19/07/2012

Escola Zeferino Vaz

Modelo brasileiro de universidade pública pode ser insustentável, diz especialista

Para Philip Altbach, do Boston College, sistema de financiamento estatal e ensino gratuito pode não durar

O modelo brasileiro de educação superior pública, no qual o Estado arca com todas as despesas e os estudantes nada pagam, poderá se mostrar insustentável no cenário que se desenha para o setor no século 21, advertiu Philip Altbach, diretor do Center for International Higher Education e editor da publicação especializada International Higher Education (IHE), ambos do Boston College (EUA). “Em minha opinião, instituições como a Unicamp são, aparentemente, insustentáveis no longo prazo”, disse ele.

Altbach falou nesta quinta-feira, 19, sobre os principais desafios da educação superior no século, no 2º dia da Escola Zeferino Vaz de Educação Superior, realizada pela Unicamp Altbach falou nesta quinta-feira, 19, sobre os principais desafios da educação superior neste século no segundo dia da Escola Zeferino Vaz de Educação Superior (eZVes),realizada pela Unicamp.

Ele fez o comentário sobre o modelo brasileiro ao discorrer sobre o desafio trazido pela tendência de privatização das universidades públicas em várias partes do mundo, incluindo os EUA. “Não se vê muito disso no Brasil, hoje, mas talvez esteja no futuro de vocês”, declarou.

A questão da privatização liga-se a outro dos desafios mencionados por Altbach, o do financiamento das instituições de educação superior frente à pressão pela massificação do setor. Ele diagnosticou uma mudança na perspectiva que as sociedades têm em relação à educação superior – que estaria deixando de ser vista como um “bem público”, isto é, algo que beneficia a sociedade como um todo e, portanto, faz jus a um forte investimento público, e passando a ser encarada como um “bem privado”, algo que beneficia principalmente o detentor do diploma.

Se a educação de terceiro grau é agora vista como um benefício particular concedido ao estudante, o forte investimento público no setor passa a ser questionado, ainda mais num cenário de contração econômica global, que vai afetar a capacidade dos países de sustentar seus sistemas de educação superior.

'Em minha opinião, instituições como a Unicamp são, aparentemente, insustentáveis no longo prazo' Dadas estas condições, Altbach destacou, como outro desafio, a sustentabilidade da pesquisa básica, que não gera tecnologia ou patentes de imediato. “Como a pesquisa básica vai sobreviver nesta era de parceiras com a indústria e de pressão, em muitos países, por mais pesquisa aplicada? Mas precisamos da pesquisa básica, porque é dela que surgem as novidades. Este é um desafio significativo”.

Governança

Altbach também citou o desafio da profissionalização da governança. Ele afirmou que a eleição não é a melhor forma de escolher o reitor de uma universidade. “Eleger reitores, diretores, chefes de departamento é uma má ideia”, afirmou.

“Universidades são, hoje, organizações complexas, com grandes orçamentos. Elas merecem uma administração profissional. Merecem liderança. ” Segundo Altbach, o sistema de eleição não traz liderança, visão estratégia e continuidade administrativa.

A falta de profissionalização dos níveis intermediários da administração universitária, acrescentou, muitas vezes acaba impedindo que a visão estratégica da alta administração seja executada.

Massificação

“O fato central da educação superior global, no fim do século 20 e início do século 21, é a massificação, o aumento das matrículas e do acesso em todo o mundo”, declarou ele. “Isto é inevitável e não pode ser impedido”, afirmou ainda.

Ele lembrou que muitos países desenvolvidos já atingiram o pleno acesso à educação superior, com cerca de 80% da população da faixa etária adequada com acesso a faculdades e universidades. “No mundo rico, há pouco espaço para expansão”, disse.

Altbach também citou o desafio da profissionalização da governança. Ele afirmou que a eleição não é a melhor forma de escolher o reitor de uma universidade. 'Eleger reitores, diretores, chefes de departamento é má ideia.' Já no mundo em desenvolvimento, ainda há muito espaço para crescimento: dentro de 25 anos, disse, China e Índia responderão por mais de 60% de todas as matrículas em educação superior do mundo, e não apenas por conta de suas grandes populações, mas também porque as taxas de acesso atuais são muito baixas: na Índia, a parcela da população da faixa etária adequada com acesso à educação superior é de 10% e, na China, de 25%.

“Existem enormes pressões, vindas tanto da elite quanto da base da sociedade, sobre a maioria dos sistemas de educação superior”, ponderou. “Ao mesmo tempo em que os sistemas têm de lidar com a pressão pela massificação do acesso, na base, também há uma tremenda pressão pela expansão da educação superior de classe mundial, que é uma questão das elites”.

O editor da IHE disse ainda que a massificação traz o desafio de qualificar e recompensar adequadamente os professores. “Precisamos de sistemas mais flexíveis, que permitam atrair pessoas de talento e remunerá-las como merecem. Este é mais um desafio.”