18/07/2013

revista Ensino Superior nº 10 (julho-setembro)

Introdução a um perfil socioprofissional do professor estrangeiro no Brasil

O docente 'de fora' tenta sobreviver em meio a dilemas e contradições que vão desde inquietações culturais, alteridade e aceitação pelos alunos até sua própria integração na universidade

Por Serigne Ababacar Cisse Ba
Professor Adjunto no curso de Administração da Universidade Federal de Goiás, campus Catalão. Graduado e Mestre em Administração pela Universidade Federal de Lavras e Doutor em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia. Coordenador do Curso de Bacharelado em Administração Pública (EaD) e membro do Grupo de Estudo em Didática Desenvolvimental e Profissionalização Docente (Gepedi), do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia
Este artigo, um resumo da tese de doutorado orientada pelo prof. dr. Roberto Valdés Puentes, buscou apreender o professor estrangeiro, no seu perfil, suas dificuldades, suas contribuições e desafios para a permanência e reconstrução das práticas didático-pedagógicas e para a atuação como profissional docente. Temos um grande número desses sujeitos nas universidades públicas brasileiras, ainda mais considerável nos últimos dez anos. Nosso universo de pesquisa foi a Universidade de Brasília (UnB). Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira/Inep-MEC (microdados do censo do ensino superior do ano de 2011) nos serviram de base para localizar esses docentes. Aplicaram-se questionários a 37,2% das nacionalidades presentes (19 das 51 nacionalidades), correspondendo a 7,6% de uma população de 250 professores, além de entrevistas semiestruturadas, consulta a documentos disponibilizados nas IES e em outros locais (sites web das faculdades, sites pessoais). A análise qualitativa e o tratamento estatístico dos dados nos permitiram chegar às seguintes conclusões: os professores estrangeiros encontrados na UnB são originários na sua maioria dos países da América Latina e da Europa, declaram-se brancos ou pardos, têm títulos de doutor, trabalham em regime de dedicação exclusiva e atuam no ensino, pesquisa e extensão. Os docentes encontram grandes dificuldades de adaptação em seus locais de trabalho, por causa da falta de mecanismos de socialização e de auxílio em suas práticas pedagógicas. À luz do paradigma da complexidade de Edgar Morin, é possível afirmar que o professor estrangeiro tenta sobreviver na universidade pública brasileira em meio a dilemas e contradições que vão desde inquietações culturais, alteridade e aceitação pelos alunos até sua própria integração na universidade e a busca permanente da religação das partes. No entanto, há de se notar a grande contribuição desses professores no que tange à inserção dos programas de pós-graduação onde atuam em altos patamares de qualidade – além da inserção internacional.
 
Debruçar-se sobre uma problemática onde o próprio pesquisador é ao mesmo tempo sujeito (por fazer parte da população a ser estudada), como é o caso, por ser também professor estrangeiro atuando na Universidade Pública brasileira, não é tarefa fácil. Para evitar vieses, é preciso distanciamento do pesquisador e de seu orientador (ambos professores estrangeiros, o primeiro africano do Senegal e o segundo, latino-americano de Cuba).
 
Os professores estrangeiros trazem uma grande contribuição para a inserção internacional dos programas onde atuam; trazem outra forma de enxergar a academia e contribuem na mudança do habitus acadêmico Esse distanciamento permite realizar uma leitura dos dados obtidos resguardando-se certa neutralidade, tarefa extremamente complicada. Os caminhos percorridos e os ainda vindouros nos estudos com os cotidianos são repletos de complexidades e nos desafiam, como nos coloca Morin (2000), ao exercício para o "pensamento multidimensional" buscando, sobretudo, caminhos para o "pensamento dialógico". Neste momento, penso com o autor já citado que os métodos com os cotidianos são como o método da complexidade que:
 
[...] pede para pensarmos nos conceitos, sem nunca dá-los por concluídos, para quebrarmos as esferas fechadas, para reestabelecermos as articulações entre o que foi separado, para tentarmos compreender a multidimensionalidade, para pensarmos na singularidade com a localidade e com a temporalidade, para nunca esquecermos a totalidade integradora. (MORIN, 2000, p. 192)
 
Essa constatação nos aproxima de um modo de fazer pesquisa que se afasta das concepções positivistas das ciências, que com base num paradigma cartesiano, separam sujeito/objeto, emoção/razão, e trabalham com uma pretensa neutralidade que visa o alcance de um rigor científico que não nos permite "esperar o inesperado" (MORIN, 2000, p 86).
 
Foi a partir de vivências de quase dez anos na docência no ensino superior, somada a mais uma década como estudante de graduação, mestrado e doutorado em instituições públicas de ensino superior, ou seja, minhas vivências pessoais/profissionais, que escolhemos nosso caminho no processo da tessitura dessa pesquisa. Muitos fios foram tecidos e puxados de um estudante estrangeiro que sempre frequentou escolas públicas desde a infância no Senegal e que se tornou docente no Brasil.
 
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Por dominar outros idiomas e trazer experiências de outras universidades, o docente estrangeiro tem um papel fundamental na atração e celebração de convênios e parcerias internacionais Quando usamos os dispositivos, por exemplo, da avaliação qualitativa, precisamos articular conceitos, teorias, os quais são de diferentes campos do saber, tais como: Filosofia, Sociologia, Psicanálise, Psicologia Social, Antropologia, Arte, Educação, Física, Matemática etc. Construímos, assim, novas trilhas, caminhos transversais, possibilidades, perspectivas, de um olhar, de um fazer ciência, com combinações metodológicas experimentais, alternativas novas e, sobretudo, mais abrangentes, mais robustas, mais epistêmicas que os modelos clássicos.
 
Neste trabalho, a transformação necessária foi a passagem para a multirreferencialidade. Em seus trabalhos iniciais, Ardoino estabelece o que denominou de modelo de inteligibilidade das organizações, esboçado inicialmente em 1966, onde a análise institucional é uma forma de introdução para a análise multirreferencial, uma vez que ambas têm o mesmo objetivo, ou seja, permitir uma explicação do não dito, das entrelinhas, do movimento latente implícito nas práticas sociais, entre as quais se encontra a educação (ARDOINO, apudMARTINS 2004). A análise multirreferencial, por sua vez, caracteriza-se como um modelo de inteligibilidade específico, que se tornou conhecido mais tarde por "análise institucional multirreferencial, ou plural". Nesse sentido, podemos dizer que essa abordagem é, inicialmente, uma resposta ao caráter extremamente complexo da prática social e, principalmente, das práticas educativas. Tal complexidade traz para todos aqueles que estão envolvidos com as questões educacionais uma série de dificuldades de leitura e de compreensão sobre suas próprias práticas, e que se desdobram em dificuldades de tomar decisões.
 
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A relação sujeito-objeto, ou seja, as relações que se estabelecem entre o sujeito e o seu objeto de pesquisa, de ação, de trabalho, são multiformes, historicizadas e complexas. São criativas ou não, relações dinâmicas, dialetizadas, nas quais ocorrem trocas, ajustes, cobranças, mudanças comportamentais. Porém essa dinamicidade nem sempre é percebida pelo pesquisador.
 
Mas os docentes estrangeiros também encontram grandes dificuldades de adaptação em seus locais de trabalho no Brasil, por causa da falta de mecanismos de socialização e de auxílio em suas práticas pedagógicas Aqui estaríamos na "práxis" de uma abordagem clínica, isto é, que considera a ambiguidade, o duplo fundo, a ambivalência como elementos, variáveis não mensuráveis, a serem interpretados, desdobrados: a arte é hermenêutica. Consideramos assim toda a hipercomplexidade, extremamente perturbadora, que compõe as relações entre o sujeito e o assim dito objeto, o qual não é uma realidade em si, mas uma construção em movimento e mudança permanente. Um professor estrangeiro estudando os seus colegas também professores estrangeiros e que, obrigatoriamente, tem de se distanciar, tirar seu manto de sujeito para poder enxergar melhor e sem vieses seu objeto de pesquisa: auto-objetivação um tanto complexa.
 
Neste sentido, Edgar Morin nos ensina que:
 
[...] as regras do jogo científico se aplicam com muito mais dificuldade no âmbito antroposocial, não somente por causa da complexidade de seus objetos, mas também da relação sujeito-objeto, onde o objeto é, também, sujeito; e ainda por causa da grande dificuldade a nos auto-objetivarmos. (MORIN 2005, p 56)
 
Na sequência desse campo aberto à pesquisa, ao qual nenhum pesquisador (mesmo querendo) pode esquivar-se, veremos, sinteticamente, mais uma vez, os "nossos", de todos nós, diferentes níveis de implicação. Enfatizamos como um dos instrumentos teórico-práticos de organização do trabalho de elucidação das relações sujeito-objeto, na análise dos diferentes níveis de implicação do pesquisador, nas diferentes ciências e artes, ou do professor em sala de aula. Esses níveis de implicação são: psicoafetivo, histórico-existencial e estrutural-profissional. Essas e outras reflexões e indagações foram a origem dessa empreitada que desenvolvemos a seguir.
 
O tempo de pensar a pesquisa é aquele em que mergulhamos em leituras. Na procura de autores que nos orientem no percurso a ser seguido, aquele da busca de um corpo teórico. É também o momento de formar o "esqueleto" de sustentação para dar consistência aos processos seguintes. Além das leituras teóricas, é também o momento de fazer o levantamento de outras fontes e referências sobre a realidade pesquisada. Buscamos beber de fontes diversas tais como outras teses e dissertações, obras e publicações que versam sobre o tema. Fontes de dados oficiais tais como o Inep e IBGE. Os fundamentos teóricos que possibilitaram a interlocução com os dados tiveram como referências Cunha (1988), Tardif (2002), Nóvoa (1992), Pimenta (1999), Anastasiou (2003), Zabalza (2004), Chauí (2001), Sguissardi (2000) e Catani (1997), entre outros.
 
Edgar Morin tem sido um dos grandes pensadores da segunda metade do século XX, na boa companhia de Boaventura de Souza Santos, Anthony Giddens, Paul Ricoeur, Zigmunt Baumann, István Mészáros [1]. Empreenderam vigorosas reflexões sobre o tempo presente e a construção de um processo de conhecimento que lhe dê inteligibilidade. Os recursos epistemológicos de que dispomos estão envelhecidos e não mais dão conta do que o movimento da vida tem apontado.
 
A Teoria da Complexidade, cujo precursor é o francês Edgar Morin, consiste em uma abordagem metodológica dos fenômenos em que se apreende a complexidade da produção do conhecimento, em oposição ao pensamento simplificador. Entender o professor estrangeiro como parte de um sistema em mutação e sua atuação na universidade pública brasileira constitui-se num exercício complexo.
 
A inteligibilidade complexa, ou o pensar mediante a complexidade, significa apreender a totalidade complexa, as inter-relações, as partes, de modo a se travar uma abertura, um diálogo entre diferentes modelos de análise, diferentes visões das coisas. Isso leva à cooperação interdisciplinar, ao intercâmbio de alteridades (o nacional brasileiro e o outro estrangeiro), mas a busca de inter-relações não significa ordenar a realidade, organizá-la. Significa buscar, também, a desordem, a contradição, a incerteza. (MORIN, 2005, p.66)
Põe dúvidas sobre o que é a verdade, o que é a realidade empírica, de modo a ver os vários lados da situação. Segundo Morin (2005, p.16):
 
As ciências permitiram que adquiríssemos muitas certezas, mas igualmente revelaram, ao longo do século XX, inúmeras zonas de incertezas. A educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas (microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução biológica e nas ciências históricas. Seria preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza.
 
Essas ideias, obviamente, nos colocam diante de uma prática pedagógica nada prescritiva, nada disciplinar. Já que não há nada que seja absolutamente científico, absolutamente seguro, precisamos dialogar com a dúvida, com o inesperado e o imprevisto. Pensar pela complexidade é usar nossa racionalidade para juntar coisas separadas, para aumentar nossa liberdade de opções, de escolhas.
 
Como paradigma epistemológico e arcabouço teórico para este trabalho, optamos pela teoria da complexidade. Há algum tempo essa teoria vem se consolidando nas discussões acadêmicas, sobretudo na educação, e tornando-se objeto de estudo muito atual, uma vez que reorienta a possibilidade de se pensar o conhecimento e ao mesmo tempo problematizar a educação historicamente situada não como objeto determinado, mas em construção, daí a nossa opção por desenvolver nosso estudo à luz dessa temática.
 
Diferentemente do paradigma positivista, a robustez do paradigma da complexidade é que ele centra seu objeto de investigação no que chamamos de objetividade-subjetividade, dado que uma não existe sem a outra, devido ao caráter multidimensional do pensamento epistemológico complexo (proposto por Edgar Morin) que considera o conhecimento parcelar como limítrofe e insuficiente.
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Os professores estrangeiros se instalaram preferencialmente na Região Sudeste (1.058 ou 49,6%); em seguida, vem a Sul (572 ou 26,8%) A configuração das salas lembra sempre das aulas tidas do liceu com alunos muito jovens, perdidos e totalmente desprovidos de uma cultura geral. Poucos eram aqueles que sabiam onde ficava meu país. Muitos deles estavam dividindo, pela primeira vez, a mesma sala de aula com um aluno negro, por terem estudado o tempo todo em escolas particulares e caras; em toda a Universidade podíamos contar nos dedos das mãos os alunos negros que ali estudavam, com exceção de meus colegas do Programa Estudante Convênio que vinham de outros países da América Latina, principalmente da Colômbia e do Haiti, que eram da minha cor. Esse fato era mais marcante nas conversas na cidade onde todo mundo ficava pasmo de nos ver frequentar essa instituição de elite com os seguintes dizeres: "Oi africano, tudo bem? Vocês fizeram vestibular em seu país? Pois aqui na UFLA [Universidade Federal de Lavras] só passavam os brancos bem-sucedidos no vestibular. Você deve ser muito inteligente, fala quantas línguas? E como é na África?". Etc.
 
Essa mesma preocupação era também encontrada na universidade, onde os colegas nos observavam com um olhar de quem pegou o lugar de brasileiros na universidade e ignoravam totalmente a África apenas tendo em mente que nós viemos de um continente pobre e sempre em guerra. Esse olhar consistia para nós – o grupo de três senegaleses entre angolanos, moçambicanos, guineenses, cabo-verdianos, camaroneses, gaboneses e outras nacionalidades latinas –, um enorme desafio. Tínhamos a obrigação de mostrar que éramos pessoas inteligentes e capazes de sobreviver com os colegas além-mar. Foi exatamente o que aconteceu, por termos conseguido concluir o curso no prazo certo, termos sido alunos de iniciação científica e do PET (Programa Especial de Treinamento) e sermos aceitos no Mestrado logo depois da graduação.
 
O ensino médio no Senegal tem um ano a mais do que no Brasil. Além disso, o sistema educacional, calcado no francês, é bastante diferente. Existe uma grande diferença nos currículos, desde a organização didático-pedagógica até as disciplinas e sua sequência na matriz curricular. O aluno universitário senegalês tem poucas aulas presenciais e apenas obrigação de realizar seus exames finais no final do ano letivo, que vai de outubro a junho, e realizar os chamados trabalhos dirigidos das disciplinas do ano. A cada ano, pode ser entregue um diploma universitário (Diploma Universitário de Estudos Gerais – DEUG – ou Diploma Universitário de Estudos Linguísticos – DUEL). Desde 2011 está em curso uma reforma universitária, em que foi adotado o sistema LMD – Licence, Master, Doctorat, ou Licenciatura, Mestrado e Doutorado – eliminando assim a tese de Doctorat d´état. Existiam, como no sistema francês, vários tipos de títulos de Doutorado, levando a uma nova organização articulada em três diplomas:
 
A Licence ou Licenciatura é obtida com o diploma de Baccalauréat ou Bac (diploma do segundo grau) + 3 anos de universidade (L1, L2, L3). O Master ou Mestrado equivale ao diploma de Bac (diploma do segundo grau) + 5 anos universitários. O Doctorat ou Doutorado equivale ao Bac (diploma de segundo grau) + 8 anos de estudos. Antes da reforma tínhamos os seguintes tipos de doutorado: o Doctorat d´état (incluindo os Doctorats d´état em Economia, Gestão, Direito, Ciências Políticas e Ciências Farmacêuticas), o Doctorat de 3e cycle, o diploma de Docteur Ingénieur, o diploma de Docteur d´université
 
Existem tipos de aulas chamadas de magistrais, que são proferidas uma ou no máximo duas vezes por semana pelos professores titulares. Não há chamadas em sala de aula, o que faz com que o estudante se torne responsável mais rápido, caso queira adaptar-se aos estudos universitários. O professor, logo no primeiro dia de aula, repassa toda a literatura e indica um lugar onde as apostilas complementares das aulas podem ser encontradas. Existem altas taxas de reprovação, em alguns casos girando em torno de 85% [2]. Nesse quesito, o aluno brasileiro é bem mais tutorado, passa muito tempo em sala e tem um contato bem maior com seus professores. A única semelhança é a existência de monitores de disciplinas que costumam ser recém-doutores ou alunos mais adiantados nos estudos em níveis de Mestrado e Doutorado. Outro elemento importante no processo de ensino-aprendizagem é que o aluno na universidade senegalesa tem aulas apenas com professores que têm no mínimo o título de Doutor. Causou-me uma grande estranheza ter aulas com mestrandos e até especialistas no meu curso de graduação no Brasil.
 
Na realidade, essas indagações perpassam as reflexões de todos aqueles que lidam com tais professores, porém nunca receberam a devida atenção em pesquisas científicas. Apenas temos conhecimento de um número muito reduzido de publicações sobre o tema, a exemplo de Fávero et al (1991), em que três professores da Faculdade de Educação da UFRJ publicaram nos Cadernos de Pesquisa em São Paulo, em agosto de 1991, o texto intitulado "Professores estrangeiros na Faculdade Nacional de Filosofia RJ (1939-1951)", como parte de uma pesquisa sobre História da Faculdade Nacional de Filosofia. No trabalho, se apreciou brevemente a presença dos docentes estrangeiros nas universidades criadas na década de 1930, o seu processo de contratação, suas contribuições e seus envolvimentos políticos. Encontramos também na literatura um artigo interessante, cuja fonte de publicação não foi citada. É de um professor da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Ernâni Lampert, que abordou o docente/pesquisador visitante estrangeiro em exercício nas universidades públicas do Estado do Rio Grande do Sul. Este último, pelo fato de ter um tempo limitado de permanência no Brasil, e um local de atuação definido, difere daquele que veio para ficar por tempo indeterminado e na localidade em que achar conveniente. As perspectivas nesse sentido são incomparáveis, sem contar que esses professores visitantes costumam concentrar suas atividades mais na pesquisa e na pós-graduação do que na graduação, que é a razão principal da contratação dos docentes no ensino superior brasileiro.
 
Diante de toda a problematização exposta e da complexidade desse estudo, elegemos como objetivo geral dessa tese uma tentativa de resposta ao questionamento: qual é o perfil socioprofissional do professor estrangeiro na universidade pública brasileira? Nossos objetivos, então, foram:
 
1.       Conhecer o perfil do professor estrangeiro no contexto da universidade pública brasileira;
 
2.       Apreender as dificuldades enfrentadas por esse professor no Brasil em relação à cultura, conflitos e contradições.
 
Falar da universidade brasileira é tratar de um tema complexo, pois repousa em muitas vertentes, muitas faces, muitos atores, muitos players, sem contar com as diversas configurações que temos em um mesmo setor. Na cabeça dos estudiosos da área sempre pairam muitas inquietações do tipo: como delinear políticas e ações em prol de uma formação de qualidade para o professor? Qual é o sentido da inserção de milhares de professores no ensino superior? Qual articulação estabelecer entre o ensino superior e a educação básica? O que fazer com as instituições de ensino superior transformadas em "balcões de diploma"? Como dar conta de um projeto político de educação voltado à sociedade? O que significam (ou podem significar) as tendências de incorporação das tecnologias da comunicação e informação para atender às demandas de formação? O que fazer com as tentativas de massificação do ensino superior imposta pelos organismos de Bretton Woods? Como lidar com os desafios das políticas inclusivas e ações afirmativas? Etc. Nesse sentido, Fávero (1980:7) alerta que, para compreender o real significado de uma reforma, não é suficiente o exame de documentos e da legislação: "A pesquisa histórica aplicada à educação só faz sentido quando capta o significado de certos eventos como parte de uma totalidade, de uma realidade concreta". É preciso debruçar-se sobre outras questões estruturais e conjunturais mais complexas e que impactam no funcionamento e na organização dessas instituições.
 
À guisa de compreensão e de problematização, acreditamos que para além da importância da dívida social histórica com os professores é importante, ainda, buscar situar as iniciativas de formação em nível superior atuais no contexto de transformação vivenciado contemporaneamente, caracterizado por transformações estruturais complexas, que vão desde a reorganização do Estado partindo de bases neoliberais até as evidentes e contraditórias características presentes na relação social com o conhecimento, com o "mundo de comunicação generalizada", com a "sociedade da informação". Esses desafios vêm sendo postos numa situação de uma organização nova (a universidade brasileira tem menos de um século e a universidade pública é ainda mais jovem, com menos de setenta anos) e que se encontra numa reforma ainda inacabada.
 
Os primeiros dados do Inep sobre o cadastro docente a respeito das nacionalidades dos docentes da educação superior datam de 2005. Tais dados revelavam, na época, que a maioria dos docentes que atua no ensino superior brasileiro tinha nacionalidade brasileira. Isso representava 227.522 professores num total de 230.784 docentes, o que dava um percentual de 98,6%. O número poderia ter sido maior, porque 1.128 docentes não haviam declarado a sua nacionalidade, logo tanto podiam ser brasileiros quanto estrangeiros. Foi então suposto que exista entre os docentes de nacionalidade não declarada a mesma relação que há entre os de nacionalidade declarada. No caso, tivemos mais de 99% de docentes brasileiros atuando no país. Os que eram de nacionalidade estrangeira declarada somavam 2.134 (0,9%). A tabela a seguir mostra os dez países de origem cujos números são mais expressivos. Essa informação permite uma leitura mais clara da evolução estatística de 2005 a 2011 (dados mais recentes obtidos do Censo do Ensino Superior do Inep 2011 e usados nesse trabalho).
 
Tabela 1: Países com maior número de professores atuando no Brasil - Brasil – 2011.1
 
Relação de Países
 
Número de Docentes
Argentina
 
257
Portugal
 
194
Estados Unidos
 
151
França
 
145
Peru
 
139
Chile
 
138
Alemanha
 
138
Itália
 
106
Espanha
 
89
Uruguai
 
88
Fonte: MEC/Inep/Deaes, 2011.
 
Os professores estrangeiros se instalaram preferencialmente na Região Sudeste (1.058 ou 49,6%). Em seguida, vem a Sul (572 ou 26,8%). A Região Nordeste ocupa o terceiro lugar da preferência, com 241 professores (11,3%), depois a Região Centro-Oeste (167 ou 7,8%) e, finalmente, a Região Norte (96 ou 4,5%). Das dez nacionalidades elencadas na Tabela 3, só a francesa e a uruguaia demonstram predileção pela Região Sul; as demais se radicaram preferencialmente na Região Sudeste. Na pesquisa, tentamos conseguir pelo menos um professor originário de uma dessas dez nações. A predominância da Argentina se explica pela proximidade; Portugal por ter sido o colonizador; os Estados Unidos e a França pela tradição da imigração. 
 
Tabela 2: População atual total dos docentes estrangeiros no Brasil
 
 
     2002
      2003
       2004
       2005
     2006
      2007
      2008
     2009
      2010
 2011
 
Dados válidos
567
690
1.022
1.345
1.890
2.089
2.345
2.867
3.465
3.966
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fonte: Microdados do Inep 2011.
                                                                                        
Nota-se uma evolução real e constante do número ao longo da última década. Essa estatística acompanha o aumento do número total de docentes nas universidades nesse mesmo período no Brasil. Essa quantidade se distribui de maneira bastante homogênea no país, pois nota-se a presença dessa categoria em quase todos os estados da federação. Lembrando que no governo do presidente Fernando Henrique e na gestão de seu ministro da Educação Paulo Renato de Sousa houve uma grande expansão no número de IES particulares. Essas faculdades isoladas acabaram contratando muitos professores estrangeiros para se consolidarem e se tornarem centros universitários. Houve uma repartição desses professores em todas as regiões do país. Para ilustrar, mostramosna tabela 3 as cidades onde esses docentes se concentram mais. Vale lembrar que o Inep divulga dados de um ano para outro, ou seja, os dados de 2011 referem-se aos cadastros realizados pela IFES´s no ano de 2010. O censo de 2012 deverá ser concluído em meados de 2013. Uma defasagem no tratamento dos dados dos censos pelo Inep cria problemas para os pesquisadores no que se refere à obtenção de dados atualizados.
 
Tabela 3: Municípios onde se encontra a maioria dos docentes estrangeiros
 
Municípios
Número de docentes estrangeiros
Belém
120
Belo Horizonte
140
Brasília
254
Campinas
116
Curitiba
160
Florianópolis
85
Fortaleza
89
Goiânia
105
Manaus
135
Juiz de Fora
56
Londrina
67
Natal
87
Niterói
77
Palmas
75
João Pessoa
85
Porto Alegre
137
Recife
92
Rio de Janeiro
323
Salvador
166
Santa Maria
67
Santo André
83
Santos
72
São Bernardo do Campo
63
São Luis
69
São Paulo
505
Vitória
77
Uberlândia
54
Uberaba
47
Fonte: Organizada pelo autor a partir dos microdados do Inep 2011.
 
O que se nota basicamente é que temos o número maior de docentes estrangeiros no Estado de São Paulo, onde esses professores são encontrados entre a USP, Unicamp e Unesp, entre outras. Em seguida, temos o Estado de Rio de Janeiro, seguido pela capital federal que, apesar de contar com uma única Universidade federal, abriga muitas instituições de ensino superior particulares e institutos de pesquisa, além das representações diplomáticas e organismos internacionais, que podem atrair esses docentes. De maneira que é possível afirmar que os professores estrangeiros concentram-se, principalmente, nos grandes centros urbanos (cidades com mais de 500.000 habitantes), com tradição e com um número elevado de instituições de educação superior.
 
Tabela 4: Categorias administrativas onde se encontram os docentes no Brasil
 
 
CATEGORIA ADMINISTRATIVA
 
 
FREQUÊNCIAS
 
 
PERCENTUAIS
 
ESTADUAL
366
9,3
FEDERAL
610
15,4
MUNICIPAL
160
4,0
PARTICULAR COMUNITÁRIA
375
9,5
PARTICULAR CONFESSIONAL
420
10,6
PARTICULAR EM SENTIDO ESTRITO
2.035
51,3
TOTAL
3.966
100,0
Fonte: Organizada pelo autor a partir dos microdados do Inep 2011.
 
De maneira geral, considerando a totalidade dos docentes estrangeiros atuando nas universidades brasileiras sem distinção de tipo, nota-se que mais da metade (51,3%) encontra-se trabalhando nas faculdades particulares em sentido estrito, que, por conseguinte concentram o maior número de alunos, cerca de 80%. Depois, seguem as universidades federais, alvo da nossa pesquisa, as faculdades particulares confessionais e as instituições universitárias comunitárias, que quase empatam em termos quantitativos com universidades estaduais enormes como USP, UEG e UEMG. As estaduais se destacam ora pela qualidade do ensino, como no caso da USP e Unicamp em São Paulo, ora pela carência, como no caso da Universidade Estadual de Goiás.
 
A pesquisa demonstrou que o perfil de docentes estrangeiros presentes na Universidade de Brasília (UnB) é dos mais variados. Encontramos professores muito experientes, com quase 40 anos de serviço, até professores recém-chegados, ou que se encontram em fase de convalidação de seus diplomas, obtidos em seus países de origem. Nossa amostra foi composta por docentes originários de Alemanha, Argentina, Chile, China, Colômbia, Cuba, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Nigéria, Peru, Portugal, Senegal, Uruguai, Inglaterra, Hong Kong e Rússia,representando 19 das 51 nacionalidades (37,2%) registradas na UnB no ano de 2012. O gênero masculino dominou entre os sujeitos pesquisados. Esse dado contradiz os da Organização Mundial sobre as Migrações, que aponta em seu relatório de 2009 que "cerca da metade dos emigrantes do mundo são mulheres. Nos países desenvolvidos, as mulheres excedem em número os homens migrantes". Talvez esse fenômeno possa ser explicado pelo fato de termos mais homens lecionando no ensino superior no Brasil, segundo os dados do Censo da Educação Superior (2010), apesar de o país ter formado mais doutoras nos últimos anos (Estudo Doutores Capes 2010).
 
Os docentes que se declararam de cor branca predominaram na nossa amostra com mais de 85%; o restante dividindo-se entre pardos (da América Latina) e negros (da África e também da América Latina). Na UnB havia um total de 51 nacionalidades registradas pelo Decanato de Recursos Humanos. Concentramos nosso estudo em 30 docentes (constituindo uma amostra representativa de 12% da população total), num total de cerca de 250 nesta IES no ano de 2012 (segundo semestre).
 
Quando nos propusemos a realizar essa pesquisa, como professor estrangeiro de um curso de Ciências Sociais aplicadas, muitas dúvidas pairavam na nossa cabeça. Desde o início da nossa carreira, há uma década, nos debruçamos sobre questões relacionadas ao nosso fazer docente, e quando ingressamos na universidade pública com outros colegas estrangeiros, nos veio a inquietação de entender mais e melhor, quem somos realmente, como nos sentimos, como somos avaliados pelos colegas e pelos discentes, quais eram e quais continuam a ser nossas perspectivas, como é nossa prática pedagógica. Foi depois que decidimos dar respostas às nossas inúmeras dúvidas que resolvemos tentar ingressar no Programa de Doutorado em Educação da UFU e realizar esse estudo.
 
Partimos dos pressupostos de que éramos diferentes, e de que estávamos na universidade em números cada vez maiores, mas ainda passávamos despercebidos. Qual seria nossa avaliação de acordo com nosso perfil, nossas contribuições e os desafios que encontramos na universidade pública brasileira, instituição essa jovem e em plena mutação?
 
Ao final deste trabalho, pudemos elencar uma série de resultados que poderiam auxiliar numa maior compreensão e melhor inserção dos professores estrangeiros em suas instituições.
 
Em relação ao perfil, encontramos um professor estrangeiro adulto de meia idade, bem titulado e que trabalha em regime de dedicação exclusiva nos três pilares do ensino superior, a saber: o ensino, a pesquisa e a extensão. A maior parte deles vem dos países europeus e da América Latina. Trata-se em geral de um professor do gênero masculino que se formou em seu país de origem pelo menos até o final da graduação; encontramos também estrangeiros que, por meio de alguns convênios, vieram fazer a graduação e acabaram ficando até o doutorado e se tornando residentes permanentes.
 
A pesquisa revelou muitas semelhanças nas práticas pedagógicas em relação aos colegas nacionais, pois os alunos, as coordenações de cursos e a gestão em si são os mesmos. Na maioria dos casos, o professor estrangeiro tem que se conformar com a realidade e seguir os passos dos colegas brasileiros em termos de avaliação, tratamento e gestão da classe para sua maior aceitação e permanência ao seio das universidades. A realidade dos currículos engessados é vivida e criticada por esses professores que elaboram estratégias de sobrevivência e de adaptação a essa realidade.
 
Os professores estrangeiros mobilizam também, de certo modo, seus saberes relacionais para manter um bom relacionamento com os alunos. Alguns usam de sua condição de estrangeiro para ganhar vantagem entre os alunos, aproveitando esse diferencial para atraí-los ou por curiosidade ou por uma fama de competência. Por outro lado, devido à falta de formação pedagógica específica, pois a maioria é bacharel, os saberes pedagógicos relativos à gestão da matéria e da sala de aula são menos dominados por esses últimos. E isso impede o alcance dos objetivos esperados pelos alunos. Ainda o desafio de uma formação pedagógica continuada perdura nessa categoria que sente também muita falta dos devidos feedbacks nas avaliações discentes.
 
Os professores estrangeiros são bem titulados (níveis de pós-doutorado) o que faz com o que eles possam ter uma boa contribuição principalmente nos programas de pós-graduação. Em geral, trabalham em cursos de pós-graduação bem avaliados pela Capes, com  conceitos 5 a 7 (a presente pesquisa não dispõe de dados nem de elementos que permitam atestar e avaliar efetivamente a contribuição dos mesmos na obtenção desses conceitos; talvez isso possa ser objeto de investigações posteriores). Por dominarem outros idiomas e ter trazido experiências de outras universidades, os professores têm um papel fundamental na atração e celebração de convênios e acordos de parcerias internacionais, assim como na promoção de publicações internacionais em veículos de comunicação bem conceituados no mundo acadêmico. Trazem outra forma de enxergar a academia e contribuem na mudança do habitus acadêmico.
 
Os professores estrangeiros se encontram em busca permanente do seu espaço na academia brasileira, tendo o desafio de serem muito competentes para se destacar e conquistar o respeito dos demais colegas e dos alunos. O olhar de muitos, segundo o qual "esse estrangeiro está ocupando um lugar de um brasileiro" está presente e perpassa as relações enquanto que o mesmo, em muitos casos, se considera como alguém que veio somar e interligar as partes despedaçadas em meio à aldeia planetária. Para tal, existe a necessidade da abertura de um espaço de diálogo para que esse professor pudesse divulgar sua cultura na perspectiva de inter/multiculturalismo. Ao docente estrangeiro sempre poderia ser aberta a possibilidade de um espaço no seu plano de ensino para difusão e/ou compartilhamento de elementos culturais do seu país de origem na tentativa de enriquecer o repertório cultural de seus alunos brasileiros, que carecem de informações sobre outras nações para além daquelas deformadas e deturpadas repassadas nos diversos canais de mídia.
 
Há a necessidade de inclusão nos currículos de elementos que proporcionariam a abertura de espaços para que os professores estrangeiros possam expor um pouco de suas culturas para os alunos. Os processos de reconstrução dos conhecimentos e dos saberes perpassam o cotidiano desse professor que, ao mesmo tempo em que ensina, aprende muito com os alunos sobre a realidade local. A promoção de espaços de trocas de ideias, de intercâmbio, é de suma importância no processo de ensino-aprendizagem em ambos os lados.
 
Alguns sofrem com o problema da falta de um bom domínio do idioma português tal como falado no Brasil, criando alguns casos de rejeição em sala e dificuldades de inserção. Fala-se muito sobre multiculturalismo como nova perspectiva de abordagem das questões contemporâneas. As nações que conseguem incorporar esses elementos só têm a ganhar, pois se trata de um fenômeno sem volta. Com a globalização das culturas e a mundialização dos capitais, as migrações tendem a perdurar. A pesquisa trouxe e elencou problemas de inserção desse professor na universidade brasileira pelo fato de se tratar de uma organização repleta de ambiguidades, travadas por leis e normas nem sempre fáceis de ser assimiladas. Conflitos de natureza cultural através de choques provocados pela aceitação/rejeição de elementos trazidos de seus países de origem são presentes no cotidiano dos professores estrangeiros na tentativa de poder se manter. A vontade de compartilhar seus conhecimentos anteriormente interiorizados com seus alunos muitas vezes é impedida por elementos estruturais, legais e/ou muitas vezes por imposição das próprias instituições ou cursos. No entanto, não cansamos de defender a ideia de que essa diversidade cultural, se bem trabalhada, pode se tornar algo muito benéfico para toda a comunidade. As contradições são presentes na medida em que esses sujeitos terão certamente de se apartar de algumas de suas crenças e princípios, para incorporar outros, novos, imbuídos na cultura local. Isso não vai acontecer sem criar momentos de reflexão e até de resistência. Porém, esse recuo para incorporar novos elementos culturais locais em detrimento de crenças anteriores é algo necessário e até estratégico nesse processo, pois afinal de contas trata-se de contextos geográficos diferentes.
 
Por fim, a pesquisa revelou que os professores estrangeiros têm de desconstruir e reconstruir sua trajetória acadêmica. Esse processo, que consiste em uma serie de manifestações, se revela através de suas formas de dar aulas e de conceber a educação. 
 
O Brasil já tem uma tradição além de ter sido sempre país de imigração, parecido ao melting pot norte-americano. Os imigrantes chegaram em busca de um futuro melhor, sobretudo depois da segunda guerra mundial, sem contar com os descendentes de escravos negros que vieram da África em condições sabidas por todos. Tal situação se repete há algum tempo nas diversas instituições de ensino do país. Os dados da pesquisa mostraram que encontramos esses professores estrangeiros em quantidade crescente nas diversas regiões do país. Os mesmos se declararam brancos e pardos na sua maioria, as origens latino-americanas e europeias explicam bem esse fato. Esses professores encontram-se nas diversas organizações acadêmicas com uma predominância nas IES particulares (temos realmente muito mais IES particulares no Brasil, cerca de 80% e consequentemente o maior número de alunos). No que tange à sua atuação na UnB, objeto desse estudo, encontramos 51 nacionalidades vindas dos 5 continentes. Nota-se que o grupo é composto de homens de idade entre 30 e 65 anos; com título de doutor; que atua nos pilares da educação superior (ensino, pesquisa e extensão), além de ocupar cargos de chefia e de direção e têm contratos de dedicação exclusiva em suas IES. Além dos cargos de docentes, encontramos professores que ocupam cargos nas diversas administrações da IES. Os mesmos atuam na sua grande maioria nos programas de pós-graduação com bons conceitos. Esses professores estão em quase todos os cursos com algumas raras concentrações no caso de nacionalidades como a russa, a francesa e a espanhola. Em relação a suas práticas e saberes, os professores deparam-se com os mesmos problemas que seus colegas brasileiros no que diz respeito ao despreparo no exercício da profissão docente, pelo fato de a maioria ter diplomas de bacharelado. O desconhecimento dos documentos oficiais (PDI, PPC etc.) é um elemento que dificulta o alcance dos objetivos acadêmicos. Pelas oportunidades ofertadas atualmente no Brasil, há de se esperar o fluxo contínuo das migrações para esse destino e particularmente a vinda de intelectuais estrangeiros nas instituições de ensino superior e centros avançados de pesquisa e desenvolvimento do país.
 
Referências
 
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ZABALZA, M. A. O ensino universitário: seus cenários e seus protagonistas. Porto Alegre, Artmed, 2004.


[1]    É vasta a produção de cada um desses autores, que são referências constantes e obrigatórias para todos aqueles interessados na compreensão do tempo presente. Entre outras, sugere-se: Boaventura de Souza Santos (2002, 2004 e 2006), Anthony Giddens (2002), Paul Ricoeur (1994, 1995 e 1997), Zigmunt Baumann (1999 e 2001), István Mészáros (2003 e 2005). As obras de Morin serão referenciadas ao longo do texto.
 
[2]    Ver Plan stratégique Université Cheikh Anta Diop de Dakar - UCAD – 2011-2016. p 5