31/03/2015

Formação profissional no Brasil

Governança, democracia e política de educação e formação profissional no Brasil: do Senai ao Pronatec

Marta M. Assumpção Rodrigues
Professora de Gestão de Políticas Públicas na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP) e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas da mesma Universidade (NUPPs-USP). É autora de Políticas Públicas (Publifolha 2010) e de “Strong” Presidencies,“Weak” Congresses? A Study of the Executive-Legislative Relations in Brazil, 1985–1996 (VDM 2010), e coeditora de Corporate Social Responsibility–CSR in Two Countries: Brazil and Noruega (Fafo 2008).
Este ensaio é dedicado a Horacio González, meu professor.
 
Este capítulo é resultado de pesquisa realizada no Kellogg Institute for International Studies (Universidade de Notre Dame), durante o Outono de 2011, e no Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (Universidade de São Paulo), entre 2012-2013. Contou com apoio do SENAI-DN no NUPPs/USP. Versão preliminar deste trabalho foi publicada na série Working Paper # 390 (Kellogg Institute, 2013). A autora agradece aos dois pareceristas da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais de Inovação, Regulação e Infraestrutura do IPEA e à Dra. Eunice Ribeiro Durham por seus valiosos comentários e sugestões para o desenvolvimento das ideias apresentadas aqui, que são de sua inteira responsabilidade. Parte deste texto foi traduzida por Santiago Nazarian.
 
Introdução
Como a governança opera em contextos onde a democracia não é uma tradição e responsabilização política é apenas um ideal? Como políticas públicas são moldadas em contextos onde decisões públicas são tomadas de formas não democráticas? As respostas para essas questões referem-se a aspectos importantes da “equação da governança”, que se relaciona com a própria natureza das redes que dão apoio político e econômico para que governos implementem políticas públicas.
 
Nesse sentido, governança não é um conceito puramente descritivo de processos sociais; tampouco é um conceito que carrega um tom político prescritivo importado de outras experiências distantes da esfera social. O argumento desenvolvido neste artigo é que o conceito de governança nos oferece uma ferramenta útil para estudar tanto a eficácia quanto o teor democrático da formulação de políticas públicas.
 
O estudo de governança focaliza nas relações que se dão no processo de criação de políticas, assim como nas consequências que elas acarretam aos resultados agregados (McClurg e Young 2011). Refere-se também às relações que governos estabelecem ao promover a coordenação interdependente entre diversos atores políticos e alianças para tornar políticas efetivas.
 
“Governança democrática”, por sua vez, refere-se a ações compartilhadas que ocorrem entre vários atores sociais, econômicos e políticos. Por um lado, diz respeito à habilidade que governos demonstram em conduzir a sociedade de maneira responsável e, por outro, à capacidade que as sociedades têm para influenciar processos de decisão política. Quando governo e sociedade compartilham a responsabilidade por políticas que buscam combater a pobreza, a desigualdade social e a baixa qualidade de serviços públicos, ou garantir os direitos dos cidadãos, por exemplo, há governança democrática. Por isso, governança é uma ferramenta direcional que modifica o papel de governos: do centro em direção a um sistema de governo; do modo hierárquico a um modo mais associativo e coordenado (Aguillar Vilanueva 2009:79).
 
Apesar de concordar que governança democrática e responsabilização política são dois lados da mesma moeda, este texto parte da premissa de que a qualificação democrática para o conceito de governança não é um detalhe trivial. Ao fazer uso do adjetivo democrático, os cientistas políticos põem luz numa definição de governança que todo regime (democrático) busca atingir. No entanto, este artigo visa ampliar nossa compreensão sobre como a governança opera em contextos onde práticas democráticas não são tradicionalmente valorizadas, ou onde o regime democrático ainda não está completamente consolidado, como parece o caso da maioria dos regimes políticos na América Latina.
 
O conceito de governança adotado neste artigo relaciona-se às conexões pública-privadas que governos nutrem para produzir políticas. Mais especificamente, diz respeito à rede de governança, entendida como a forma pela qual os governos agem promovendo a coordenação entre vários atores (econômicos, políticos e sociais) para implementar uma política concreta – como a de Educação e Formação Profissional (EFP). Já que as redes não são necessariamente democráticas (Aguillar Vilanueva 2009), em contextos onde a representação política é precária e o Estado carece de uma estrutura institucional democrática robusta, os governos tendem a criar políticas públicas voltadas para classes / setores econômicos que estão dispostos a oferecer apoio político e/ou recursos para financiar políticas que eles desejam ver implementadas.
 
Nesse ambiente, Estados/governos podem até desfrutar da governabilidade, ou seja, das condições financeiras e administrativas adequadas para implementar políticas públicas. Mas as políticas que criam não reforçam nem a responsabilização política nem os direitos do cidadão. Em vez disso, esse panorama promove o insulamento do processo decisório (Nunes 1997), o qual, levado por práticas “particularistas” (O’Donnell 2010), produz políticas que respondem principalmente às demandas de (poucos) atores que têm “voz” nos processos de decisão ou capacidade para financiá-las. Em todo caso, tais políticas não visam executar metas coletivas (Diniz1997).
 
Em geral, a governança se origina nas coalizões que se constroem com o tempo por atores políticos que possuem interesses próprios (Heaney 2011:438); governança não democrática, em particular, é oriunda de alinhamentos nos quais atores específicos tendem a desempenhar um papel preponderante no processo decisório. Nesse caso, a governança em rede constitui um enorme desafio para a consolidação da “democracia para cidadãos” (O’Donnell 2002), não só porque é improvável que o processo de tomada de decisão seja transparente, mas principalmente porque, nesse ambiente, a responsabilização política (accountability) não tende a ser nem almejada nem fortalecida por um longo período de tempo.
 
Em contraste, a “governança democrática de sucesso”, como a estudada por Mainwaring e Scully (2010:1), por exemplo, emerge de (e tende a reforçar) uma ordem política mais responsável. Aqui, a efetividade das políticas públicas relaciona-se ao papel que os governos, coalizões e instituições democráticas exercem no processo decisório. Em uma palavra, quanto mais transparentes forem as conexões entre governo e suas redes, mais democrática é a governança. Esses são alguns dos temas discutidos neste estudo que é dividido em duas partes.
 
O artigo começa identificando alguns atributos concretos dos conceitos de governança – políticas públicas – democracia para enfatizar aspectos históricos específicos da rede de governança que ajudou a criar e implementar a política de Educação e Formação Profissional do SENAI, durante os anos 1940. Portanto, a primeira parte deste estudo trata da questão de onde vêm as instituições de Educação e Formação Profissional no Brasil
 
A segunda parte correlaciona a posição competitiva da indústria brasileira na arena internacional ao sistema de Educação e Formação Profissional. Essa parte contextualiza, também, a natureza do sistema de EFP no Brasil com relação aos sistemas de educação vocacional em outros países. Ao discutir as consequências da fundação da política de EFP, durante o Estado Novo (1937–45), para o posterior desenvolvimento do sistema durante os períodos democráticos (1946–64 e 1985–) e de ditadura militar (1964–85), essa parte trata da questão de como as instituições de Educação e Formação Profissional se desenvolveram no país.
 
A conclusão retorna à questão da interface governança – políticas públicas – democracia para esclarecer as razões pelas quais o sistema brasileiro de EFP fornece um bom exemplo de uma política pública razoavelmente bem-sucedida que, apesar de não ser fruto da governança democrática, tem se desenvolvido na direção de seu aprimoramento.
 
O surgimento das instituições de ensino e formação profissional para a indústria no Brasil
O tema da formação de competências para o trabalho é um componente crucial para definir, de uma perspectiva comparada, variedades distintas de capitalismo e resultados de política econômica contemporânea. Wolfgang Streeck (1992), por exemplo, foi pioneiro em correlacionar o sistema de qualificação profissional alemão com sua bem-sucedida economia manufatureira nos anos 1980. Mais recentemente, um estudo de Kathleen Thelen (2007) analisou a política econômica de qualificação na Alemanha, Grã-Bretanha, Estados Unidos e Japão, discutindo, comparativamente, como instituições de Educação e Formação Profissional surgiram nesses países. No caso do Brasil, porém, o tema relativo à emergência dessas instituições ainda é pouco explorado por acadêmicos. Para entendermos melhor esse fenômeno, elegemos analisar o Sistema S como parte fundamental do sistema de EFP no Brasil.
 
Criado durante os anos 1940, o Sistema S consiste numa combinação de organizações públicas não-estatais[1] que oferecem não apenas Educação e Formação Profissional, mas também assistência técnica e social, além de atividades socioculturais e de lazer. Nos últimos setenta anos, o Sistema S permanece o maior, mais eficiente e mais robusto complexo de EFP da América Latina. É estimado que, desde sua fundação, 52 milhões de brasileiros foram treinados pelo sistema[2] em 28 programas oferecidos pelo setor industrial.
 
O Sistema S tem contribuído também com o desenvolvimento da competitividade do Brasil no mundo globalizado. De acordo com The Global Competitiveness Report, 2012–2013, de uma classificação realizada em 2012 em 144 países, o Brasil aparece na melhor posição em “disponibilidade de serviços de treinamento” entre os BRICs (34a); a África do Sul vem em segundo lugar (51a), a China em terceiro (55a), a Índia em quarto (59a), e a Rússia em quinto (80a) (WEF 2012)[3].
 
O foco deste estudo é na primeira organização a estruturar o Sistema S: o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial-SENAI. Criado em 1942 para se adequar às necessidades e interesses da indústria, o SENAI é operado por entidades autônomas de associações de empregadores (a Confederação Nacional da Indústria, CNI[4]) e a (Federação das Indústrias dos Estados), apesar de estar formalmente vinculado ao Ministério do Trabalho. De acordo com Johanson (2009), o SENAI recebe 2.8 milhões de alunos todos os anos.
 
Muitos países da América Latina implementaram sistemas de Educação e Formação Profissional inspirados no formato brasileiro. O desenho do SENAI influenciou, por exemplo, a criação do Instituto Nacional de Aprendizaje (INA) na Costa Rica, o Servicio Nacional de Aprendizaje (SENA) colombiano e o Instituto Nacional de Cooperación Educativa (INCE) da Venezuela, entre outros[5]. Mais recentemente, o SENAI ajudou a implementar políticas de formação profissional em países africanos como Cabo Verde (Castro 2003), Angola e Guiné-Bissau (Fiesp 2012). Em 2012, o modelo do SENAI (São Paulo) passou a ser exportado para a Nigéria[6].
 
Em contraste com os sistemas de formação profissional adotados em partes do Reino Unido, na Alemanha e na Dinamarca, que têm base na escola, na maioria dos países latino-americanos e africanos, as instituições de educação profissionalizante são baseadas nas empresas; na América Latina, as exceções são Argentina e México, cujo treinamento profissionalizante inicial não é separado da educação geral[7].
 
Casos como o do Sistema S no Brasil têm seus sistemas financiados por um imposto na folha de pagamento. Porém, o desenho dessas cobranças varia em cobertura, método de coleta e obrigação à contribuição - e seu sucesso depende de uma base econômica suficientemente ampla no setor formal, assim como de uma capacidade administrativa razoável (Johanson 2009). Por isso, possuem laços estreitos com a indústria, são projetadas, planejadas e implementadas de maneira centralizada, e oferecem formação profissional fora do sistema de educação regular.
 
Hoje, a EFP com base nas empresas é encontrada na França, nos Estados Unidos, no Canadá e na Coreia, que são casos que adotaram também sistemas de impostos. Na França, por exemplo, o sistema de impostos foi introduzido em 1925, quando empresas passaram a ter de pagar o equivalente a 0,5% dos salários como “taxa de aprendizagem”. Nos Estados Unidos e no Canadá (Quebec), os sistemas de impostos foram introduzidos em 1995; Quebec, em particular, usa um sistema de “treine-ou-pague”, no qual empregados contribuem com uma certa quantia a um fundo de treinamento (OECD 2012). Já, no caso da Coreia, há uma isenção do sistema de impostos: empresas que treinam mais de 6% de seus empregados não têm de pagar imposto; apenas empresas que treinam menos de 6% são levadas a pagar um imposto adicional para educação (Bosch e Charest 2010a).
 
No Brasil, por sua vez, foi instituído um imposto geral de 2,5% sobre o pagamento mensal de salários. Entidades de Educação e Formação Profissional como o SENAI, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT), o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) e o Serviço de Aprendizagem Rural (SENAR) recebem 1,5% da folha de pagamento, e instituições sociais do Sistema S, como o Serviço Social do Comércio (SESC) e o Serviço Social da Indústria (SESI), recebem 1%. Conselhos de Administração controlam as finanças do sistema, e a Controladoria Geral da União (CGU) (criada pela Medida Provisória n.2.143/31 de 2 de abril de 2001) realiza a supervisão. Isso significa dizer que, com um orçamento anual de contribuições arrecadadas pelo Estado ao redor de R$ 15 bilhões (em 2011)[8], que frequentemente ultrapassa outros fundos públicos disponíveis para outras áreas de políticas, a accountability não constituiu uma característica fundamente do sistema – já que esta resulta de uma engenharia institucional construída ao longo do processo de democratização recente[9].
 
Rede de governança e formação profissional em perspectiva comparada
Arranjos institucionais que governam a formação profissional constituem um aspecto chave para definir a natureza do acordo político alcançado entre empregadores, trabalhadores e sindicatos (Thelen 2007). Uma olhada nesses arranjos lança alguma luz em questões como: De onde vêm as instituições de formação profissional? Como elas se formam? Que tipos de alinhamento de coalizão sustentam essas instituições?
 
Ao rastrear os sistemas contemporâneos de formação profissional em diversos países, Kathleen Thelen (2007) mostra algumas diferenças institucionais flagrantes na evolução do treinamento vocacional na Alemanha, Grã-Bretanha, Japão e nos Estados Unidos. Seu olhar nos remete aos alinhamentos de coalizão entre três grupos chaves – empregadores em indústria de especialização intensiva, artesãos tradicionais e os primeiros sindicatos – durante o século XIX. O estudo de Thelen demonstra que, enquanto na Alemanha e Japão a política de Estado organizou ativamente o setor artesanal, reforçando o papel dos sindicatos na organização de estratégias de controle de ofício, nos Estados Unidos e Grã-Bretanha, por contraste, as condições econômicas e políticas destruíram as associações corporativas tradicionais de artesãos (2007:279).
 
No caso do Brasil, a resposta para a questão de onde vêm as instituições formação profissional deve começar por considerar o fato de que o Brasil foi o último país do mundo a abolir a escravatura (1888). Naquele contexto, os alinhamentos de coalizão entre os três grupos chaves examinados por Thelen (2007) (empregadores em indústrias de especialização intensiva, artesãos tradicionais e primeiros sindicatos) não fizeram parte do desenho originário da política de formação profissional. Artesãos (e sindicatos emergentes) foram deliberadamente excluídos do processo decisório, especialmente durante os primeiros anos de formação (Decca 1996). A educação acadêmica, por sua vez, foi projetada principalmente para atender as expectativas da juventude da classe alta (Teixeira 1968:50), treinar funcionários para a burocracia governamental (Silva 1977:3), ou preparar doutores, engenheiros e advogados para servir a elite (Ribeiro 1962:11).
 
Os primeiros a endereçar a questão da formação de competências no país foram José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838) e Joaquim Nabuco (1849-1910), que chamaram a atenção de parlamentares para o fato de que investimentos deveriam ser direcionados para implementar políticas educacionais, trabalhistas e de treinamento profissional, com o objetivo de incluir aqueles que estavam prestes a deixar o trabalho compulsório para ingressar no mercado de mão de obra livre emergente.
 
Contudo, seus argumentos não encontraram eco no parlamento brasileiro (Nabuco 2000; Dolhnikoff 2012), uma vez que havia não só pouco interesse dos parlamentares (e do governo), mas principalmente pouca pressão social para formular uma política efetiva, e nenhuma iniciativa institucional pela mudança (Chagas 1967:50) no panorama da educação profissional no país. Além disso, devido em parte ao acesso restrito da educação secundária, a demanda numérica para ingresso no ensino superior era também limitada. De fato, o número de alunos que passavam pelo sistema não justificava uma política educacional mais ambiciosa
 
A primeira política de educação profissional no Brasil focalizou os trabalhadores do sistema ferroviário do Rio de Janeiro, a Estrada de Ferro Central do Brasil – um importante setor de demanda para o trabalho qualificado (Castro e Alfthan 1978) — com a criação em 1906 da Escola Prática de Aprendizes de Oficinas (Cunha 2000:96). Apenas em 1919 o treinamento de professores para educação profissionalizante foi alavancado com a criação da Escola Normal de Artes e Ofícios Wenceslau Braz (Tavares 2000).
 
No nível federal, a política de EFP foi lançada inicialmente pelo decreto presidencial 7.566 (Nilo Peçanha, 1909–10) para criar em 23 de setembro de 1909 dezenove escolas profissionalizantes – uma em cada Estado brasileiro (Cunha 2000:94). Porém, essas escolas serviram, de fato, como poderosa moeda política para o governo federal distribuir posições e/ou vagas escolares para indicados de políticos locais, recebendo, assim, apoio das oligarquias regionais (Leal 1949). Em 1931, quando Gustavo Capanema, ministro da Educação e Saúde, criou a Inspetoria do Ensino Profissional Técnico para abrir mais dezenove escolas profissionalizantes (uma em cada Estado), a distribuição foi intensificada (Cunha 2005).
 
Desta forma, a centralização do clientelismo e do patrimonialismo contribuiu não só para facilitar o insulamento do processo de tomada de decisão dentro da esfera executiva (Nunes 1997), mas também para desmantelar a efetividade de uma política que produziria as competências intermediárias requeridas pela indústria emergente. Ademais, ao introduzir obstáculos importantes ao surgimento de uma ordem política mais responsável no país, a ditadura do Estado Novo acabou por implementar políticas públicas que, baseadas em práticas excludentes, não poderiam reforçar a governança democrática. Nesse contexto, a política de treinamento industrial começou a ganhar ímpeto, porém, isso ocorreu de uma forma contraditória.
 
A situação de insulamento da formulação de políticas foi agravada em 10 de novembro de 1937, quando Getúlio Vargas suspendeu as eleições democráticas e impôs uma nova Constituição no país. A Carta de 1937 declarava (art.129) que indústrias e sindicatos deveriam levar as escolas de aprendizagem para filhos de empregados e associados, enquanto a educação básica (educação “pré-profissionalizante”) para os pobres era “essencialmente dever do Estado”. De maneira a tornar esse artigo efetivo, Capanema desenvolveu um projeto que delineava a política de EFP brasileira, levando educação profissionalizante aos colégios públicos regulares com apoio econômico dos industriais.
 
Um rascunho desse projeto foi apresentado à Confederação Nacional da Indústria (CNI) e à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em 1938. Entretanto, incapazes de perceber que o projeto de Capanema tinha o intuito de identificar os interesses dos industriais como um “objetivo social coletivo”, a CNI e a Fiesp decidiram retirar apoio dessa proposta, declarando que os industriais paulistas não iriam financiar uma política pública que seria implementada pelo Estado no nível nacional (Cunha 2000:99).
 
Baseado num relatório intitulado “Os Defeitos do Ensino Profissional Brasileiro” de 1938, Rodolpho Fuchs, um fiel conselheiro de Vargas para assuntos relacionados ao ensino profissionalizante, recomendou, por sua vez, que o Brasil seguisse o exemplo da Alemanha, tornando compulsória a preparação profissional para jovens trabalhadores da indústria, com financiamento da iniciativa privada (Schwartzman, Bomeny e Costa 1984). Seguindo essa recomendação, em 2 de maio de 1939, técnicos do Ministério da Educação emitiram o decreto de lei 1.238, forçando empresas com 500 ou mais empregados a financiar o treinamento profissional dentro de suas indústrias (Weinstein 2000).
 
Quando a CNI e a Fiesp responderam que iriam simplesmente ignorar esse decreto, o governo federal designou uma comissão interministerial para criar conselhos regionais que supervisionassem a colocação profissional e os programas profissionalizantes em parceria com as indústrias e os sindicatos (Cunha 2000). A comissão também foi incumbida de tratar de quatro grandes questões relacionadas com a Educação e Formação Profissional no Brasil: Programas de EFP deveriam ser restritos a empresas com 500 ou mais empregados? Quais setores da indústria demandariam treinamento mais formal e extensivo? Quem deveria financiar esses programas? Quem deveria administrar a política de EFP no Brasil? (Weinstein 2000:115).
 
Da perspectiva do Ministério da Educação, Capanema recomendou que o governo federal deveria ser o ator responsável por criar, implementar e financiar a nova política de treinamento profissionalizante no país (Schwartzman, Bomeny e Costa 1984:238). Da perspectiva da Fiesp, Roberto Simonsen — que, em 1937, já era um participante de peso na formulação das políticas econômicas de Vargas – expressou a forte oposição dos industriais à participação dos sindicatos no processo de criação de políticas de EFP. Simonsen considerou que a política de ensino profissionalizante no Brasil deveria ser implementada de forma gradativa, com escolas se concentrando no treinamento de professores e no desenvolvimento de especialização de trabalhadores mais experientes (Carone 1978:273–84). Em referência à supervisão, à administração e, em especial, ao financiamento, Simonsen sugeriu que empresas, trabalhadores e Estado arcassem conjuntamente com os custos da política de EFP brasileira (Cunha 2000).
 
Em julho de 1940, Gustavo Capanema escreveu uma carta para Getúlio Vargas na qual reclamava do modelo de EFP que emergia da comissão interministerial. Nela, o ministro expôs sua dificuldade em aceitar uma política de EFP na qual o Ministério da Educação teria apenas um papel marginal, na medida em que, na sua visão, esse ministério deveria ser responsável pela formulação da política de educação profissional para atender à demanda industrial.
 
Em resposta ao pedido de Capanema por um controle federal mais direto sobre o novo sistema de EFP, Vargas declarou que não estava convencido de que o governo deveria desempenhar um papel tão importante para tornar efetiva tal política (Cunha 2005). De fato, o presidente parecia estar receptivo ao argumento apresentado pelo ministro do Trabalho, Waldemar Falcão, de que o governo federal não poderia se dar ao luxo de implementar a política de EFP sem o apoio econômico dos industriais (Schwartzman, Bomeny e Costa 1984).
 
Nesse contexto, Vargas decidiu designar uma segunda comissão, em julho de 1940, para selar a coalizão política com os industriais de São Paulo. O presidente pretendia que a comissão dissesse que os industriais deveriam ou aceitar a responsabilidade de financiar a política de EFP brasileira, como exigia a Constituição de 1937, ou o governo e/ou representantes sindicais passariam a inspecionar as empresas individuais para tornar o decreto 1.238/1939 efetivo (Cunha 2000:100).
 
Defendendo o desenvolvimento industrial acelerado no contexto do Estado Novo, o presidente da Fiesp lançou um relatório, em setembro de 1941, no qual declarava, numa espécie de reviravolta, que o processo de industrialização do Brasil requeria uma força de trabalho bem preparada com técnicos treinados e profissionais especializados, e que a CNI e suas federações regionais, incluindo a Fiesp, seriam as organizações ideais para garantir o financiamento, a supervisão e a administração dos novos programas de EFP para os trabalhadores da indústria.
 
Quase todas as conclusões do relatório de Simonsen foram incorporadas numa proposta de decreto de lei apresentada à comissão interministerial em dezembro de 1941, que incluía a criação não só de uma organização para implementar a nova política de EFP no país, mas também de um esquema de tributos que a financiasse. Desta vez, as objeções de Capanema serviram apenas para trocar o nome da organização – de Serviço Nacional de Formação de Industriários para Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).
 
Em 22 de janeiro de 1942, ao emitir o Decreto-Lei 4.048 para criar o SENAI, o Executivo federal estabeleceu um imposto setorial e regional no qual todas as indústrias deveriam pagar uma contribuição compulsória mensal de “2.000 réis por empregado por mês”, constituindo, desta forma, um fundo para financiamento da EFP que seria administrado pela corporação de empregadores.
 
Desta forma, o Sistema S foi lançado e, com ele, a CNI e a Fiesp acabaram assumindo a paternidade de uma política da Educação e Formação Profissional que estava perfeitamente ajustada às suas necessidades e interesses sem a interferência dos trabalhadores, sindicatos ou do Estado.
 
Além disso, ao chamarem para si a responsabilidade de financiamento e implementação da política de EFP no Brasil, os líderes da indústria deixaram claro que preferiam aumentar seu controle sobre o financiamento do que ver decisões, nesta área, serem tomadas por funcionários do governo ou pelos sindicatos (Weinstein 2000).
 
Mais ainda, ao criar o sistema de EFP nesses moldes, a ditadura de Vargas tornou claro que estava fazendo uma importante concessão aos industriais brasileiros: deixava surgir uma estrutura descentralizada, em oposição à centralização exacerbada que caracterizava o Estado Novo. Essa concessão foi reforçada em 30 de janeiro de 1942, quando Getúlio Vargas assinou a Lei Orgânica do Ensino Industrial, estabelecendo por decreto lei (4.073) as regras do sistema da política de EFP emergente. Com isso o Executivo reforçou o fato de que o setor industrial seria responsável por fornecer Educação e Formação Profissional para a mão de obra brasileira fora do sistema (público) de educação regular.
 
Assim, é possível ponderar, com Smith e Billet (2005), que os líderes da indústria brasileira aceitaram e apoiaram a política de EFP nesses termos, porque esquemas de imposto tendem a ser mais facilmente aceitos por empregadores setoriais ou regionais (ao invés de universais) e porque o imposto seria administrado localmente, ou por corporações de empregadores.
 
Tal argumento encaixa-se perfeitamente com a constituição do esquema de financiamento da EFP no Brasil. Nos últimos 70 anos, esse esquema tem se apresentado não apenas como uma alternativa viável ao modelo nacional (centralizado) de financiamento, como também tem garantido um orçamento “confiável”, que independe de recursos orçamentários públicos, e que assegura às regiões mais industrializadas do país (especialmente à Sudeste) que elas são as maiores beneficiárias do programa.
 
Nesse sentido, a resposta à questão de onde vêm as instituições de formação profissional brasileiras apoia-se, precisamente, na combinação entre o poder de coação de Vargas com a capacidade dos empregadores para implementar, financiar e supervisionar uma política concreta.
 
O exame do impacto dessa combinação na governança democrática, na responsabilização política e no posterior desenvolvimento da política brasileira de Educação e Formação Profissional serão apresentados a seguir.
 
A evolução das instituições de formação profissional no Brasil e no mundo
A economia globalizada de hoje requer que países tenham condições de formar uma enorme quantidade de trabalhadores bem educados, que sejam capazes de se adaptar rapidamente ao ambiente de permanente mudança e à evolução das necessidades do sistema de produção. Nesse contexto, a educação, em geral, e o ensino profissional, em particular, constituem-se não apenas áreas-chave das políticas públicas em países que enfrentam os desafios impostos pela competitividade global, mas também importantes ferramentas para a intervenção do Estado em processos de desigualdades socioeconômicas.
 
Com o objetivo de abordar a questão como as instituições de Educação e Formação Profissional evoluíram no Brasil, esta seção busca averiguar o grau de continuidade institucional e/ou mudança no Sistema S nos últimos 70 anos.
 
Evolução da EFP no Brasil: dos anos 1940 à democratização do regime
Apesar de o sistema Educação e Formação Profissional brasileiro se inspirar no modelo dual alemão de treinamento vocacional, distinções importantes marcam esses dois sistemas: primeiro, eles surgiram e têm sido administrados ao longo do tempo de maneiras distintas; segundo, as coalizões políticas que têm dado sustentação a esses sistemas também se caracterizam por alinhamentos bastante diferenciados.
 
A partir do período do pós-guerra, os sindicatos alemães de trabalhadores passaram a desempenhar um papel fundamental no processo de reforma institucional de um sistema de Educação e Formação Profissional que havia sido reforçado durante o período nazista. Isso significa dizer que, no período de desnazificação, trabalhadores alemães, que já recebiam treinamento profissional in-company – dentro da empresa –, passaram a participar – através dos sindicatos - do processo de decisão sobre a gestão das empresas, administrando e supervisionando o sistema de treinamento dentro das fábricas. Nesse sentido, o compartilhamento desse espaço político igualitário e comum que trabalhadores e empregadores passaram a usufruir a partir do final da Segunda Guerra Mundial constituiu um aspecto fundamental na promoção de uma extensa legislação alemã de proteção social, incluindo a Lei de Treinamento Profissional de 1969 (Thelen 2007:91).
 
Em contraste ao modelo alemão, o sistema de formação de competências no Brasil não foi moldado pela forma como os trabalhadores definem seus interesses. Nos últimos setenta anos, as corporações industriais (Fiesp e CNI) têm desempenhado um papel preponderante na tomada das decisões do sistema de competências, principalmente para implementar os programas de EFP. Por isso, a coalizão que deu sustentação política ao Sistema S desde a sua fundação não teve interesse em promover uma mudança institucional significativa ao longo do tempo, em termos das funções do sistema EFP brasileiro.
 
De fato, com o golpe militar de 1930, os sindicatos foram submetidos a um rigoroso controle pelo Estado. Em 4 de fevereiro de 1930, Getúlio Vargas criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (decreto 19.667) que, ao estabelecer um sistema sindical hierárquico, garantiu o domínio do interesse dos empregadores sobre os dos sindicatos dos trabalhadores (decreto 19.770, de 19 de março de 1931). Em maio de 1931, o Ministério do Trabalho instituiu a mais importante corporação dos empregadores industriais do país ao transformar o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
 
Já, durante o período da democracia populista (1945–64), os líderes industriais, confrontados com os desafios extraordinários do período pós-Segunda Guerra, consideraram o ressurgimento da militância da classe operária e a revitalização do Partido Comunista Brasileiro – cujo candidato, Yedo Fiúza, recebeu 10% dos votos nas eleições presidenciais – uma ameaça. Para enfrentar a nova era de mobilização sindical que a democracia populista trazia à tona, líderes da indústria decidiram investir recursos financeiros consideráveis no Sistema S. Entre 1942 e 1966, esses recursos foram administrados e distribuídos entre as diversas organizações do sistema sem qualquer tipo de fiscalização. Como um resultado dessa situação, a política de EFP tornou-se uma ferramenta importante para restringir a participação dos trabalhadores no processo decisório, no controle e na supervisão do treinamento (Weinstein 2000).
 
Assim, a consequência mais importante do momento crítico do Estado Novo para o desenvolvimento da EFP durante a democracia populista foi a reprodução institucional do Sistema S. Com ela, o alinhamento original de coalizão dos anos da ditadura Vargas permaneceu intacto.
 
Já com a ditadura militar (1964-85), a política econômica de competências promoveu ao mesmo tempo continuidade institucional e mudança. As reformas administrativas de 1966, por exemplo, promoveram mudanças na forma pela qual as receitas fiscais estavam sendo administradas pelo Sistema S.
 
Em 21 de novembro de 1966, os militares criaram o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) (decreto 72/1966), que, entre outras funções, visava controlar, administrar e alocar os fundos que eram coletados pelos impostos da folha de pagamento. A criação do INPS representou uma adaptação importante em relação às mudanças no ambiente político e econômico no qual o governo militar estava inserido: com ela, os militares podiam controlar e supervisionar os recursos financeiros do Sistema S e como eles eram distribuídos e gastos. O INPS administrou esses recursos de 1966 a 1990.
 
De outra perspectiva, a ideia de transformar o Brasil num poder industrial levou o governo militar a considerar a EFP como um aspecto indispensável para promover inovação tecnológica. Em 1971, como uma tentativa de reforçar a política de EFP, o governo federal decidiu implementar uma nova estratégia para tornar o treinamento profissional uma parte compulsória da educação secundária (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 5.692, de 11 de agosto de 1971, art. 5/6). No entanto, pressões para uma educação de alcance mais amplo, que focalizasse nos exames de ingresso na universidade (vestibular) levaram o governo federal a emitir um decreto lei (7.004) em 1982 que retrocedia à tentativa de integrar o treinamento profissional no sistema educacional brasileiro. Desta forma, o arranjo institucional do Sistema S mostrou-se incrivelmente resiliente frente às mudanças que os militares planejaram introduzir na política de EFP brasileira.
 
No entanto, ao ajudar os Estados da federação brasileira a desenvolver um aparato técnico para as escolas, os militares também promoveram uma mudança significativa, na medida em que as Escolas Técnicas de nível médio (Etecs) e as Faculdades de Tecnologia (Fatecs) aumentavam em número – mesmo depois que os militares deixaram o poder. No Estado de São Paulo, por exemplo o Centro Paula Souza, criado por decreto em 1969, tornou-se um dos centros técnicos mais importantes do país. Em 2012, o Paula Souza administrava 207 Escolas Técnicas e 55 Fatecs. Esses fatos demonstram que reprodução e mudança institucional andaram pari passu durante a ditadura militar[10].
 
Contudo, mudanças importantes tanto no desenho da organização curricular da educação profissional de nível técnico e do ensino médio regular, quanto com relação à rede de escolas técnicas federais foram introduzidas com o processo de democratização do regime – apesar de a estrutura do Sistema S permanecer a mesma.
 
Com respeito ao primeiro aspecto, ao estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional[11], Fernando Henrique Cardoso decretou a separação da organização curricular de educação profissional de nível técnico com relação ao ensino médio regular[12]. Essa medida foi revogada[13] quando Luiz Inácio Lula da Silva regulamentou os artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional que tratavam da educação profissional (art. 39) e da educação profissional técnica de nível médio (art. 40 e 41), em 2004. Desta forma, em 2004, foram instituídas três formas de articulação da educação profissional técnica com o ensino médio (integrada, concomitante e subsequente)[14], assim como as “etapas de terminalidade” (articuladas entre si), que possibilitam a obtenção de certificados de qualificação para o trabalho, após sua conclusão (art. 6[15]).
 
Já, com relação ao segundo aspecto (criação de escolas técnicas federais), enquanto a administração FHC condicionou a expansão de novas unidades de escolas técnicas às parcerias com municípios e/ou com o setor privado, restringindo o papel do governo federal na sua criação[16], Lula revogou essa medida, autorizando o governo federal a aumentar o número de escolas técnicas federais, e o setor privado, o número de unidades técnicas descentralizadas[17]. Um resultado dessa medida é que o número de escolas técnicas federais no Brasil aumentou, de fato, durante o período democrático recente: de 140 escolas, em 2002, para 366 unidades, em 2010; a meta do governo federal é atingir o número de 562 escolas em 2014[18].
 
Porém, até pelo menos 2008 (como veremos adiante), as funções do Sistema S permaneceram intactas. E isso ocorreu apesar de a redemocratização do regime ter aberto diversas janelas de oportunidade que favoreceram tanto o debate sobre a estrutura financeira e institucional do sistema no plenário do Congresso Nacional, quanto a reformulação na administração de seus recursos.
 
Na primeira ocasião em que isso ocorreu, deputados da Assembleia Nacional Constituinte (1987–88), enquanto discutiam o que se tornou o art. 149 da nova Constituição[19], tentaram transformar o modelo de contribuição compulsória sobre a folha de pagamento num tributo sobre o faturamento das empresas. Naquele momento, líderes industriais e suas corporações, deparando-se com a ameaça de perder um orçamento confiável (imposto sobre a folha de pagamento) e independente de recursos orçamentários públicos reagiram quase imediatamente, coletando 1,6 milhão de assinaturas entre os apoiadores do Sistema S para reverter o conteúdo da peça legislativa que propunha um novo método de arrecadação. Dessa maneira, como resultado da Assembleia Constituinte, a reprodução institucional do Sistema S foi novamente preservada, na medida em que o sistema continuou a ser administrado como organização privada.
 
Já da perspectiva da administração pública, a reforma administrativa de 1990 do governo Fernando Collor trouxe à tona uma primeira mudança significativa na forma como o sistema de impostos do modelo era administrado. Em 27 de julho de 1990, unindo o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) com o Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS), o governo federal criou por decreto (99.350), o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que administrou o sistema de imposto sobre a folha de pagamento de 1990 a 2007.
 
A partir de 2 de maio de 2007, durante a administração Lula, a Receita Federal assumiu as atribuições do INSS de controlar e alocar os fundos de impostos do Sistema S; naquele momento, a Controladoria Geral da União (CGU) já se encarregava de inspecionar e fazer auditoria dos fundos do Sistemas S. De qualquer forma, o argumento de que os fundos coletados pelo modelo de impostos do Sistema S são públicos (e devem ser administrados como tais) baseia-se no fato de que estes têm sido administrados, distribuídos e inspecionados por instituições públicas (como INPS, INSS, Receita Federal, CGU).
 
Evolução da Educação e Formação Profissional no Brasil e no mundo
A criação do SENAI em 1942 se deu num contexto histórico mundial no qual os sistemas de aprendizagem dos Estados Unidos e do Reino Unido já estavam altamente desenvolvidos (Marsden 1995). Porém, entre os anos 1960 e 1980, enquanto os sistemas de aprendizagem norte-americano e inglês registravam um certo declínio, a política de Educação e Formação Profissional brasileira, como vimos, ganhava força com a ditadura militar (1964–1985) e com o processo de redemocratização do país (1985-). Em 1972, por exemplo, foi criado o Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas (SEBRAE), e, em 1988, a Constituição democrática brasileira abriu caminho para que o Sistema S aumentasse o número de suas organizações: em 1991 foi criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR); em 1993 surgiram o Serviço  Social do Transporte (SEST) e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT); e, em 1998, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP).
 
Já, nos Estados Unidos, dos anos 1980 e 1990, o declínio do sistema de aprendizagem levou formuladores e reformadores de políticas a acreditarem que o sistema norte-americano fracassara na tarefa de produzir uma mão de obra internacionalmente competitiva, em termos de distribuição de competências no nível médio, como já havia acontecido na Alemanha e no Japão no nível técnico e nos setores de manufatura avançada (Bosch e Charest 2010a). Naquele período, o primeiro ciclo da escola secundária nos Estados Unidos (assim como no Reino Unido) tornava-se gradualmente defasado, enquanto a formação se elevava para os níveis das community colleges (dois anos) e dos cursos de bacharel (quatro anos). De fato, essa “tendência acadêmica” do final do século XX aprofundou o desgaste no conteúdo profissionalizante do ensino médio nos Estados Unidos, na medida em que não resolveu o problema de carência de qualificação para os níveis intermediário e de aprendizagem, ou da qualidade geral da educação oferecida pelo sistema público e pelas faculdades comunitárias. Mesmo assim, a tendência norte-americana em focalizar na educação superior e nos níveis secundários mais elevados se espalhou para o Reino Unido e, principalmente, à República da Coreia.
 
No caso da Coreia, apesar de o recrutamento basear-se principalmente no nível terciário, os certificados dos níveis secundários superiores tornaram-se qualificação mínima para o ingresso nos cursos de nível superior (Bosch e Charest 2010a), fortalecendo, assim, a capacidade para o país competir no mundo globalizado, onde as inovações tecnológicas têm gerado uma maior demanda para competências “soft” (Castells 1996: 238), numérica e linguísticas. Além disso, mudanças na política coreana de EFP (1995) flexibilizaram um sistema obrigatório de treinamento profissional (administrado pelo governo) para trabalhadores com pouca qualificação, para outro que passou a responder, mais diretamente, às necessidades individuais dos trabalhadores e às demandas das empresas. Desta forma, o foco no treinamento inicial (Aprendizagem) foi substituído pelo re-treinamento de trabalhadores (e desempregados) como coluna dorsal de uma política proativa de mercado de trabalho (HoYoon e Lee 2010:163-164). Todas essas medidas combinadas com o fato de o treinamento vocacional não ter perdido importância na Coreia incrementaram a capacidade das instituições públicas de EFP não apenas para responder aos desafios que mudam rapidamente no mercado global, mas principalmente para gerar um ambiente mais propício ao desenvolvimento de recursos humanos.
 
Em contraste com o caso coreano (e mexicano), onde o governo federal é responsável não só por implementar programas de EFP, mas também pela re-qualificação de trabalhadores que estão (ou já passaram pelo) mercado de trabalho, no Brasil, a qualificação/re-qualificação foi deixada nas mãos dos trabalhadores até, pelo menos, 2008. Segundo Comin e Barbosa (2011), nesse caso, o caminho da escola para o mercado foi muitas vezes invertido (do trabalho para a escola), já que “lacunas educacionais individuais têm de ser preenchidas no decorrer da vida adulta, quando as pessoas já estão integradas aos mercados de trabalho”. Além disso, nesse “caminho invertido”, trabalhadores informais acabam sendo excluídos, também, do re-treinamento profissional – já que este requer autofinanciamento.
 
Por outro lado, em contraste com o sistema dual alemão – no qual aprendizes recebem treinamento tanto dentro das empresas nas quais trabalham, como nas escolas públicas de ensino profissional –, a maioria dos trabalhadores brasileiros tem sido treinada por escolas profissionalizantes privadas. Dados coletados pelo convênio FUNDAP/CEBRAP (2008) mostram que, em 2006, apenas 30,9% dos trabalhadores paulistas receberam treinamento professional nas empresas. Para o ano de 2007, dados apresentados pelo IBGE/PNAD (2009) demonstram que 75,9% dos alunos brasileiros de EFP estavam matriculados em instituições de ensino privado - incluindo as do Sistema S. De acordo com dados do Ministério do Trabalho produzidos pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE 2011), em anos anteriores, a porcentagem de alunos matriculados em programas de EFP em instituições públicas era de apenas 17,4%.
 
De fato, o tema da ampliação da gratuidade na EFP foi enfrentado apenas em 2008, quando um acordo firmado entre o governo federal (administração de Luiz Inácio Lula da Silva) e algumas entidades do Sistema S (como SENAI, SESI, SENAC e SESC) abriu uma janela de oportunidade para fornecer incentivos de treinamento/reciclagem profissional públicos tanto formação inicial e continuada ou de qualificação profissional quanto para cursos técnicos.
 
Consubstanciado no decreto 6.635, de 5 de novembro de 2008, esse acordo estabeleceu a ampliação anual e progressiva do atendimento gratuito a estudantes de baixa renda, “preferencialmente, trabalhador, empregado ou desempregado, matriculado ou que tenha concluído a educação básica” (art.68). Para isso, no caso do SENAI, tal decreto passou a vincular o valor correspondente a dois terços da sua receita bruta de contribuição compulsória para vagas gratuitas, evoluindo, anualmente, de 50% em 2009 para 66,6% a partir de 2014.
 
Hoje, o acordo do MEC/Setec com o Sistema S constitui parte fundamental de um conjunto de iniciativas que compõem o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), criado no governo de Dilma Rousseff, em 28 de abril de 2011[20]. Ao vincular vários atores no desenho e execução desse Programa - que incluem o governo federal (através da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação, e do Ministério do Trabalho), além de algumas organizações do Sistema S -, e envolver diversos formatos institucionais – como fóruns nacionais e estaduais, conselhos, audiências públicas etc – na participação de seu monitoramento, a nova política de Educação e Formação Profissional no Brasil que se inaugurou com o Pronatec tem propiciado a emergência de uma governança mais democrática não apenas no âmbito da gestão, mas principalmente no de proteção social. Entre 2011 e 2012, por exemplo, 475 mil vagas foram ofertadas gratuitamente pelo SENAI no Pronatec, em 234 cursos realizados nas 471 unidades espalhadas por todo o país[21].
 
Considerações finais
Este texto correlacionou governança com formulação de políticas públicas. Começou com a proposição de que a formulação de políticas e processos de decisão revelam até que ponto práticas democráticas moldam (ou não) a forma com que a governança opera. O conceito de governança adotado neste texto se relaciona com as conexões público-privadas que governos nutrem para executar políticas. Nesse sentido, a forma com que políticas públicas são decididas explica até que ponto a governança é democrática ou não.
 
Políticas públicas podem ser condicionadas por objetivos particularistas (O’Donnell 2010) ou “mais coletivos” (Diniz 1997), que se originam de redes institucionais ou de alinhamentos de coalizão que emprestam apoio a governos para implementar políticas públicas. Quando as políticas que governos implementam abraçam objetivos mais particularizados para atender a demandas específicas, a governança tende a não ser democrática; quando diversos atores (públicos e privados) participam conjuntamente do processo de tomada de decisões, as políticas que os governos implementam abraçam objetivos mais coletivos, e a governança tende a ser mais democrática.
 
Este texto argumentou também que alinhamentos de coalizão determinam não apenas o grau de democraticidade dos processos decisórios, mas principalmente a forma pela qual as instituições que implementam essas decisões evoluem. Quando as coalizões permanecem as mesmas por um longo período de tempo, a reprodução institucional, como constituída originalmente, tende a prevalecer; quando essas coalizões mudam, as instituições tendem a ser transformadas. Sobre essas questões, Kathleen Thelen afirmou que “mudanças nas coalizões sobre as quais as instituições se apoiam são o que determinam mudanças na forma que elas adquirem e nas funções que servem na política e na sociedade” (2007: 294).
 
No Brasil, o fato de trabalhadores (e sindicatos) não terem feito parte da coalizão original por trás da legislação crucial de 1942 que criou o SENAI, aprofundou a dicotomia “educação para a elite” versus “educação profissional e treinamento para a força de trabalho”[22], que foi reiterada no processo de industrialização subsequente. Neste sentido, apesar de algumas mudanças terem ocorrido, ao longo do tempo, de forma gradual, o arranjo institucional do Sistema S mostrou-se demasiadamente resiliente por décadas, reforçando padrões anteriores de exclusão. Apoiados por alinhamentos de coalizão que permaneceram quase os mesmos desde a era getulista, esses padrões impediram por décadas a incorporação de novos atores que poderiam favorecer o redirecionamento da política de EFP para rumos mais coletivos.
 
Sobre esses pontos, vale enfatizar que, se por um lado, o Sistema S não foi fruto da governança democrática, por outro, seu desenvolvimento mais recente indica que o sistema tem, de fato, contribuído com o estreitamento das conexões público-privadas, a partir de sua atuação em ações compartilhadas que têm sido promovidas pelo poder público visando redirecionar a política de EFP brasileira para rumos “mais coletivos”. Essa tendência tem sido reforçada por ações incrementais, como  a participação da CGU na auditoria dos fundos administrados pelo sistema, a partir de 2006 (Decretos 5.683/2006 e 8.109/2013), o acordo firmado entre governo federal e algumas entidades do Sistema S (Decreto 6.633/2008), que visou ampliar, de forma gradual, a gratuidade das vagas ofertadas para trabalhadores de baixa renda, e a implementação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), em 2011.
 
Todos esses aspectos, além de favorecer os trabalhadores brasileiros que necessitam de qualificação profissional, contribuem para o aprimoramento da accountability, abrem uma janela de oportunidade para a governança democrática na gestão da política de Educação e Formação Profissional e fortalecem o modelo (híbrido) de proteção social no país (Assumpção et alli 2008).
 
Resta constatar se teremos capacidade de otimizar esse processo, cuja coerência, sabemos, não surge espontaneamente. Afinal, a chave para entender essas conexões é pensar em termos de co-evolução institucional, como processos onde a coerência não surge espontaneamente, mas é construída. Nesse sentido, já que instituições herdadas do passado são adaptadas às mudanças no mercado político e no contexto social (Thelen 2007: 291), o argumento principal desenvolvido neste texto foi o de que processos de reprodução/mudança institucional são complementares e, por esse motivo, devem ser estudados em conjunto.
 
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ENTREVISTA realizada com Marco Antonio de Oliveira, Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC/MEC), Brasília, DF, 4 de fevereiro de 2013.



[1]As organizações que compõem o “Sistema S” são: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), criado em 1942; Serviço Social do Comércio (SESC), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), e Serviço Social da Indústria (SESI), criados em 1946; Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas (SEBRAE), criado 1972; Serviço de Aprendizagem Rural (SENAR), criado em1991; Serviço Social do Transporte (SEST) e Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT), criados em 1993; e Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP), criado em 1998. As seguintes agências também pertencem ao Sistema S: Agência de Promoção de Exportações (APEX Brasil) e a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) (CGU 2009).
[2] www.vocenaindustria.com.br. Acesso 27 set 2013.
[3] Vale ressaltar que o Brasil foi o único país entre os BRICs que melhorou sua posição nesse quesito entre 2011 e 2012 (passando da 36a para 34a posição), ao mesmo tempo em que a China perdeu o segundo lugar para África do Sul (da 42a posição em 2011 para 55a (WEF 2012 e 2013).
[4]Representando as 27 federações no Brasil, a CNI atua pelos interesses da indústria produtiva e contribui com a formulação de políticas públicas para este setor.
[5]Outros exemplos são o Servicio Ecuatoriano de Capacitación Profesional (SECAP), Servicio Nacional de Adiestramiento en Trabajo Industrial (SENATI), Instituto Nacional de Formación Profesional (INFOP), Instituto Nacional Tecnológico (INATEC) da Nicarágua, e Instituto Técnico de Capacitación y Productividad (INTECAP) da Guatemala.
[7] Na Argentina, por exemplo, a Comisión Nacional de Aprendizaje y Orientación Profesional (CNAOP), criada por Perón sob a Secretaria de Seguridade Social e do Trabalho, foi abandonada nos anos 1950 em favor de um modelo de escola técnica (Castro e Alfthan 1978). No México, a lei federal do trabalho (LFT) de 1978 estabeleceu o Serviço Nacional de Emprego e Treinamento (SNECA), que é dirigida pela Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (SRPS). De acordo com Arteaga García, Sierra Romero e Flores Lima (2010), o México ainda está passando por um processo de reforma de seus processos de educação e formação profissional nacionais.
[8] Para o orçamento de 2011 do Sistema S, ver as regras administrativas do Ministério do Desenvolvimento Social (289, 290, 291, de 28 de outubro de 2011) e do Ministério do Trabalho (2.214, 2.215, 2215, 2.217, de 31 de outubro de 2011).
[9]Ver Constituição de 1988, art.74, II, e CGU (2009 e 2013).
[10]Mais recentemente, as conexões entre Fiesp e governo militar foram novamente trazidas à tona pela Comissão Nacional da Verdade, criada pela Lei 12.528, de 28 de novembro de 2011, e instituída em maio de 2012. Expondo documentos secretos produzidos pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) que foram encontrados no Arquivo Nacional, a Comissão comprovou colaboração entre o Grupo Permanente de Mobilização Industrial (GPMI) da Fiesp com o aparato repressor militar, especialmente para “fornecer material necessário para operações militares”. Entre essas operações, a Operação Bandeirantes (OBAN) – uma delegacia que fora transformada em 1969 num lugar onde opositores do regime militar foram torturados em São Paulo. Para mais informações sobre esse assunto, ver: www.cnv.gov.br.
[11] Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
[12] Decreto 2.208, de 17 de abril de 1997: “Art 5º - A educação profissional de nível técnico terá organização curricular própria e independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou seqüencial a este” [ grifo meu ].
[13] Decreto 5.154, de 23 de julho de 2004: “Art. 4o  - A educação profissional técnica de nível médio, nos termos dispostos no § 2o do art.36, art.40 e parágrafo único do art.41 da Lei no 9.394, de 1996, será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio, observados: I - os objetivos contidos nas diretrizes curriculares nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação; II - as normas complementares dos respectivos sistemas de ensino; e III - as exigências de cada instituição de ensino, nos termos de seu projeto pedagógico” [ grifo meu ].
[14] Decreto 5.154, de 23 de julho de 2004: “Art. 4o  § 1o - A articulação entre a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio dar-se-á de forma: I - integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno à habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, contando com matrícula única para cada aluno; II - concomitante, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental ou esteja cursando o ensino médio, na qual a complementaridade entre a educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio pressupõe a existência de matrículas distintas para cada curso, podendo ocorrer:: a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis; b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis; ou c) em instituições de ensino distintas, mediante convênios de intercomplementaridade, visando o planejamento e o desenvolvimento de projetos pedagógicos unificados; III - subsequente, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino médio”.
[15] Decreto 5.154, de 23 de julho de 2004: “Art. 6o  - Os cursos e programas de educação profissional técnica de nível médio e os cursos de educação profissional tecnológica de graduação, quando estruturados e organizados em etapas com terminalidade, incluirão saídas intermediárias, que possibilitarão a obtenção de certificados de qualificação para o trabalho após sua conclusão com aproveitamento.”
[16] Lei 9.649, de 27 de maio de 1998: “Art. 47, § 5o - A expansão da oferta de educação profissional, mediante a criação de novas unidades de ensino por parte da União, somente poderá ocorrer em parceria com Estados, Municípios, Distrito Federal, setor produtivo ou organizações não-governamentais, que serão responsáveis pela manutenção e gestão dos novos estabelecimentos de ensino” [ grifo meu ].
[17] Lei 11.195, de 28 de novembro de 2005: “Art. 3, § 5o - A expansão da oferta de educação profissional, mediante a criação de novas unidades de ensino por parte da União, ocorrerá, preferencialmente, em parceria com Estados, Municípios, Distrito Federal, setor produtivo ou organizações não governamentais, que serão responsáveis pela manutenção e gestão dos novos estabelecimentos de ensino” [ grifo meu ].
[19]A constituição de 1988 (art.149) estabelece três tipos de contribuições a serem arrecadadas pelo Estado: (i) contribuições sociais, (ii) contribuições para intervenções dentro de áreas econômicas específicas e (iii) contribuições de interesse de setores profissionais. O parágrafo relacionado a contribuições sociais fornece a base legal para a existência de onze contribuições que vão entre 1% e 2,5% da folha de pagamento. Contribuições arrecadadas pelo Estado e passadas para organizações privadas podem ser usadas, de acordo com a legislação específica, para o ensino profissional, assistência social e atividades socioculturais (CGU 2009).
[20] Outras iniciativas são: Expansão da Rede Federal, Bolsa-Formação, FIES Técnico e Empresa, Programa Brasil Profissionalizado e Rede e-TecBrasil (http://pronatec.mec.gov.br/institucional/objetivos-e-iniciativas). Acesso 15 mai 2013.
[22]As Leis Nacionais da Educação – Ensino Secundário (1942), Ensino Comercial, e Ensino Básico, Secundário e Agrícola (1946) ilustram esse ponto ao declarar que o ensino secundário visa “formar as elites condutoras do país”, enquanto a educação profissional visa “propiciar a formação adequada aos filhos dos operários, aos desvalidos da sorte e aos menos afortunados, que necessitam integrar precocemente a força de trabalho”) (Conselho Nacional da Educação, apud Gonçalves e Botini 2002).