06/11/2012

International Higher Education

A ascensão das economias do conhecimento pós-confucianas

Simon Marginson
Marginson é professor da Universidade de Melbourne, Austrália. Entre seus mais recentes livros está Higher Education in the Asia Pacific: Strategic Responses to Globalization (Springer, 2011) editado em parceria com Sarjit Kaur e Erlenawati Sawir. E-mail: s.marginson@unimelb.edu.au
As universidades e a pesquisa no Leste Asiático e em Cingapura passaram por uma transformação completa nos últimos 15 anos. Se forem mantidas as tendências atuais, estes sistemas de ensino superior estão se encaminhando para dividir com as instituições dos países anglófonos e da Europa Ocidental a posição de liderança global.
 
Há muita retórica envolvendo a ascensão das economias do conhecimento na Ásia – parte dela elogiosa e (em determinadas regiões) também algo amedrontada, mas nem todos os comentários feitos refletem a situação real. O ensino e a pesquisa fora do Leste Asiático – incluindo a Índia e o Sudeste Asiático – estão muito atrás do progresso do Leste Asiático e de Cingapura no estágio atual. O progresso ocorre, e há bolsões de verdadeira força – como no caso da pesquisa na Tailândia e nas universidades particulares da Malásia, bastante convidativas.
 
Independentemente disso, é na China, em Hong Kong, Taiwan, na Coreia do Sul e Cingapura que a verdadeira transformação global está ocorrendo. Estes sistemas estão se somando ao Japão, que manteve um complexo de ponta na ciência e na engenharia por mais de três décadas, apresentando uma elevada participação e ocupando a segunda posição entre os países que mais investiam em pesquisa e desenvolvimento, até ser superado recentemente pela China.
 
Líderes em pesquisa
O impulso apresentado pelas economias do conhecimento no Leste Asiático tem como base o recorde nos dados envolvendo desempenho na pesquisa e participação no ensino. Recentemente, concluí uma comparação – financiada pelo Conselho Australiano de Pesquisa, com 16 estudos de caso em 15 sistemas diferentes de ensino superior na Ásia e no Pacífico – dos elos globais e da capacidade das principais universidades de pesquisa.
 
Entre as universidades incluídas no estudo de caso estão a Universidade de Tóquio, no Japão, a Universidade Nacional de Seul, na Coreia do Sul, as Universidades Jiao Tong de Pequim e Xangai, na China, a Universidade Nacional de Taiwan, a Universidade de Hong Kong e a Universidade Nacional de Cingapura. Cada uma delas já desempenha um importante papel global, tendo diante de si um grande futuro.
 
A Universidade de Tóquio produz um volume de estudos científicos comparável ao de qualquer universidade americana – exceto Harvard. A Universidade de Pequim (Beida) fica no coração da China, e a Universidade Jiao Tong de Xangai produz o terceiro maior volume de pesquisas na China, superada pelas Universidades Zhejiang e Tsinghua. Em vários indicadores, a Universidade Nacional de Taiwan é atualmente a universidade chinesa de melhor desempenho. A Universidade Nacional de Cingapura é sinônimo de eficiência em estratégias e parcerias globais. A Universidade de Hong Kong é a maior das cinco universidades da Região Administrativa Especial de Hong Kong, apresentando impressionantes credenciais de pesquisa. A Universidade Nacional de Seul é a quinta universidade no ranking de ex-alunos que desempenham cargos de direção executiva no índice Fortune 500 de empresas americanas.
 
Pós-confucianas
É significativo o fato de, apesar do grande número de diferenças entre eles, todos esses sistemas terem suas raízes culturais na China. O sistema de Cingapura, o mais distante entre eles, no Sudeste Asiático, apresenta uma composição cultural plural, mas a influência chinesa é forte. Todos eles foram moldados pelo profundo compromisso confuciano com a educação na família, algo que está subjacente na qualidade do ensino, garantindo que os avanços na participação sejam acompanhados por avanços no aprendizado dos estudantes. Estes países lideram o mundo no levantamento feito pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) envolvendo os resultados do ensino entre os alunos de 15 anos – o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).
 
Todos eles, sejam Estados de partido único ou sistemas políticos plurais – como a Coreia do Sul, o Japão e Taiwan –, são beneficiados por eficazes e poderosas máquinas estatais que investem pesadamente no ensino e na capacidade de pesquisa, direcionando tal investimento para o cumprimento de metas e acompanhando sua implementação para garantir que tais metas sejam atingidas. Somente no Japão, onde o dinamismo anterior perdeu seu vigor, observou-se uma queda no investimento. Os sistemas pós-confucianos de ensino superior são uma notável combinação entre tradição duradoura e ciência ocidental. Estão trazendo uma nova forma híbrida de modernidade Oriental-Ocidental.
 
No Leste Asiático e em Cingapura o ensino superior está avançando rapidamente em três frentes simultâneas: a proporção geral de participação no ensino terciário – que já supera os 85% em Taiwan e na Coreia do Sul –, a qualidade das universidades de ponta e o rápido crescimento observado na pesquisa e no desenvolvimento, dentro de uma carga tributária e de um gasto público considerados baixos para os padrões mundiais. Tal feito tem como base o crescimento econômico. Com exceção da China, todos estes países atingiram níveis de riqueza comparáveis aos da Europa Ocidental. De acordo com o Banco Mundial, em 2010 o Produto Nacional Bruto (PIB após dedução de renda líquida enviada ou recebida do exterior) per capita foi de US$ 29.010 na Coreia do Sul, US$ 47.130 em Hong Kong e US$ 55.380 em Cingapura. No Japão, esta renda foi de US$ 34.780.
 
Ascensão da China
Na China a renda nacional bruta per capita foi de apenas US$ 7.570, mas essa soma dobrou em cinco anos; e, em meio a grandes desigualdades, Pequim, Xangai e partes do Leste da China são muito mais ricas. Planeja-se que a participação no ensino terciário chegue a 40% já em 2020. Em 1990 a participação foi de apenas 5%. Mas as diferenças regionais são um problema persistente.
 
A China planeja aumentar o gasto com pesquisa e desenvolvimento para 2,5% do PIB em 2010. O gasto com pesquisa já equivale a 40% do nível investido nos Estados Unidos. Na década passada o número de estudos científicos publicados aumentou à razão de 17% ao ano.
 
A trajetória chinesa nas pesquisas não está livre de problemas. É verdade que uma parcela demasiadamente grande das pesquisas é realizada nos empreendimentos do Estado e não nas universidades. Há problemas de interferência burocrática nas decisões envolvendo bolsas de pesquisa, e o acalorado debate dentro das universidades chinesas não encontra paralelo numa discussão livre entre a sociedade civil. O número de publicações chinesas ainda não é acompanhado por um desempenho comparável em estudos amplamente citados.
 
Mas a produção de pesquisa na China tem crescido a um ritmo acelerado e, em determinados setores – como química, engenharia e materiais – a China claramente está entre os líderes globais. Física e matemática também são setores fortes, como ocorre em outras partes do Leste Asiático. As ciências biológicas e a medicina são menos desenvolvidas.
 
No geral, as universidades de pesquisa do Leste Asiático ainda têm um longo caminho a percorrer. De acordo com dados da Universidade de Leiden a respeito da produção de estudos científicos entre 2005 e 2009, na Ásia e no Pacífico Ocidental 18 universidades produziram mais de 5 mil estudos, tendo ao menos 10% destes estudos entre os dez mais citados de seus respectivos setores – 6 na China, 6 na Austrália, 2 em Cingapura, 2 em Hong Kong, 1 no Japão e 1 na Coreia. Na Europa, o número equivalente de universidades foi 47 e, nos Estados Unidos, 64.
 
Entretanto, 38 universidades da Ásia e do Pacífico produziram mais de 5 mil estudos. A proporção de citações tem aumentado. Levando-se em consideração o contínuo crescimento do investimento em pesquisa, parece provável que os sistemas pós-confucianos vão chegar lá.