26/08/2013

International Higher Education

Desafio indiano é conseguir resultados com seu investimento no ensino superior

No caso da Índia, gasto não significa necessariamente eficácia. Nesse sentido, o ensino superior indiano é comparável ao sistema de saúde americano

Philip G. Altbach e Pawan Agarwal
Altbach é professor da Cátedra Monan e diretor do CIHE-Boston College. E-mail: Altbach@bc.edu. Agarwal é conselheiro da Comissão de Planejamento do Governo da Índia para o ensino superior. E-mail: apawano8@gmail.com
Embora o ensino superior indiano sofra de muitas disfuncionalidades e o sistema como um todo seja caracterizado por "ápices de excelência num oceano de mediocridade", numa comparação internacional a Índia apresenta um resultado relativamente bom. Eis aqui alguns exemplos:
 
1. A Índia é líder global em termos de PIB gasto por fontes públicas e privadas no ensino superior. O país dedica uma proporção bastante alta de sua riqueza nacional ao ensino superior. Na marca dos 3% do PIB (1,2% proveniente de fontes públicas e 1,8% de fontes privadas), a Índia gasta com o ensino superior mais do que os Estados Unidos (1% público e 1,6% privado) e a Coreia do Sul (0,7% público e 1,9% privado). Isso indica um horizonte limitado para aumentos adicionais, embora sejam necessários mais recursos já que, em números absolutos, o investimento no ensino superior não seja comparável ao dos lideres em termos internacionais. Além disso, há uma necessidade urgente de usar os recursos de maneira eficiente e efetiva para a promoção da participação e da excelência.
 
2. A proporção bruta de matrículas da Índia, 18%, representando a proporção do grupo etário com acesso ao ensino superior, está entre os mais altos para os países com o mesmo nível de desenvolvimento observado na Índia. Isso é particularmente impressionante se levarmos em consideração o tamanho e a complexidade do país. O 12º plano quinquenal, recém-aprovado, tem como objetivo aumentar a proporção bruta de matrículas para 25% até 2017, meta que é ao mesmo tempo desejável e possível.
 
3. Por fim, se medidos em relação aos de países comparáveis em termos de paridade de poder de compra, os salários acadêmicos são bastante bons. Entre os 28 países analisados num estudo recente, a Índia ficou com o quarto lugar entre os melhores salários iniciais para acadêmicos – destacando-se como o melhor dentre os países conhecidos como BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China). A China mostrou oferecer uma das piores médias salariais. Esse ótimo posicionamento é resultado do grande aumento na remuneração implementado em 2006.
 
Retorno do investimento?
Será que a Índia está obtendo um retorno sobre seu investimento no ensino superior? Além disso, será que a resposta aos desafios é mais dinheiro? A maioria dos observadores concordaria que, em média, as faculdades e universidades indianas não produzem um trabalho de grande distinção e, definitivamente, não têm "nível mundial". Uma série de fatores estão relacionados às tendências positivas observadas aqui. Embora a Índia invista somas consideráveis no ensino pós-secundário, com tais recursos vindo cada vez mais dos estudantes e de suas famílias, tal gasto não é feito de maneira eficaz. Há pouca coordenação entre os estados e o governo central.
 
Muitas das 34 mil faculdades de graduação da Índia são pequenas demais para serem consideradas viáveis. Em geral carecem de funcionários em número suficiente e de equipamentos adequados; dois terços delas não satisfazem nem mesmo às normas mínimas estabelecidas pelo governo, e são incapazes de inovar por causa da rígida burocracia do sistema de filiação que liga faculdades à uma universidade supervisora. Tudo isso torna o sistema extremamente fragmentado, difuso e difícil de administrar. Seriam muitos os ganhos com a consolidação e a fusão das instituições menores. Mas o sistema de filiação é vasto e tem raízes profundas, sendo portanto indesejável e nada prático o seu desmantelamento.
 
Entretanto, a descentralização de parte do currículo parece bastante promissora. Com maior autonomia acadêmica, os cursos principais poderiam ser mantidos pela universidade, enquanto a responsabilidade pelo restante do currículo poderia ser entregue às faculdades. Isso criaria nas faculdades uma desejável cultura de inovação. O agrupamento e até a fusão de faculdades muito pequenas também teria que constar nessa reforma. Além disso, as universidades que fossem supervisores de um grande número de faculdades teriam de ser organizadas em duas ou mais universidades, com cada uma delas vinculada a um grupo menor de faculdades – para com isso melhorar a eficiência acadêmica geral.
 
Embora as proporções brutas de matrícula da Índia não sejam ruins de acordo com os padrões internacionais relevantes, estão ainda assim quatro décadas atrás da maioria dos países avançados em se tratando de matrículas. Enquanto os EUA tinham uma proporção de matrículas de 15% já nos anos 1940, a maioria dos países avançados atingiu esse estágio várias décadas mais tarde. Grã-Bretanha, Austrália, França e Japão tinham proporções de matrícula de 18%, 23%, 24% e 25% em 1975; e a Coreia do Sul tinha apenas 8% matriculados em 1975, proporção que aumentou para 13% em 1980 e, rapidamente, para 34% em 1985.
 
Todos esses países chegaram a um sistema próximo do ensino superior universal; mas é preciso reconhecer que as matrículas cresceram ao lado da demanda por trabalhadores qualificados, com a agricultura correspondendo a menos de 5% da força de trabalho. Levando-se em consideração que metade da população da Índia ainda trabalha no campo com necessidade limitada de qualificações melhores, os níveis atuais de matrículas na Índia parecem adequados. O maior desafio está no fato de os estudantes não escolherem as áreas que mais contribuem para o crescimento econômico – nem para sua perspectiva de encontrar emprego. Além disso, os empregadores se queixam regularmente da inadequação dos pós-graduandos para as vagas disponíveis.
 
Embora seja verdade que, numa comparação internacional, os acadêmicos indianos sejam relativamente bem pagos, eles não são necessariamente os mais eficazes. Os acadêmicos e principalmente os professores universitários são limitados pela rigidez da burocracia. Além disso, seu trabalho não é cuidadosamente avaliado – aumentos salariais e promoções são concedidos com base principalmente no tempo de serviço. Infelizmente, quando os salários foram aumentados em 2006, isso não foi acompanhado por reformas na profissão de professor nem nos requisitos de avaliação. Um Sistema de Indicadores de Desempenho Acadêmico para a promoção e nomeação de professores ainda não firmou suas raízes. Parece que os acadêmicos indianos querem fazer um bom trabalho e a maioria deles está comprometida com a profissão – impedimentos estruturais e uma cultura ossificada são os empecilhos.
 
Nossa impressão geral é a de que apesar das muitas áreas nas quais a Índia é favoravelmente comparada aos demais países, profundos impedimentos culturais e estruturais limitam o sistema acadêmico como um todo, privando-o de um desempenho mais eficaz.
 
Conclusão
A Índia atingiu marcos importantes em algumas áreas do ensino superior. O desafio está em aproveitar esses planos e reformar um sistema fossilizado. No caso indiano, gasto não significa necessariamente eficácia. Nesse sentido, o ensino superior da Índia pode ser comparado ao sistema de saúde americano. Os EUA têm o maior gasto per capita com o sistema de saúde, mas esse volume de investimento não produz resultados. As reformas de Obama, como o 12º plano quinquenal na Índia, podem finalmente melhorar um sistema ossificado, tradicionalmente dominado por interesses especiais e conflitos entre o governo federal e os estados. O 12º plano aprovado recentemente proporciona bons moldes para uma mudança. Busca alinhar o investimento do governo central com aquele dos governos estaduais – alinhar novas capacidades à demanda. Busca também criar uma cultura de desempenho por meio do aprofundamento da concessão de recursos aos solicitantes mais competitivos e o estabelecimento de arranjos institucionais a ela relacionados. Entretanto, seu sucesso depende da eficácia de sua implementação.