio de seus próprios estudantes para o exterior e no estabelecimento de um relacionamento mais amplo na pesquisa e no ensino com os países asiáticos que mandam ao país quatro quintos dos alunos estrangeiros recebidos.
 
O ensino internacional é o terceiro ou quarto principal artigo de exportação do país, perdendo para carvão e minério de ferro, e às vezes para ouro, dependendo da flutuação das cotações. Trata-se de uma indústria que emprega 125 mil pessoas, e que tornou-se fonte vital de migrantes altamente qualificados. A migração é o destino de mais de um terço de todos os formados.
 
O declínio
Durante duas décadas, o número de estudantes internacionais teve um crescimento quase ininterrupto, passando de 30 mil estudantes em todos os setores do ensino em 1990 para 630.700 em 2009, um extraordinário aumento anual médio de 17%. A Austrália, com menos de 23 milhões de pessoas, recebe 7% de todos os estudantes estrangeiros do ensino terciário. Mas, nos últimos três anos, as políticas e regulações do governo – sem dizer a reputação da Austrália na Índia e a posição do país em relação aos agentes de ensino na China – têm criado um padrão de altos e baixos. Em 2011 o número de estudantes foi 557.425, ou 12% inferior ao nível de 2009.
 
Em 2011, o International Higher Education (nº 62) apresentou os fatores que levaram ao declínio no número de estudantes internacionais solicitantes, de vistos concedidos e de matrículas. Entre 2009 e 2011 o número de alunos no ensino vocacional caiu 18% e as faculdades de especialização de língua inglesa tiveram queda de 31% na procura. O número de matrículas no ensino superior aumentou um pouco em 2010, mas estagnou entre 2010 e 2011, e as inscrições para 2012 pareciam abaixo do esperado.
 
Os problemas começaram na Índia, país que funciona como a segunda maior fonte de estudantes da Austrália. Em 2009, as autoridades australianas foram lentas na repressão a incidentes violentos contra estudantes sul-asiáticos e foram criticadas pela mídia indiana. As mesmas autoridades foram muito mais ágeis no combate a uma pequena indústria que trazia imigrantes ilegais usando vistos de estudante, por meio de um conluio entre agentes na Índia e faculdades particulares na Austrália. As faculdades que pouco ofereciam em termos de treinamento legítimo foram fechadas. Mas isso significou a perda de um número ainda maior de estudantes indianos. Ao mesmo tempo, o governo estabeleceu exames rigorosos de trabalho e idioma, regulando a transição do estudante de graduação ao status de morador permanente. A Austrália perdeu ainda mais solicitantes indianos.
 
Resistência à migração
Em 2010, ano eleitoral, a resistência à migração foi evidente. O governo reduziu as metas de migração. Isso teve impacto no ensino internacional porque a migração de curto prazo associada ao ensino faz parte dos números oficiais (o mesmo problema afeta o ensino internacional na Grã-Bretanha, outro país que reduziu a migração). Isso levou a uma abordagem mais restritiva dos vistos estudantis, com atrasos mais longos e exames rigorosos para a concessão de apoio financeiro.
 
O problema foi agravado pela desvalorização da moeda americana, que colocou o dólar australiano acima da paridade pela primeira vez em décadas, tornando o ensino internacional australiano mais caro em termos relativos. A China proporciona um quarto dos estudantes internacionais na Austrália; e os agentes de ensino, que controlam a maior parte do fluxo de estudantes vindos do país, transferiram boa parte desse tráfego da Austrália para os Estados Unidos e o Canadá. As solicitações chinesas de entrada na Austrália caíram muito. O número de estudantes chineses nos EUA atingiu níveis recordes.
 
Com a chamada “indústria” australiana do ensino apresentando tendências decrescentes em todos os indicadores, com previsão de quedas de 40% a 50% ainda por vir, o governo federal foi obrigado a aumentar o financiamento público para resgatar as universidades. Foi criada uma comissão presidida por Michael Knight – ex-político e principal administrador da Olimpíada de Sydney – para investigar a política de concessão de vistos estudantis.
 
As recomendações da comissão Knight foram adotadas integralmente pelo governo em setembro de 2011. Constituíram uma dramática virada nas políticas e no retorno da alta migração. O processamento de vistos estudantis foi acelerado. As solicitações de matrículas em universidades vindas de todos os países foram designadas à categoria de baixo risco, sem exigir nenhum exame financeiro e com a condição de que as universidades seriam agora responsáveis pela integridade de seus estudantes. Exames de inglês foram facilitados para a admissão em faculdades de especialização de língua inglesa. Os formandos recebiam vistos temporários de trabalho de dois a quatro anos, proporcionando oportunidades melhores para a obtenção de renda e experiência de trabalho, ambas úteis na solicitação do status de migrante.
 
Subindo outra vez?
As mudanças atribuídas a Knight não foram imediatamente estendidas ao setor de treinamento, mas isso deve ocorrer. Entretanto, o impacto de longo prazo da inversão ainda é incerto. É provável que o agudo declínio no mercado tenha sido interrompido, mas as tendências iniciadas em 2009-2010 seguem em curso, o dólar australiano continua valorizado e a transferência de estudantes chineses da Austrália para os EUA continua.
 
Nos últimos seis meses de 2011, dos quais metade foi influenciada pelas mudanças da comissão Knight, o número de novos vistos solicitados pela China para todos os setores de ensino na Austrália apresentaram queda de 21%, comparado ao mesmo período de 2010. As solicitações da Índia, que caíram muito em 2010, aumentaram 78% em 2011. Houve um declínio de 13% nas solicitações do Vietnã e da Malásia. Informes preliminares do número de matrículas universitárias em 2012 indicam um padrão misto de aumentos e quedas.
 
A Austrália continua excessivamente dependente da demanda internacional pelo ensino superior pago. O rendimento ainda é alto pelos padrões mundiais, mas cada dólar é gasto para bancar atividades locais de ensino e pesquisa e custos administrativos – e não em um envolvimento de duas mãos, mais rico. Isso decorre de duas décadas de redução no financiamento por parte do governo federal. Há aqui uma lição para os governos de outros países que estão cortando o financiamento público. Não é razoável esperar que estudantes internacionais proporcionem o financiamento principal do sistema. Isso limita o potencial de um ensino cosmopolita que beneficiaria a todos.