08/10/2013

Educação e crime

Avaliação de credenciais acadêmicas está sob ataque de fábricas de diplomas

Rápidas mudanças no ensino superior internacional complicam o processo de decisão em se tratando da transferência de créditos

George D. Gollin
Gollin é professor de física da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign. E-mail: g-gollin@illinois.edu
Um ano após começar a trabalhar como médico na África, o jovem parecia procurar emprego na Grécia. Pediu a um serviço de avaliação de credenciais que atestasse a legitimidade do seu diploma de medicina, enviando ao seu novo país de residência (Grécia) um relatório com suas conclusões. O serviço prometia "avaliações justas e honestas" e afirmava "combater fraudes em diplomas usando técnicas e verificações profissionais". O resultado determinou "que os estudos do solicitante têm equivalência com um diploma de Doutor de Medicina... emitido por uma Instituição de Ensino Superior credenciada regionalmente nos Estados Unidos".
 
O relatório deixou de mencionar que o proprietário da firma de avaliação de credenciais era ele mesmo um perpetrador de fraudes envolvendo diplomas, recebendo uma multa de 15 mil euros por operar uma "fábrica de diplomas" na Europa. As fraudes com diplomas médicos vinham de uma usina de diplomas paquistanesa, que certa vez tentou me vender um diploma de doutor em cirurgia torácica. Entretanto, sou físico, e não médico.
 
Outro serviço de avaliação de credenciais era pago pelos proprietários de uma fábrica de diplomas norte-americana para fingir que operavam uma faculdade africana, e não um empreendimento criminoso com sede nos EUA. Um terceiro empregava um indivíduo de má índole que era "vice-presidente" e "diretor de estudos" de um par de fábricas de diplomas.
 
Há muitos serviços legítimos de avaliação de credenciais no panorama do ensino superior, mas há também numerosas serpentes escondidas no mato.
 
Infelizmente, não há nos EUA uma supervisão regulatória para as centenas de serviços de avaliação de credenciais estrangeiras Serviços de avaliação de credenciais estrangeiras
As rápidas mudanças no ensino superior internacional complicam o processo de decisão em se tratando da transferência de créditos quando os estudantes cruzam as fronteiras nacionais. Como é caro manter um serviço interno de avaliação de programas internacionais, é natural que universidades e empregadores busquem a análise de especialistas de fora – como a International Education Services, uma divisão da American Association of Collegiate Registrars and Admissions Officers (AACRAO), ou a National Association of Credential Evaluation Services (NACES). Membros das Redes ENIC-NARIC (ENIC: European Network of Information Centers in the European Region; NARIC: National Academic Recognition Information Centers in the European Union) também oferecem serviços confiáveis de avaliação de credenciais.
 
Infelizmente, não há nos EUA uma supervisão regulatória para as centenas de serviços de avaliação de credenciais estrangeiras. Até a inscrição de um avaliador numa associação profissional é às vezes obscura: em 2009, um avaliador de credenciais que tinha trabalhado com a conhecida "Universidade St. Regis" convidou avaliadores legítimos para se juntarem a uma espelunca de reconhecimentos de nome pomposo cujo objetivo seria "ajudar as agências independentes menores a se unir e receber mais aceitação". A maioria das entidades já relacionadas entre os membros colaborava com notórias usinas de títulos. E a NAFSA, a respeitada Associação de Educadores Internacionais, alerta que ser seu membro "não implica que a NAFSA tenha avaliado ou patrocinado seus programas ou atividades, e pertencer à NAFSA não significa que a associação patrocine as atividades de seus membros". Os membros da NACES precisam atender a certos critérios, mas somente 21 avaliadores são atualmente listados pela organização como membros.
 
Como um RH pode notar a diferença entre o e Foreign Credentials Service of America e a agência falsa, que plagiou muitos aspectos da FCSA e fechou suas portas abruptamente quando seus proprietários foram acusados de fraude financeira e contra os correios um ano mais tarde?
 
Carência de informações facilita o engodo
Pode ser surpreendentemente difícil encontrar boas informações a respeito da autoridade de concessão de diplomas de uma faculdade. Às vezes há sutilezas: nos EUA, o Council for Higher
Education Accreditation (CHEA) mantém um banco de dados preciso de cursos e universidades credenciados, mas a autoridade para a concessão de diplomas nos EUA reside nos estados, e não no governo federal. Faculdades legítimas que não buscam o credenciamento não constam no banco de dados do CHEA.
 
Às vezes as informações a respeito das universidades de um país são incompletas, não estão disponíveis ou não são dignas de confiança. Após o fim da guerra civil na Libéria, a única lista de universidades reconhecidas do país estava no site da Embaixada da Libéria nos Estados Unidos. Mas o chefe da embaixada e o vice-chefe de missão recebiam propinas de uma fábrica americana de diplomas e tinham concedido a ela o controle do site. A lista de faculdades "reconhecidas" incluía suas fábricas de diplomas, até um novo embaixador expulsar os criminosos. O Portal de Instituições do Ensino Superior Reconhecidas da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) está incompleto – apenas três países africanos são listados – enquanto o Banco de Dados do Ensino Global, mais extenso e administrado pela AACRAO, exige uma assinatura paga.
 
Na minha experiência, a maioria das avaliações fraudulentas prejudicam a autoridade de conceder diplomas da instituição que os emite. A ausência de um banco de dados universal de fácil acesso para a faculdades reconhecidas permite que avaliadores corruptos vendam seus serviços aos clientes das fábricas de diplomas.
 
Às vezes os avaliadores desonestos de credenciais oferecem representações grosseiramente equivocadas de suas comparações envolvendo programas acadêmicos legítimos de diferentes países. Um exemplo é a análise dos diplomas concedidos por um país após três anos de estudos: ao não serem considerados equivalentes aos diplomas americanos de bacharelado, muitos denunciaram a existência de um preconceito racial em vez de avaliar cuidadosamente os programas acadêmicos em questão. Os autores – que eram sabidamente ligados a fábricas de diplomas – chegaram a conclusões que sem dúvida atrairiam fregueses em busca de avaliações exageradas de suas credenciais.
 
Disseminação de informações num mundo litigioso
A documentação das identidades e práticas daqueles que fraudam o ensino superior, divulgada ao público e indexada no Google, com informações precisas, pode ser devastadora para a indústria das fábricas de diplomas. A renda mensal da St. Regis caiu num ritmo constante entre dezembro de 2004 (US$ 250.000) e agosto de 2005 (poucos milhares de dólares), graças a uma mistura de cobertura midiática hostil e análises nada elogiosas publicadas na internet. A denúncia das práticas enganosas dos avaliadores desonestos de credenciais pode ser também uma ferramenta eficaz para a sua supressão.
 
Um possível repositório de documentação seria uma agência do governo, que receberia informações confiáveis de profissionais do ensino superior (incluindo avaliações favoráveis dos títulos concedidos pelas fábricas de diplomas) e as publicaria em seguida. Mas a revelação de informações desse tipo traz riscos para aqueles que as denunciam, que vão de processos a ameaças de retaliação violenta. Durante anos, o estado de Oregon publicou uma lista útil (mas incompleta) das fábricas de diplomas. O estado era regularmente ameaçado com medidas legais por parte dos operadores e fregueses das fábricas de diplomas e, finalmente, removeu o material da internet.
 
Levando-se em consideração a natureza internacional do setor ilegítimo, que oferece credenciais acadêmicas falsas, seria produtivo que a Unesco assumisse a responsabilidade de manter um arquivo de informações. Mas isso exigiria um comprometimento de recursos e força de vontade que não parece estar nos horizontes da instituição.